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Laura Capriglione, dos Jornalistas Livres, escreve da Venezuela

A jornalista Laura Capriglione está na Venezuela, produzindo uma série de artigos sobre o país. O primeiro foi publicado no dia 15 e pode ser lido aqui. O segundo foi publicado hoje, e a gente reproduziu abaixo. *** Nos Jornalistas Livres VENEZUELA: É A VELHA LUTA DE CLASSES QUE ESTÁ NAS RUAS! Em clima festivo, […]

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A jornalista Laura Capriglione está na Venezuela, produzindo uma série de artigos sobre o país. O primeiro foi publicado no dia 15 e pode ser lido aqui. O segundo foi publicado hoje, e a gente reproduziu abaixo.

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Nos Jornalistas Livres

VENEZUELA: É A VELHA LUTA DE CLASSES QUE ESTÁ NAS RUAS!

Em clima festivo, esquerda e direita disputaram os corações e mentes do povo de Bolívar neste domingo (16/7)

por Laura Capriglione, em 17 julho, 2017 26
De Caracas, para os Jornalistas Livres

Quem há de dizer que a Venezuela é uma Ditadura? Se alguém sentia falta de uma consulta popular, o país realizou duas no mesmo dia! Uma foi convocada pelo governo do presidente Nicolás Maduro, na forma de uma simulação da eleição para os deputados da Assembléia Nacional Constituinte, que deverá ocorrer de verdade no próximo dia 30 de julho. A outra foi convocada pela Mesa de Unidade Democrática (MUD), a frente de partidos de oposição ao chavismo.

Foi um domingo alegre e iluminado em Caracas. Quente, como sempre. As ruas estavam cheias de famílias, já que 16 de julho é o Dia das Crianças venezuelano. Meninas e meninos com os rostos pintados como bichinhos, em roupas elegantes, viam-se por toda a cidade. As lojas estavam abertas. Nada havia que denunciasse a guerra civil ou os enfrentamentos dramáticos, cheios de sangue, ódio e ira, vistos todos os dias nas televisões e grandes jornais do Brasil. Mas a disputa renhida estava presente.

1º CAPÍTULO

A ATIVIDADE DO POVO POBRE

Há semelhanças e dessemelhanças cruciais entre o golpe que ocorreu no Brasil há um ano e o que pretende se implantar agora na Venezuela. Em ambos os países, o poder econômico quer assumir o comando e impor uma cartilha neoliberal em que apenas os ricos rentistas podem se dar bem. A diferença está no povo pobre que, no país de Chávez, está organizado em comunas de bairros, em movimentos sociais e no PSUV (o Partido Socialista Unido de Venezuela).

É impossível conversar com os defensores da República Bolivariana inaugurada por Chávez há 19 anos, sem que apareçam nas falas os “interesses nacionais”, a “Pátria Grande”, o petróleo (um orgulho, já que nacionalizado), os “direitos dos trabalhadores” e o “imperialismo predador” a ser combatido.

Todos falam em luta de classes. Dizem que o núcleo político da oposição reside na defesa de interesses espúrios por parte da burguesia e de uma classe média que tem os olhos e o desejos postos em Miami. Bem informados, falam do golpe ocorrido no Brasil, da condenação de Lula pelo juiz Sergio Moro. Defendem Lula com emoção e gratidão.

A Constituinte proposta por Nicolás Maduro, o sucessor de Chávez, tem tudo a ver com esse povo politizado e dotado de profunda consciência de classe. Pretende “aperfeiçoar o sistema econômico, social e político” e realizar uma extensa reforma política no país. Na prática, deverá radicalizar na via de transformação do Estado Venezuelano, reformando a Constituição de 1999, criada por iniciativa de Hugo Chávez. O propósito é adequar o Estado, de modo a torná-lo mais e mais um espelho da maioria da população do país, que é pobre e mestiça.

Jornalistas Livres percorreram a fila formada diante do Liceu Andrés Bello, no centro de Caracas. Trata-se de colégio icônico, um dos primeiros do país, e representa o sonho republicano de uma educação pública, gratuita e de qualidade para todos. Lá, diante de um gigantesco e lindo mural retratando a luta popular desde os tempos da colônia, uma fila animadíssima de cidadãos pobres e orgulhosos explicava porque participavam da simulação eleitoral convocada por Maduro.

A simulação foi organizada pelo Conselho Nacional Eleitoral, o CNE, que tem na Venezuela autoridade equivalente à do nosso Tribunal Superior Eleitoral. Tudo computadorizado, como acontece no Brasil, mas no final o eleitor retira seu voto e o deposita numa urna física, de modo a ser possível fazer recontagens de votos, em caso de suspeita de fraude.

Para Maduro, a Constituinte é a única possibilidade de levar paz ao país, porque criaria uma instância de poder para decidir os rumos do Estado venezuelano. Hoje, vive-se lá uma grave crise econômica, social e política decorrente da corrupção, da sabotagem econômica e do uso de táticas terroristas pelos que pretendem reimplantar um modelo neoliberal e privatista. As vitrines da loja de Departamentos Traki, no centro da cidade, por exemplo, exibem latas de conservas e embalagens de artigos de higiene e limpeza em arranjos caprichosos, como se jóias fossem. Nas farmácias faltam medicamentos e não se sabe quando eles estarão à disposição.

Para o chavismo, a Constituinte é a forma de resolver esses problemas da vida cotidiana, além de resgatar para o espaço da discussão política setores hoje descontentes com a adoção de táticas violentas por parte da oposição. Pacificar o país, que já conta mais de 112 mortos em conflitos e atentados de matriz terrorista, é um dos objetivos. É nisso que acreditam os partidários do governo que foram às urnas neste domingo para treinar o voto. Dia 30 de julho, o voto será para valer.

Para quem achava que o jogo estava em vias de terminar na Venezuela, a professora universitária Nilze Almendraz, 62 anos, vestida com camiseta negra em que se vê o rosto imenso de Simon Bolívar, garante: “Estamos apenas começando! E estamos dispostos dar nossas vidas para defender o sonho de nosso comandante máximo, Hugo Chávez. Porque é o nosso sonho também. ”

(Oposicionistas ateiam fogo nas cédulas e nas atas eleitorais, ao fim de seu “plebiscito informal”)

ATIVIDADE DA OPOSIÇÃO

Jornalistas Livres acompanharam a atividade oposicionista em dois pontos de Caracas: em Sabana Grande e na praça Carabobo, na região central. Concentrações da classe média branca, cem pessoas em cada uma delas, organizavam o seu “plebiscito” como se fosse a eleição do representante de classe na escola. Em vez de listas de votantes, folhas de papel sulfite A4, que cada “eleitor” preenchia mediante a apresentação de sua cédula de identidade –válida ou vencida, diga-se.

A pessoa podia votar fora de seu domicilio eleitoral, como constatamos ao entrevistar a jovem estudante de letras da Universidade Central de Venezuela, Susan Ovalle, 26 anos. Moradora de Catia, periferia pobre de Caracas, perto do aeroporto de Maiquetía, ela votou em Sabana Grande. Como evitar que pessoas votem várias vezes?, perguntamos. “Confiamos na honestidade dos nossos”, respondeu ela. Sei.

O plebiscito organizado pelos oposicionistas tinha três perguntas, todas em aparente defesa da Constituição de 1999, que esses mesmos setores combateram antes, quando Chávez a promulgou. Na prática, o objetivo era inviabilizar politicamente a convocação da nova Assembléia Nacional Constituinte, iniciativa de Nicolás Maduro, conforme garante a própria Constituição de 1999:

1. Você rechaça e desconhece a realização de uma constituinte proposta por Nicolás Maduro sem a aprovação prévia do povo da Venezuela?

2. Você pede à Força Armada Nacional e a todo funcionário público que obedeça e defenda a Constituição de 1999 e respalde as decisões da Assembléia Nacional?

3. Você aprova que se proceda à renovação dos Poderes Públicos de acordo com o estabelecido na Constituição e à realização de eleições livres e transparentes, assim como a conformação de um governo de União Nacional para restituir a ordem constitucional?

A idéia dos oposicionistas era recolher um número significativo de respostas “Sim” às três questões, de modo a deslegitimar a presidência de Nicolás Maduro e derrubar o que eles chamam de “Ditadura Chavista”. Nenhuma negociação, nenhum plano a não ser a explosão do atual governo.

Interessante o conceito de “Ditadura”, já que é ampla a liberdade de manifestação e expressão dos opositores, inclusive na televisão e nos meios impressos, em que fizeram abertamente campanha para chamar à participação no “plebiscito informal” deste domingo. Também é curioso que chamem de “ditador” a um presidente que, como Maduro, foi eleito pela maioria do povo venezuelano em eleições das quais a oposição participou e às quais convalidou. Ressalte-se que Maduro está ainda a um ano de ter seu mandato encerrado.

Incongruências à parte, o problema principal da oposição foi a total desorganização da consulta que realizou sem o apoio logístico do Conselho Nacional Eleitoral, o CNE, que tem na Venezuela autoridade equivalente à do nosso Tribunal Superior Eleitoral.

Piorando o que já estava precário, em vez de urnas, os votos foram recolhidos em caixas de sabão e de enlatados. Não havia lacre.

A deputada Tamara Adrian, deputada da Assembleia Nacional pelo partido Vontade Popular, de oposição a Maduro, explicou pela manhã que todos os votos recolhidos pelos oposicionistas seriam incinerados “por questões de segurança”. Foi o que de fato aconteceu, e logo deu para entender o porquê.

Tratava-se de evitar que alguém tivesse a inconveniente idéia de contar os votos ou checar a lista de votação para evitar fraudes. E foi assim: nacionalmente, a oposição combinou que, tão logo se apurasse o resultado de cada urna, todo o registro da votação –as cédulas inclusive—seriam queimadas. Isso aconteceu já na noite de domingo. Sem condições de checagem, a oposição disse que obteve mais de 7 milhões de votos, dos quais 98,4% rejeitando a Assembleia Nacional Constituinte proposta pelo presidente Nicolás Maduro. Na realidade, mesmo com todas as fraudes que possam ter ocorrido e que jamais poderão ser investigadas, o número de votantes ficou bem aquém dos 11 milhões que eram a meta da oposição. Mas isso não impediu o presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Julio Borges, antichavista ferrenho, de proclamar ao final da votação neste “plebiscito” de fancaria: “O mandato de Nicolás Maduro está praticamente revogado”.

Na praça Carabobo em que a oposição realizava sua “consulta”, cerca de 10 homens portando paus sentaram-se sobre a sinalização do Metrô de Caracas. Batiam fortemente no metal, avisando que não estavam para brincadeiras. Enquanto isso, mulheres agitavam bandeiras para os veículos que passavam na rua. Carrões SUV e caminhonetes saudavam o protesto oposicionista, enquanto a turma que passava de ônibus nem se dignava a olhar para o que ocorria no espaço dominado pela direita.

Definitivamente, na Venezuela, a cisão é de classes. E todos têm consciência disso.

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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Sebastiao Marcirio De Araujo Magalhaes

20/07/2017 - 02h48

EU QUERO O MEU BRASIL SEM CORRUPÇÃO

Rachel

18/07/2017 - 21h58

E a Globo nem falou da simulação nada eleição q ocorrerá no final do mês e muito menos de como foi o “”plebiscito”. Imagina se iam dizer que foi um descontrole total e q ainda por cima queimaram as cédulas. Gente é para rir né?
Meu agradecimento aos jornalistas livrers por nos proporcionar uma visão mais próxima do q acontece na Venezuela. E ao Cafezinho por publicar.

Cida Matos

18/07/2017 - 22h19

Petezada podia se maná a eles são todos comunistas

    Rafael Foschini Trindade

    19/07/2017 - 17h03

    PT é comunista? O que é comunismo?

    Rogério Carvalho

    20/07/2017 - 20h00

    Rafael Foschini Trindade o que o PT faz se aliando ao PCdo B no (e do) Brasil? O partido comunista do Brasil, não é comunista?

Julio Senna

18/07/2017 - 21h17

Poxa, mais um chute na nossa cara de otários!

Leo

18/07/2017 - 17h58

Pior: a TELESUR divulgou que esses 7 milhões era o número de votos para as tres perguntas. Na verdade o numero de votantes foi de pouco mais de 2 milhões!

Hernan

18/07/2017 - 15h42

É a propria falta de auto-critica ideológica. Esse texto é sem alma, hipocrita. A jornalista que escreveu com toda certeza no seu íntimo nao deve de fato acreditar nisso que ela falou no texto. Próprio de quem não pode admitir que essa forma de política adotada na Venezuela está sangrando e acabando com o país. Tudo pelo orgulho de nao admitir os erros e atrocidades de uma escolha de lado. O ser humano de fato se torna mais perigoso quando sua ideologia passa a ser unicamente a natureza de seus atos custe o que custar.

Valcir Barsanulfo de Aguiar

18/07/2017 - 09h57

Falta um ano para terminar o mandato de Maduro, porque não esperam e se preparem para o preito. Os liberais/fascistas gostam mesmo é de GOLPE, não TOLERAM eleições livres e democráticas. Tal qual no Brasil, os procedimentos são os mesmos e só visam tomar o poder pela força, pois no voto perdem feio.

Rogério Carvalho

18/07/2017 - 05h45

E vocês petralhas canalhas acham lindo o que o Maduro está fazendo por lá. Querem que algum petralha bandido faça a mesma coisa no Brasil, né?

    Jose Araujo

    18/07/2017 - 10h26

    Sim! Queremos!

    ari

    18/07/2017 - 12h03

    E o que é que Maduro está fazendo lá?

    Lucia Sotero

    18/07/2017 - 19h05

    já tão fazendo e não são petralhas.

    Julio Senna

    18/07/2017 - 21h22

    E o que eles estão fazendo? Você foi lá, passou uns meses pesquisando? Tem fotos, vídeos e áudios? Se não tem nada além de coisas de fontes da gangue da globo e ou americanas pagas pela CIA não são verídicas. Pare de cagar pela boca!

    Rogério Carvalho

    18/07/2017 - 23h08

    Julio Senna e vc, já foi lá? Sabe o que o povo venezuelano está passando com o comunismo bolivariano? Suas fontes são bem mais emporcalhadas que as minhas. Informação petralha é só mentira! Eu cago pela boca, e sai algo bem parecido com você!

    Pedro Borges

    20/07/2017 - 19h43

    Rogério Carvalho só de falar em comunismo bolivariano ja mostra o quão desmiolado e massa de manobra é.

    Rogério Carvalho

    20/07/2017 - 19h57

    Pedro Borges então senhor, poderia me dar uma aula? Diria que não há mais comunismo moderno, mas existe partido comunista retrógrado no Brasil, e aí?

Leo G

17/07/2017 - 23h59

Acho que nem a autora do texto acredita no que escreveu…

    Rachel

    18/07/2017 - 22h03

    E a foto das cédulas queimadas é fake né? Mas entendo colocar neurônios para funcionar dá um trabalho… Macunaíma já dizia”ai que preguiça”. Acorda , acorda q ainda é tempo.

ari

17/07/2017 - 21h22

Desde que vi na TV os tais 98% duvidei dessa farsa sem conhecer em detalhes o que tinha ocorrido.

Fábio

17/07/2017 - 21h21

Poucas vezes eu vi tanta merda escrita em um único texto. A Venezuela desindustrializada; a população padecendo com a falta de tudo , com uma inflação beirando 1600% e os burros encantados por Lula e lobotomizados pelo petê achando tudo uma maravilha !

    Jose Araujo

    18/07/2017 - 10h37

    Vamos enviar o estadista michel temer para la. Assim brasiliaremos a Venezuela. O que nosso grande comandante tem feito aqui, fara la. Começara aumentando a verba governamental da mídia coxinha em 6000%, a seguir transferira toda a exploração petrolífera para a shell(sem cobrar nada), enviaremos o símbolo maior de culto, o pato amarelo, como sinal de parceria e finalmente nomearemos sergio moro ministro do STF(ou órgão equivalente venezuelano), uma vez que é notório o desejo do rambo da revista veja de combater as ameaças à democracia e nosso STF já esta em boas mãos.

    ari

    18/07/2017 - 12h05

    E no Brasil estamos muito diferente?
    Cara, a mídia tem feito com a Venezuela o mesmo que fez e continua fazendo no Braisl com o PT e seus governantes.

marta b

17/07/2017 - 21h10

Viva Laura! muito bom, pena que estas informações não chegam para quem deveria ler. Golpe lá, vai ter pau, aqui, é pura letargia.


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