Por Leonardo Giordano
O que aconteceu na escola em São Paulo ontem é chocante e me faz pensar na sociedade americana, onde esse tipo de prática começou, e que tem sido absorvida pelo nosso país. Para não ir longe, ou talvez indo muito longe de mim, que sou progressista, cito a fala do vice-presidente, General Hamilton Mourão, que sobre esse episódio disse que “essas coisas não aconteciam no Brasil”. O próprio vice-presidente espantado diante do fato, reconhecendo que ele não é da nossa cultura, nem da nossa tradição. Fiquei pensando em todo o ciclo de violência que a gente tem visto, na naturalização do individualismo exacerbado e de uma sociedade estruturada a partir de lógicas de mera competição, que deixa de priorizar os valores da solidariedade, colocando de lado as idéias de cooperação em benefício de idéias onde a brutal competição vai de alguma forma gerar uma estrutura social melhor para todos os seres humanos. Isso me preocupa muito, porque não estamos lidando com fenômenos objetivos simplesmente, mas com valores afetivos, que vêm se deteriorando, e com o medo das pessoas. E em resposta ao medo justificam-se ou sublinham-se as violências. Então a ideia de ter uma sociedade segura passa a ser a ideia de que a violência vai ser o instrumento de segurança ou de que as armas são o caminho para que as pessoas se sintam ou estejam seguras. Valores que não são exatamente da tradição da sociedade brasileira, mas que, de alguma forma, vão se enraizando na nossa sociedade de modo extremamente perigoso.
A violência das redes sociais é também um capítulo a parte desse fenômeno do aumento e da modificação das violências gerais e que, de alguma forma, tem se tornado presente na cultura brasileira: a intransigência no debate, o menosprezo à democracia, a falta de visão de sociedade diversa, a perseguição às minorias, ao diferente e aos setores que são vulneráveis. Onde alguém que discorda de alguém diz que o outro devia morrer. Defende olho por olho, dente por dente, enquanto reivindica o amor. Tem-se debatido abertamente na sociedade brasileira a decisão de que se torne legítimo defender uma sociedade não plural, não diversa, onde é cada um por si e onde cada um atira em quem lhe ferir qualquer direito. As novidades negativas de uma sociedade que trabalha em cima do medo, do individualismo, do preconceito e do ataque aos diferentes, vão gerando doenças e deformações que não são da nossa cultura e tradição. O que aconteceu em Suzano não é da tradição brasileira, não é comum, não é normal. Não é mais uma violência brasileira, porque sim, a sociedade brasileira é historicamente violenta e opressiva, ela tem uma história de sangue e de barbaridades, infelizmente. Mas certas modalidades de violência, como a que vimos hoje, são novidade na nossa história. Esse movimento de raiva e de ódio tem esses grandes, terríveis e assustadores momentos, mas tem também os momentos menos chocantes, mas cotidianos, de uma sociedade que vai, passo a passo, se brutalizando. A nossa construção social tem estado extremamente vulnerável a esses momentos que chocam a todos.
Estamos vendo a construção de uma sociedade que escolhe retratar lésbicas, gays e transexuais como sendo pessoas que estão atacando os direitos das outras, ao invés de compreender que sofrem violência específica e tentar construir um cenário de solidariedade, entendimento e justiça, numa equação onde haja espaço para todas e todos, para as diversidades e para quem pretende viver de forma religiosa a sua pessoalidade e também para quem decida que é ateu, por exemplo. Que dê espaço para quem decida viver o seu amor de certa maneira, com certo tipo de família, onde todas sejam respeitadas e não caçadas e perseguidas. Uma sociedade que não ache que vai resolver os problemas colocando uma arma na cintura. Valores consagrados para a humanidade há séculos parecem agora desafiados em um retrocesso sem tamanho. Verifiquem suas consciências. O espalhamento de milhões de armas por milhões de pessoas diferentes, com cabeças diferentes, trará, de fato, mais segurança ou mais tragédias como a de Suzano? Fica a reflexão.
Leonardo Giordano foi candidato a vice-governador do Rio de Janeiro em 2018 e é vereador do PCdoB na cidade de Niterói-RJ.
Carlos
18/03/2019 - 11h27
Vou além… “Isto não acontecia no Brasil”… antes do “ECA”. Até a sigla mostra o que este estatuto é! Jovens precisam de disciplina e orientação, não se pode retirar a autoridade dos pais e professores nestas tarefas. Sem disciplina só resta espaço a anarquia e ao caos social. Desde a criação deste estatuto a situação de violência dentro de sala de aula contra professores e nas escolas só têm aumentado já que estes jovens se sentem livres e protegidos contra qualquer ação de correção de seus delitos, ou seja, podem fazer qualquer coisa sem punição. Não defendo com isso, qualquer ato de maltrato ou agressão a crianças e jovens, existem leis que punem estas atitudes, mas tem que haver disciplina e correção. E o que houve em Suzano não tem nada a ver com o porte ou posse de armas, um exemplo disso é que logo após este episódio lamentável em Suzano, um garoto foi atacado com uma faca em uma escola no Rio de Janeiro. Com ou sem uma lei especifica proibindo ou permitindo a posse ou porte, quem quiser irá ter sua arma, como já acontecia no passado e acontece hoje. O que precisamos não são leis, posse ou não de armas, o que precisamos é educação, instrução, disciplina, saber respeitar o próximo, que todos temos direitos e também deveres. Respeito é fundamental. Vivemos em sociedade e infelizmente no meio de pessoas bem intencionadas e de bom caráter, há também pessoas corruptas, más, e de caráter ruim.
Roque
15/03/2019 - 16h40
Depois que desarmaram o povo brasileiro virou esta bagunça. Tiraram as armas das pessoas, e armaram os bandidos até os dentes. Mas o Mito chegou para por ordem nesta bagaça…
Vava
15/03/2019 - 05h01
Concordo 100% com o texto. Antes do estatuto do desarmamento essas coisas nao aconteciam antes no nosso pais. de 10 anos pra ca afundamos em violencia em todos os niveis. Espero que as novas políticas de Bolsonaro consigam reverter esse cenário terrivel que os governos anteriores nos submteram.
Paulo
14/03/2019 - 18h33
Essa discussão sobre o porte de armas se assemelha muito àquela dúvida suscitada no antigo comercial: “Tostines é fresquinho porque vende mais ou vende mais porque é fresquinho”…