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Os esforços de Lula pela paz mundial

Perguntas inteligentes carregam, em si, a própria resposta. Poderíamos alterar um pouco essa máxima e dizer que perguntas pró-guerra pedem respostas pró-guerra, assim como perguntas pró-paz pedem respostas pró-paz. E se quiséssemos confirmar esse raciocínio, bastaria usar como exemplo as perguntas da imprensa ocidental durante todas as coletivas de que Lula vem participando, em sua […]

9 comentários
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Imagem do Youtube. Coletiva de Lula em Madrid, 26 de abril de 2023.

Perguntas inteligentes carregam, em si, a própria resposta. Poderíamos alterar um pouco essa máxima e dizer que perguntas pró-guerra pedem respostas pró-guerra, assim como perguntas pró-paz pedem respostas pró-paz.

E se quiséssemos confirmar esse raciocínio, bastaria usar como exemplo as perguntas da imprensa ocidental durante todas as coletivas de que Lula vem participando, em sua viagem à Europa.

Hoje pela manhã, na coletiva em Madrid, foi a mesma coisa.

A imprensa ocidental é obcecada pela guerra. Não digo que é obcecada pelo tema guerra, mas pela semântica, pela lógica da guerra.

Triste dizer ainda que isso é uma característica quase atávica na história da imprensa ocidental. O marxismo sempre denunciou essa obsessão da imprensa burguesa de arrastar o mundo para conflitos sangrentos intermináveis. Alguns conservadores também perceberam isso. Spengler o dizia em sua obra mais conhecida, sobre a decadência do ocidente. Com ironia repleta de melancolia e pessimismo, o autor observa que a invenção da imprensa moderna (ele publicou seu livro em 1918) teria sido uma das grandes tragédias da humanidade, porque, antes dela, os donos do poder precisavam fazer ameaças terríveis, de morte e tortura, para convencer os trabalhadores a participarem da guerra. Após o advento dos jornais, bastavam alguns editoriais emocionados para persuadir as massas, com incrível facilidade, a marcharem, alegremente, na direção de sua própria carnificina.

Um outro escritor europeu, desta vez um progressista, o austríaco Stefan Zweig, que viveu intensamente o período de acirramento de ânimos, também confessa a sua perplexidade com o papel de agitadora pró-guerra da imprensa europeia, e descreve a construção de uma cultura bélica, antidiplomática, nos meses que antecederam tanto a primeira quanto a segunda grandes guerras.

Essa mesma sintaxe jornalística pró-guerra se repetiu ao longo de toda a guerra fria e, após o fim desta, nos meses que antecederam as guerras do Iraque, da Líbia, da Síria, etc.

O caso da Ucrânia é parecido. A mídia ocidental não pede mais esforços diplomáticos. Não se pede que ela defenda a Rússia, ou deixe de condenar a invasão, mas seria útil que ela ponderasse que o problema é mais complexo do que essa condenação, que desse espaço para analistas críticos da expansão da Otan. Seria interessante, por exemplo, que desse mais espaço para o que a China tem defendido, diariamente, nas coletivas oferecidas pelo ministério chinês de relações exteriores.

Muitos clássicos foram escritos sobre os trágicos erros políticos que levaram às grandes guerras mundiais.

O livro de estreia de Keynes, Consequências Econômicas da Paz, e o primeiro capítulo da obra-prima de Churchill (“A loucura dos vencedores”), acusam as potências europeias mais “esclarecidas”, como França e Reino Unido, de absoluta cegueira diplomática, arrogância política e uso insensato de sanções econômicas, esquecendo que, do outro lado, havia não apenas um governo, mas povos inteiros, e que o comércio internacional (já naquela época!) não poderia ser manipulado tão facilmente, por bloqueios a este ou aquele país, sem provocar uma enorme crise política e econômica em todas as regiões do mundo. Essas posições insanas do ocidente apenas seguiram adiante porque foram apoiadas, incentivadas, açuladas, pelo ruflar dos tambores da imprensa, esse quarto poder das democracias modernas que, à diferença dos outros, que ao menos precisam, regularmente, prestar contas ao povo, tornaram-se antes capangas dos interesses do grande capital internacional.

“Sou o único que fala em paz. Me sinto como um homem no meio de um deserto”, protestou Lula na coletiva de Madrid. E lembra que já havia conversado, na maioria das vezes diretamente, olho no olho, com Biden, Putin, Zelensky, Xi Jinping, Olaf Scholtz, Macron, Marcelo Rebelo de Sousa e, agora, com Pedro Sanchez.

“Cada um acha que tem razão, cada um acha que pode mais. O dado concreto é que povo está morrendo”, declarou Lula.

Que outra liderança política coloca a vida humana, tanto de ucranianos quanto de russos, em primeiro lugar no debate sobre a guerra?

Qual o diferencial do discurso de Lula? Podemos citar o mais importante: ele condena a Rússia pela invasão da Ucrânia, um ato de violação da soberania e da integridade de uma outra nação. Entretanto, à diferença de toda a imprensa e diplomacia do ocidente, Lula lembra que os Estados Unidos invadiram o Iraque, e que França e Inglaterra invadiram a Líbia. Nenhum erro justifica o outro. Uma análise objetiva dos fatos, contudo, precisa botar as cartas na mesa. A comunidade internacional não impôs sanções econômicas aos EUA pela invasão no Iraque, nem tampouco à França e Inglaterra pelo que fizeram na Líbia. Isso sem falar na Síria, igualmente alvo de ataques das forças armadas ocidentais.

Não foi a Rússia que iniciou o processo de desestabilização geopolítica do oriente médio, que contaminou o mundo inteiro. Foram os EUA, na guerra do Iraque.

Não foi a Rússia que rompeu a promessa política de destensionar e desmilitarizar o Leste Europeu após o fim da guerra fria. Ao contrário, EUA, associado a uma Europa ocidental incrivelmente submissa, vem expandindo a Otan há décadas, na contramão de todo o esforço internacional pela paz.

No final da coletiva, vendo que os jornalistas continuavam fazendo perguntas carregadas de uma semântica pró-guerra, Lula subiu o tom, e externou o que realmente o preocupa.

“Se essa guerra se prorrogar, não sabemos o que vem por aí. Vocês sabem do que estou falando. Uma desgraça ainda maior pode acontecer”.

Lula se refere, naturalmente, à degeneração do conflito para uma guerra nuclear, o que poderia pôr em risco a vida no planeta.

O presidente do Brasil parece o único adulto numa sala cheia de adolescentes brigões, mais preocupados com o próprio ego do que com as consequências de seus atos.

Ele lembra ainda um fato curioso: que os membros do conselho de segurança da ONU mais empenhados em continuar a guerra são exatamente aqueles que mais produzem e vendem as armas usadas nos campos de batalha da Ucrânia.

“A China pode se tornar a segundo maior economia do mundo, e há muitos anos não entra numa guerra”, provocou o presidente, para deixar claro que ele não pactua com a estratégia de dois pesos e duas medidas adotada pelas nações ocidentais, que aplicam sanções a Russia pela invasão da Ucrânia, mas nunca fizeram o mesmo com os EUA, que invadiu o Afeganistão, o Iraque e a Síria, nem com a França e Inglaterra, que destruíram a Líbia, até então um dos países mais prósperos e modernos do oriente médio. Esse desequilíbrio é a origem de todas as atuais instabilidades geopolíticas do mundo, e a solução, lembra Lula, é empoderar e democratizar as instituições multilaterais, ou seja, reformando, modernizando, fortalecendo a governança global.

Não é a tôa que Steve Bannon, o ideólogo norte-americano que se tornou uma espécie de consultor de comunicação da nova direita mundial, considera Lula o “esquerdista mais perigoso do mundo”.

É mesmo.

Lula é perigoso porque se o deixarem agir por mais tempo, respondendo a coletivas internacionais, participando do jogo geopolítico, periga ele realmente trazer paz ao mundo, gerando enorme prejuízo à indústria da guerra, além de consolidar um debate consequente, objetivo, sobre a necessidade de modernizarmos a governança global, o que não seria nada mais do que organizar, a partir de critérios mais democráticos e ecológicos, a distribuição dos recursos naturais e humanos do nosso planeta.

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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Carlos Caridade

27/04/2023 - 16h00

Habemus Lula!!! Ainda bem que ele nasceu e sobreviveu para cumprir essa divina missão de Grande Líder Pacifista e Humanitário. Habemus Lula!!!

Jason Tércio

27/04/2023 - 14h48

Visão simplista e reducionista de um romântico mal informado que expõe um rosário de bobagens. Primeiro atribui ingenuamente à imprensa a principal causa das guerras no mundo, o que pressupõe que um mundo sem imprensa seria bem mais pacifico. Como se antes do surgimento da imprensa não houvesse guerras. Após demonstrar essa crassa ignorância, o articulista repete os velhos chavões de culpar a Otan pela invasão da Ucrânia e lembrar as invasões cometidas pelos EUA. Nenhuma palavra sobre Putin e seu projeto neoimperialista. O que tem a Otan a ver com a invasão da Georgia e da Chechênia, p. ex.? Absolutamente nada. Sugiro a Miguel a leitura da História da Rússia, que mil anos antes da fundação dos EUA já fazia guerras e invadia territórios.

Alexandre Neres

27/04/2023 - 07h57

Lula! Lula! Lula! Lula! Lula! Lula! Lula! Lula! Lula! Lula! Lula! Lula!

O disco do Pianca está arranhado. Não para de repetir as mesmas bobagens.
O disco do Pianca está arranhado. Não para de repetir as mesmas bobagens.
O disco do Pianca está arranhado. Não para de repetir as mesmas bobagens.

Nelson

26/04/2023 - 23h15

Ao comentarista das 15h43

Bah!
Até hoje eu não vi um único comentário teu que tivesse algo minimamente aproveitável.
Assim, sou obrigado a perguntar. Nessa tua cabeça tem cérebro ou só aquilo mesmo?

Edu

26/04/2023 - 20h46

Porra, a mãe do cara deve ler. Só pode. Ou entao, seu parceiro do jogo de damas, na pracinha.
E não é que o isentao “METEU O LOCO, TAMBÉM ”
hahahahahahahaha
Eu até poderia sentir pena desse paspalho mas, na verdade, pessoas como essas são os artífices ocultos dessa bosta em que vivemos.
A doença mental de indivíduos como esse, leva a todos a termos uma vida pior.
Teremos de implementar um plano de tratamento psiquiátrico para que esses “malucos” não causem problemas maiores.

EdsonLuíz.

26/04/2023 - 18h36

Eu lidei com analfabetos e muitos deles se mostraram mais preparados do que eu para fazer o que se propunham. Lidei com analfabetos inclusive na atividade política de esquerda e democrática, e apesar de ser eu a ler para aqueles analfabetos os documentos preparados para as reuniões políticas ou de trabalho , o entendimento deles era sofisticado, inteligente e lúcido, tanto ou mais que o meu entendimento, ponderado o fato de que eles eram operários e/ou ativistas políticos com bem mais experiência que eu, e no mínimo tinham o dobro da minha idade.

Não há nenhum despreparo em Lula! Inclusive a antiga alegação de despreparo de uso da língua portuguesa por Lula ele clara e audivelmente superou o que eram vícios de linguagem quando falava e não propriamente desconhecimento.

Não se pense que um torneiro mecânico formado em escola, como é Lula, não conheça a língua que fala. Eu, por acaso, fui mecânico geral formado em escola e trabalhei um ano como torneiro mecânico. Conheci muitos torneiros que falavam “menas” e “conge”, mas sempre era por vício de linguagem e por ‘comer’ fonemas ao falar, vício reforçado no meio cultural em que viviam. Mau eu nunca conheci um torneiro mecânico que não fosse inteligente e não conhecesse a língua portuguesa.

E Lula empresta a seus interesses políticos, pessoais e materiais e familiares muita inteligência e muita esperteza.

Não vou cair no autoengano de que Lula está tropeçando e cometendo erros, até porque são “erros” repetidos e Lula não repete erros:: ao verificar que errou ou ao ser informado do erro, Lula imediatamente aprende.

O que Lula tem feito é deixar aparecer de forma mais escancarada o que ele realmente é!

Lula sempre foi populista e negociador de interesses que o beneficiam e a preocupação de Lula com valores e princípios vem sempre depois dos seus interesses.

E Lula consegue melhores resultados para os seus objetivos e intenções, que são mais pessoais ou são interesses particulares de um grupo, quando ele associa esses interesses a autoritários em geral e a ditadores e ditaduras.

Lula nem se importa que o autoritário se defina à direita ou à esquerda. E se o interesse for com alguém democrático e Lula perceber vantagem, não se faz de rogado e negocia também. A maior dificuldade de Lula com democratas é que em geram isto exige mais transparência, por isso Lula prefere gente fracas moralmente ou fraca de peincípios, ou as duas coisas juntas.

Mas não há nenhum erro nos supostos tropeços e “erros” de Lula nos últimos tempos. Até mesmo a escalada contra o mundo democrático que Lula vem fazendo ele articulou com os ditadores, autocratas e alguns incaltos que ele tem arrebanhado a mais.

Não me engano com Lula e não o subestimo. Mas isso me preocupa mais porque para mim, e não é de hoje, Jair Bolsonaro representa um grande perigo para a democracia, mas Lula e um perigo deveras maior, porque Lula seria apenas um Bolsonaro sem tirar nem por, só que Lula é um Bolsonaro com muito maior preparo, inteligência e esperteza.

Me intriga que movimentos políticos experientes e sérios, e falo das Organizações Políticas sérias, não das pessoas a elas ligadas, alimentem e reforcem os interesses de líderes como Lula.

À passagem de Lula, só os líderes, daqui e de fora do Brasil, menores ou maiores do que Lula, colherão benefícios de se associarem a Lula. Muitas lideranças de movimentos sociais colhem para si este benefício de se associar a um populista ladino, mas o movimento social mesmo, seus princípios e seus objetivos vão ganhando rejeição na sociedade por causa dessas associação com Lula.

Lula, ao se despedir da política, estará realizado como os ladinos sem compromissos sérios se realizam, mas o movimento de esquerda democrático e o Brasil terá perdido muito com Lula.

Lula usa tudo e todos que ele consegue usar; depois, pouco ou nada Lula se importa com a sorte de quem ou do que foi usado, incluindo o Brasil como instituição, como país.

Não se enganem:: Lula não tem nenhum compromisso com bandeiras, com valores e com princípios e apenas usa tudo para seus interesses pessoais, inclusive os movimentos sociais e seus líderes.

Edson Luiz Pianca.
edsonmaverick@@yahoo.com.br

Patriotário

26/04/2023 - 16h42

Estão vendo? Olha o discurso CANALHA que o cadelinha posta aqui …

Saulo

26/04/2023 - 15h43

Lula é um notório asno que não possui nenhum preparo mínimo para nada.

Nunca estudou nada nem sequer entrou numa sala de aula.

Como todos os asnos fala demais sobre assuntos que não pertencem mas com os quais tenta se amostrar.

Os assuntos dos quais Lula entende são o mensalão o petrólão e o pixuleco pro PT, fora disso se ficar calado todo mundo ganha.

    Nelson

    26/04/2023 - 23h41

    Excelente artigo, Rosário.
    Seria bom que alguns comentaristas que aqui aparecem para detonar a Rússia enquanto procuram livrar a cara da Otan (EUA) se dispusessem a lê-lo uma vez, pelos menos, com boa vontade e a mente aberta.

    Uma vez que tu criticas correta e certeiramente a deplorável, abominável, atuação da mídia hegemônica no incentivo às guerras, sugiro ainda que esses comentaristas deem uma lida no também excelente artigo do jurista português Hugo Dionísio.

    Ao imaginar a saga de Asterix sendo compreendida ao contrário por seus leitores, o jurista expõe, põe a nu, a brutal e vergonhosa manipulação da verdade perpetrada pelos órgãos da mídia hegemônica e seus comentaristas.

    Dionísio começa o artigo perguntando: “Será possível pegar num livro de ‘Asterix – o Gaulês’ e, após uma ávida leitura, chegar ao final e… Ao contrário do que vos tinham dito, ficarem profundamente convencidos de que quem invade são os gauleses e é o império romano quem está cercado?”

    A íntegra do artigo “Os romanos estão cercados pelos gauleses” pode ser lido em https://www.resistir.info/h_dionisio/gauleses.html.


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