Por Jeferson Miola
O inquérito do Exército sobre o 8 de janeiro, cujo conteúdo foi tornado público pela Folha de São Paulo [31/7], é uma peça de ficção; é mais uma farsa das cúpulas militares para desviar a atenção sobre o envolvimento permanente das Forças Armadas nos atentados à democracia nos últimos anos.
A desfaçatez dos militares não tem limite. Os embusteiros insinuam “falha de planejamento” do atual governo como causa da devastação do Planalto.
Finalizado em março passado, o inquérito concluiu “que há indícios de responsabilidade da Secretaria de Segurança e Coordenação Presidencial quanto à invasão do Palácio do Planalto, considerando que houve falha no planejamento e na execução das ações”.
E assegura que “a invasão ao Palácio do Planalto poderia ter sido evitada ou minimizados os danos patrimoniais sofridos” se tivesse sido “realizado um planejamento das ações de segurança adequado, com o acionamento de valor de tropa suficiente”.
Neste caso, conclui cinicamente o inquérito do Exército, “a execução das ações de segurança por parte das tropas do Comando Militar do Planalto teria melhores condições de êxito”.
É uma versão inteiramente descabida que serve, todavia, a três propósitos: [i] para safar as Forças Armadas, em especial o Exército, da responsabilidade nas sucessivas tentativas de perpetrar golpes de Estado; [ii] para sedimentar a “narrativa” delirante da extrema-direita, que inverte a realidade para responsabilizar o próprio governo Lula pelos infames acontecimentos de 8 de janeiro; e [iii] para distrair a sociedade e as instituições sobre os acampamentos nas áreas dos quarteis que albergaram criminosos, terroristas e integrantes da “família militar” em ordem unida contra o resultado da eleição de 30 de outubro.
Foi o próprio Comando do Exército que designou, ainda na gestão do general Heleno no GSI, os comandantes da ativa para as funções de responsabilidade pela [des]proteção do Palácio e [in]segurança presidencial. Não se tratava, como mostrou a realidade, de uma estrutura profissional e leal ao Estado de Direito, mas de um verdadeiro Cavalo de Tróia para facilitar o trabalho da horda fascista que invadiu o Palácio.
Por algum motivo – que pode ser inclusive por ingenuidade, confiança pueril nos colegas de farda, espírito de corpo, incompetência ou obediência à hierarquia do partido dos generais – tal destacamento golpista foi integralmente mantido pelo general Gonçalves Dias.
O diretor-geral da Polícia Federal Andrei Rodrigues rebate com contundência esta versão farsesca e mentirosa do inquérito do Exército. Na visão dele, o atentado golpista de 8 de janeiro “deveria ter sido evitado lá em dezembro” com a desmontagem do acampamento na área do QG do Exército em Brasília, mas o Comando da Força impediu que fosse realizada a “profilaxia” na área.
“Era um acampamento de criminosos, que reunia pessoas que estavam tramando um golpe de Estado”, ele disse.
Andrei informa ter alertado que “essas pessoas têm que ser contidas no acampamento. Não podem sair de lá porque eles irão invadir o Congresso, o Supremo e o Palácio do Planalto”. Mas, segundo ele, os militares “não só permitiram a saída [dos acampados], como esse bando foi levado até os palácios”.
Andrei entende “que deliberadamente havia o interesse que o caos fosse instaurado e acontecesse o que aconteceu”.
“Quando nós fomos de novo lá [no QG], no dia 8 de janeiro, tinha tanque de guerra no meio da rua impedindo que a polícia entrasse para retirar aquelas pessoas do acampamento”, disse o diretor-geral da PF.
O Exército, contudo, tem uma visão cândida sobre o acampamento. Diz que foi montado “de forma intensa, porém pacífica”. E ainda tergiversa que houve “redução gradual no número de manifestantes a partir de 15 de novembro em razão da postura restritiva do Comando Militar do Planalto”. E culpa o governo do DF que “autorizou que os manifestantes realizassem seu desembarque” no Setor Militar Urbano, onde se localiza o QG do Exército.
Tão grave quanto este inquérito farsesco do Exército, é a aprovação dele pelo general Tomás Paiva, atual Comandante da Força Terrestre, que encaminhou ofício à CPMI dos atos golpistas reiterando a versão mentirosa [26/7].
No documento, o general Tomás Paiva reitera as conclusões do inquérito de que “a responsabilidade pela segurança do Palácio do Planalto está a cargo do GSI”, assim como a responsabilidade pelo planejamento das ações de segurança dos palácios presidenciais.
O ofício do comandante do Exército é como música aos ouvidos da extrema-direita. Ele escreveu à CPMI que “em razão da avaliação informada pelo GSI, a mobilização dos meios do Exército Brasileiro foi realizada de acordo com a situação de NORMALIDADE”.
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