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Omissão e lobby

Volto ao assunto depois de examinar melhor os jornais. A coisa é pior do que eu imaginava. Além de não publicar nada na capa, a Folha deu apenas uma nota, na parte inferior da página A5, sobre os recordes brasileiros no comércio exterior. Não fez sequer um infográfico.

1 comentário
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Volto ao assunto depois de examinar melhor os jornais. A coisa é pior do que eu imaginava. Além de não publicar nada na capa, a Folha deu apenas uma nota, na parte inferior da página A5, sobre os recordes brasileiros no comércio exterior. Não fez sequer um infográfico.

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Sinceramente, eu estou curioso para saber qual o critério da Folha, jornal de maior circulação no país, para identificar o valor de uma notícia.

A manchete de hoje da Folha é:

TJ vai rever pagamentos a juízes

Longe de mim querer entender tanto de mídia quanto os altos executivos do grupo Folha, mas tenho sérias dúvidas sobre o valor midiático dessa frase.

Reitero que entendo e prezo a preocupação da mídia em não reproduzir o ufanismo meio que obrigatório do governo em relação aos números da economia. Mas ignorar os números de comércio exterior?

De forma geral, a pauta negativa parece estar contaminando inteiramente todo o noticiário econômico. Até mesmo o Valor, que tem uma postura menos politizada, entrou na onda.

A matéria Exportações sentem o peso da crise, publicada hoje no Valor, é um exemplo clássico de como torcer as informações para vender uma tese preconcebida.

Analisemos a primeira frase:

As exportações brasileiras sentiram os efeitos do recrudescimento da crise internacional e, para tentar reverter ou minimizar perdas em 2012, o governo planeja novas medidas de estímulo às exportações de manufaturados.

Como assim? O Brasil bateu recorde de exportação e corrente de comércio, registrou o maior saldo em 4 anos e quase todos os itens exportados aumentaram suas vendas.

Acho louvável que o governo tenha “novas medidas” para aumentar as exportações de manufaturados, mas isso não justifica produzir um jornalismo tendencioso.

Vejamos mais um trecho da reportagem:

Os resultados muito negativos da indústria ao longo de 2011, expostos no resultado final da balança comercial do ano, divulgados ontem, acenderam o sinal amarelo para a equipe econômica. O saldo comercial do Brasil somou US$ 29,8 bilhões no ano passado, um aumento de 47% em relação ao superávit de 2010, mas em dezembro ele já foi 25% inferior ao de igual mês daquele ano. No mês, as importações mantiveram ritmo forte (alta de 22,9%), mas as exportações só subiram 10% (bem abaixo da média de 26,8% do ano todo).

Que resultados negativos? A exportação de manufaturados cresceu 16% em 2011! Houve queda nas vendas de calçados, mas estes só representaram 0,5% da receita total de exportação em 2011, e representavam apenas 0,7% em 2010.

Na impossibilidade de encontrar dados negativos no período de janeiro a dezembro de 2011, a matéria foca então apenas em dezembro. Ué, mas então a frase que abre o parágrafo, que fala em resultados “muito negativos ao longo de 2011” não tem sentido; o termo “ao longo de 2011” deveria ser substituído por “em dezembro de 2011”. Mesmo assim continuaria absurdo, porque o saldo de dezembro pode ter sido menor, mas ainda sim foi um saldo positivo.

Aí eu vou conferir os dados de dezembro, para ver se encontro algo de “muito negativo”:

Não achei. As exportações brasileiras cresceram 11% dezembro de 2011 em relação ao mesmo mês de 2010. Aumentou inclusive – em 9,3% – a exportação de manufaturados.

Esse lobby da Fiesp e da CNI, pintando desastre em toda parte e arrastando a imprensa, já está dando nos nervos. É normal, contudo, que setores da indústria façam lobby. Os executivos dessas associações entenderam que a mídia repercute qualquer declaração que prejudique o clima de otimismo, o qual beneficia o governo.

O perigo reside no governo acreditar neste conluio (que a imprensa fatura na forma de publicidade) entre setores da indústria e imprensa e faça concessões desnecessárias ou exageradas.

O que me incomoda mais, porém, nem é a postura do governo, o qual, parece também estar usando esse jogo de pressões para justificar – perante a opinião pública – o aumento do protecionismo que ele julga necessário para ampliar as exportações de industrializados. O que me incomoda mais é ver essa proliferação de teses não comprovadas estatisticamente, entre elas a da desindustrialização, muito popular inclusive à esquerda, obnubilando uma visão correta da realidade concreta da economia.

Como pode essa tese prosperar num país que está recebendo trilhões de dólares em investimentos públicos e privados, internos e externos, que se revertem, em maior parte, em benefício de suas indústrias? Como podemos ver as exportações de manufaturados crescerem bem acima do PIB (16% em 2011) e depois afirmar que isso é um cenário “muito negativo”?

Ah, claro, o saldo no segmento industrial é negativo. Mas eles sempre foram negativos, com a diferença que antes não registrávamos quase nada de exportação de manufaturados e hoje exportamos quase 100 bilhões de dólares por ano em manufaturados.

O minério de ferro representou 16% das exportações nacionais, e não é muito chique tê-lo como principal produto de comércio exterior, mas não podemos nos martirizar por termos as maiores jazidas de ferro do mundo, nem esquecer que até a década de 60, o café representava mais de 60% das exportações nacionais. Hoje continuamos sendo os maiores exportadores de café do mundo, mas este representa menos de 4% do total. A pauta brasileira hoje é muito mais diversificada e exportamos para um número bem maior de países que no passado.

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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baixadacarioca

03/01/2012 - 17h05

E não é que meu chefe imediato acredita nessa imprensa cara!… Ele, assim como o Merval, juram de pés juntos que o Amaury criou o dossiê anti-serra; que o país vai de mal a pior; que só tem ladrão no governo federal… É impossível conversar com o cara. Ele te ganha no grito, literalmente falando.


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