Documentos sigilosos do Exército, obtidos com exclusividade pelo Cafezinho, desmentem cabalmente as narrativas bolsonaristas de que os “manifestantes” do 8 de janeiro seriam, em sua maioria, pacíficos, e que havia um pequeno grupo violento.
Uma série de sindicâncias determinadas pelo Comando do Exército, sobre os acontecimentos do 8 de janeiro, realizadas ainda naquele mês, foi enviada a CPMI em curso que investiga esses fatos.
Uma das sindicâncias investiga o comportamento de oficiais e praças do Batalhão da Guarda Presidencial. Foram recolhidos vários depoimentos de militares que conseguiram chegar ao local ainda antes da invasão dos prédios.
Todos os relatos atestam a extrema violência e periculosidade dos “manifestantes”, que arremessavam pedras e extintores de incêndio nos militares, inclusive de cima dos prédios invadidos.
Os depoimentos deixam claro que as acusações da oposição, de que a Guarda Presidencial teria se omitido são injustas.
Houve omissão sim, mas por parte da Secretaria de Segurança do Distrito Federal, comandada então por Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro.
Quando os “manifestantes” ultrapassaram as barreiras que bloqueavam o acesso à praça dos Três Poderes, o estrago já estava feito.
O grande número de pessoas, e sobretudo o alto grau de violência com que agiam, deixaram as tropas da Guarda Presidencial inteiramente imobilizadas.
As sindicâncias apontam vários erros táticos dos diversos pelotões militares que acorreram ao local. Mas não houve dolo. Os chefes dos batalhões optaram por recuos estratégicos de maneira a evitar confronto físico que os obrigaria ao uso de armas de fogo contra os manifestantes, além de pôr em risco a integridade dos próprios militares.
Abaixo, trechos de alguns depoimentos. Juntei trechos de três depoimentos de militares da Guarda Presidencial.
Volto em seguida para uma conclusão.
(…)
O 3º Pelotão da 5ª Companhia de Guarda (3° Pel/5a Cia Gd) entrou em confronto com cerca de 50 manifestantes que ultrapassaram a cerca. Utilizaram munição lacrimogênea e balas de borracha até receberem a ordem do 1º Tenente Rosty para recuar até a retaguarda do espelho d’água, posicionando-se em direção ao Noroeste.
Na extremidade Noroeste do Palácio do Planalto, o mesmo pelotão continuou o embate com os manifestantes, usando apenas balas de borracha e gás lacrimogêneo, sem contato físico entre a linha de escudos da tropa e os manifestantes. Por ordem do comandante do 3º Pelotão, a tropa recuou até se juntar com a linha de escudos da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), permanecendo nessa posição por cerca de 40 minutos.
(…)
Os manifestantes atiravam pedras e objetos, como extintores e cadeiras, e começaram a aparecer também na frente Leste do Palácio. A PMDF e o 3º Pelotão recuaram até um ponto onde se posicionaram em direção ao Leste, contendo os manifestantes no extremo Sudeste do Palácio do Planalto. Após os enfrentamentos, recuaram para fora do perímetro e mantiveram posição até a chegada da 5ª Companhia de Guarda, sob o comando do 1º Tenente Thiago Oliveira.
Quando questionado sobre quem deu a ordem de retrair, foi informado que a ordem partiu do Tenente Rosty. A ordem de retraimento foi executada até o espelho d’água localizado na parte lateral do Palácio do Planalto. Não houve coordenação específica durante o retraimento, e a tropa recuou como pôde devido ao grande número de manifestantes atirando pedras.
(…)
Em relação à reorganização no local, a tropa se posicionou sob o comando do Tenente Rosty, formando uma linha de frente para os manifestantes. Houve contato físico e um grande consumo de munição não letal. O Tenente Rosty determinou um novo recuo devido ao grande número de manifestantes na retaguarda da tropa.
Outro aspecto relevante, segundo o parecer do encarregado, foi a tomada de posição no acesso oeste do Palácio. A prioridade do comandante do 3º Pelotão foi “proteger a tropa dos arremessos de pedras dos invasores”, o que contraria o item 6.3.3 da “Manobra” do Caderno de Instrução EB70-CI-11.434, que ressalta a importância do “mínimo de danos à população e ao patrimônio”.
Conclusão
Em outro documento, também obtido exclusivamente pelo Cafezinho, o general Gustavo Dutra de Menezes, comandante militar do Planalto, ou seja, chefe do quartel diante do qual se reuniam os “manifestantes” em Brasília, dá informações que ajudam a explicar o 8 de janeiro.
Menezes afirma que nunca foi simpático às manifestações diante do quartel, mas que entendia que não deveria se envolver sem que houvesse, antes, alguma manifestação judicial, o que jamais houve.
O comandante afirma ainda que a secretaria de segurança pública do DF, então comandada por Anderson Torres, tentou emplacar uma narrativa inverídica, ao vender à imprensa que a polícia do DF havia tentado remover os manifestantes no dia 29 de dezembro e teria sido impedida pelo Exército.
Segundo Menezes, a história não é essa. A Secretaria havia combinado fazer uma “varredura” minuciosa no acampamento naquele dia, mas não uma remoção. A mudança de planos foi informada ao exército no mesmo dia, e o comandante entendeu não ser prudente uma operação dessa natureza sem planejamento.
O mais grave vem a seguir.
Menezes informa que a secretaria de segurança do DF prestou assistência logística aos “manifestantes” dispostos a participar do 8 de janeiro, ao determinar, sem consulta prévia ao Comando Militar do Planalto, que o acampamento seria o “local de encontro” de todos que desejavam fazer atos no 8 de janeiro. A secretaria determinou ainda que fosse reservado, no local, espaço de estacionamento para os ônibus que chegassem com os manifestantes.
Os documentos entregues pelo Exército a CPMI não eximem totalmente os militares de suas responsabilidades, sobretudo de ordem tática.
O maior responsável pelo 8 de janeiro, porém, continua sendo o ex-ministro de Bolsonaro, o então secretário de segurança do DF, Anderson Torres. Mas isso do ponto-de-vista apenas logístico, porque é óbvio que o responsável político maior pelos ataques terroristas do 8 de janeiro foi o ex-presidente Jair Bolsonaro.
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