A investigação em curso revela uma ação coordenada e ilegal dentro da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), envolvendo o uso não autorizado do sistema de inteligência First Mile para monitorar dispositivos móveis sem conhecimento das operadoras de telefonia e sem autorização judicial. Este sistema foi capaz de rastrear a localização de celulares e está no centro das investigações que apontam para o desvio de conduta de agentes e altos gestores da ABIN, incluindo a identificação de diferentes núcleos operacionais ativos entre 2019 e 2021.
Carlos Nantes Bolsonaro, Luciana Paula Garcia da Silva Almeida, Priscilla Pereira e Silva e Giancarlo Gomes Rodrigues são citados como membros do chamado Núcleo Político, acusados de utilizar a ferramenta para fins pessoais e políticos, incluindo o monitoramento de inimigos políticos e a busca por informações sobre investigações que envolvem os filhos do então Presidente Jair Bolsonaro.
A investigação da Polícia Federal destaca a existência de 60.734 operações realizadas pelo sistema First Mile, das quais apenas 21.309 forneceram localizações geográficas. Há indicações de que essas operações foram conduzidas com o conhecimento e a cumplicidade de Alexandre Ramagem, então Diretor-Geral da ABIN, que teria utilizado sua posição para fins ilícitos, como a impressão de informações confidenciais e a manipulação da inteligência produzida pela agência para beneficiar interesses políticos.
Os investigados Mauricio Fortunato Pinto, Alexandre Pasiani e Marcelo Furtado Martins de Paula são apontados como gestores da ferramenta First Mile e são acusados de omissão e participação ativa nos atos ilícitos. Eles teriam desvirtuado a função da ABIN para monitorar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e associá-los a atividades criminosas.
A Polícia Federal também destaca a utilização da ABIN para preparar relatórios em defesa do Senador Flávio Bolsonaro, monitorar figuras políticas como Rodrigo Maia e Joice Hasselmann, e interferir em investigações federais, como a do assassinato de Marielle Franco.
A representação policial inclui um pedido específico de busca e apreensão em residências e locais de trabalho, veículos e dispositivos eletrônicos dos indivíduos citados. A Procuradoria-Geral da República manifestou-se favorável a essas medidas, embora com reservas em relação a Priscilla Pereira e Silva. A decisão aponta para a necessidade de prosseguir com as buscas para aprofundar o acervo probatório e trazer mais evidências à luz.
O Ministro Alexandre de Moraes autorizou as buscas, ressaltando a gravidade das acusações e a importância de se resguardar as provas. As medidas de busca e apreensão são justificadas pela necessidade de coletar mais evidências sobre as infrações penais suspeitas em relação aos investigados. A autoridade policial foi instruída a apresentar um relatório parcial dentro de 30 dias, analisando o material e o conteúdo eletrônico apreendidos.
As evidências colhidas indicam um uso sistemático da ABIN para fins políticos, monitoramento ilegal de opositores e uma potencial organização criminosa operando dentro da agência de inteligência do Estado. Esta investigação continua a desvendar a extensão e a natureza das operações clandestinas e a identificar outros possíveis participantes ainda não conhecidos. A decisão ressalta a seriedade das alegações e a necessidade de uma investigação detalhada para garantir a justiça e o cumprimento da lei.
A íntegra do despacho pode ser baixada aqui.
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