Governo encontra reações à tentativa de coibir plataformas ilegais e efetivar a regulamentação das apostas esportivas.
O debate sobre a regulamentação das apostas esportivas ganhou novos contornos há pouco mais de um mês da data prevista para que suas disposições entrem plenamente em vigor. Isto porque a Procuradoria-Geral da República (PGR) protocolou no STF uma manifestação contra a Lei das Bets (Lei 14.790/2023).
O risco de ver todo o arcabouço legal desmoronar após esforços de governo e representantes do setor para regulamentar a atividade fez as principais entidades ligadas às apostas esportivas reagirem.
Em manifestações distintas, as duas maiores associações das bets reforçaram o argumento de que a suspensão da lei coloca o país no cenário perfeito para atuação das plataformas clandestinas, muitas delas ligadas ao crime organizado.
“A declaração de inconstitucionalidade seria uma decisão perigosa para o país. Neste cenário, o jogo clandestino ganharia espaço para atuar à margem da lei e da fiscalização, colocando em risco a integridade dos jogadores”, afirmou em nota o Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), que representa 75% do mercado de apostas esportivas online no país.
A Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL) foi na mesma direção, destacando que a falta de legislação “impedirá a atuação de empresas responsáveis e preocupadas com os apostadores e deixará livre caminho para as milhares de plataformas que têm afetado de forma nociva a sociedade”.
A nota do IBJR reiterou também que “a regulamentação é a melhor forma de separar o joio do trigo” — expressão usada anteriormente por André Gelfi, presidente do instituto, em artigo na Folha de São Paulo, publicado em outubro deste ano.
Presidente Lula discutiu medidas
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou recentemente de reuniões com ministros para discutir medidas de redução dos impactos das apostas esportivas no país, incluindo medidas de prevenção ao vício e ao endividamento.
Lula destacou a importância de tratar o problema como uma questão de saúde pública, observando que há um número crescente de brasileiros com compulsão por jogos. Durante o encontro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, fez o primeiro anúncio da iniciativa de bloquear cerca de dois mil sites ilegais de apostas.
O bloqueio dessas plataformas tem o objetivo de impedir que consumidores brasileiros sejam atraídos por sites que operam fora da lei e, consequentemente, sem medidas de proteção aos apostadores. Segundo Haddad, além do bloqueio, o governo estabelecerá uma interlocução com empresas autorizadas para aprimorar os mecanismos de segurança e prevenção ao vício.
Desafios para o mercado brasileiro
Um dos grandes desafios para o Brasil na regulamentação das apostas esportivas é garantir uma alta taxa de canalização, que representa a preferência dos consumidores por plataformas legais em vez das clandestinas. Esse índice depende diretamente de uma regulamentação eficiente, com carga tributária competitiva e menos burocracia no licenciamento.
Estimativas indicam que, no Brasil, a carga tributária sobre apostas pode chegar a 38,5%, o que pode tornar o mercado nacional menos atrativo e levar jogadores a plataformas não regulamentadas. Entidades do setor argumentam que uma regulamentação pesada, com altas taxas e processos burocráticos, desestimula o uso de plataformas legais, fortalecendo o mercado ilegal.
Para evitar isso, estratégias como redução de impostos e simplificação do processo de licenciamento poderiam aumentar a competitividade do mercado regulamentado. Além disso, campanhas educativas sobre os riscos das plataformas ilegais e os benefícios das regulamentadas são recomendadas.
Exemplos de outros países
A experiência internacional mostra que países que adotaram regulamentações bem estruturadas conseguiram consolidar mercados fortes, com arrecadação significativa e segurança para os jogadores.
No Reino Unido, onde as apostas on-line foram regulamentadas há quase duas décadas, o setor gera cerca de 4 bilhões de libras por ano em impostos, com parte dos recursos destinada ao sistema público de saúde. A alíquota britânica sobre a receita bruta das bets é de 15%, e não há cobrança de imposto de renda sobre os prêmios dos apostadores.
Na Colômbia, pioneira na regulamentação de apostas on-line na América Latina, as receitas são tributadas em 16%, e os recursos são destinados ao setor de saúde. O país criou o Coljuegos, um órgão específico para supervisionar o mercado, garantindo que as operações sigam normas rígidas de segurança e transparência.
Outro exemplo relevante é a Espanha, onde as receitas das bets são taxadas em 20%, mas os times de futebol não podem exibir patrocínios de casas de apostas. Essa medida foi adotada como uma forma de reduzir a exposição de jovens e menores de idade ao estímulo ao jogo, demonstrando a preocupação com a proteção de grupos vulneráveis.
A experiência internacional sugere que, para garantir a viabilidade e segurança do mercado, o Brasil precisa adotar uma abordagem equilibrada na regulamentação das apostas esportivas. Isso inclui a criação de taxas competitivas, regras claras de licenciamento e medidas de conscientização pública, além de uma forte estrutura de fiscalização para combater o jogo ilegal.
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