Por Elias Jabbour
Desde a histórica visita de Nixon à República Popular da China em 1972 as relações entre China e Estados Unidos, apesar de nem sempre ser uma relação ótima, foi fundamental à manutenção de algum grau de estabilidade no mundo e previsibilidade na arena internacional.
Evidente que a posição econômica chinesa durante muito tempo não era capaz de ensejar qualquer teoria da conspiração nos círculos políticos do imperialismo. Ao contrário, com o final da União Soviética a grande aposta no núcleo duro da intelectualidade e do poder nos EUA é a que a experiência chinesa não duraria muito tempo, pois a continuidade do sucesso econômico chinês demandaria a adoção de instituições liberais. Uma afirmação que não tem a menor validade histórica, diga-se de passagem.
Mesmo assim, a China nunca buscou reagir de forma agressiva às diferentes formas que os EUA usavam para provocar instabilidade no país. Desde o bombardeio à embaixada chinesa em Belgrado (1997) passando pela recepção de Dalai Lama por seus presidentes em Washington até a venda de armas à Taiwan.
A China manteve durante muito tempo uma postura de flexibilidade e dureza em nome de uma correta estratégia: as boas relações da China com os EUA são necessárias não somente a ambos os países, mas a toda humanidade. As duas maiores economias do mundo poderiam cooperar em todos os temas que afetam os povos, desde a fome até a mudança climática.
Mas os Estados Unidos escolheram um caminho diferente. O do confronto, da difamação, a manutenção de uma máquina de inventar mentiras contra o país, o cerco militar e a tentativa de impedir acesso da China aos insumos básicos em indústrias sensíveis como a semicondutores.
O mundo hoje assiste de forma abismada um país onde morreram por Covid-19 mais de um milhão de pessoas, em sua maioria composta de pobres, negros e latinos, querer mostrar ao mundo que a política de Covid zero na China está dando errado. Detalhe: o número de mortes na China por Covid-19 só recentemente alcançou os cinco mil.
Em uma situação onde uma doença mata um milhão de pessoas em um país (Estados Unidos) e morre-se muito pouco em outro (China) o mais inteligente seria uma ampla cooperação humanitária entre os dois países. Isso seria excelente aos Estados Unidos e ajudaria a aliviar a dor da morte e da doença por todo o mundo.
Mais inteligente seria a governança dos EUA se concentrarem nos graves problemas sociais que afetam seu país: o uso de drogas é uma epidemia no país, a repressão policial contra os movimentos de negros, latinos e pobres é implacável, o racismo é estrutural e institucional. A concentração de renda cresce a índices alarmantes com a pobreza extrema destruindo o “sonho americano”.
Interessante notar que os ataques à China têm tido resultados catastróficos para a economia norte-americana com a inflação alcançando seus índices mais altos em décadas e o contribuinte pagando por uma “guerra fria” que ele não deu permissão ao governo para inicia-la.
Os EUA deveriam focar em seus graves problemas internos, perceber a China como uma solução e não um problema e escolher a diplomacia em detrimento da crença em um “destino manifesto” no trato das questões internacionais. Não é surpresa perceber que a manutenção da atual ordem internacional está levando o imperialismo a financiar abertamente grupos neonazistas como vemos no caso do conflito da Ucrânia.
O conflito com a China e a Rússia é uma prova clara do reino da irracionalidade que toma conta da política externa do imperialismo. Além de unir dois grandes países contra uma ordem “ocidental” que não faz o menor sentido, tem levado o país a decisões simplesmente absurdas.
Vejam, em um país onde existem cerca de 550 mil sem teto (homeless) os EUA decidiram enviar ajuda militar à Ucrânia da ordem de US$ 33 bilhões. Trata-se de dinheiro suficiente para resolver os problemas de habitação, saúde, educação e alimento para todas essas pessoas. Só um país onde a informação ao público é controlada por alguns bilionários esse tipo de ação não provoca uma revolta popular profunda!
A separação entre oriente e ocidente promovida pelos Estados Unidos e seus aliados na Europa ocidental está levando o mundo a um perigoso impasse. Nem China, nem Rússia irão recuar em suas questões relativas à soberania e segurança nacionais. Os EUA diante da assertividade chinesa e russa vão continuar a apostar no caos total? Até quando?
Elias Jabbour é professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCE-UERJ). Artigo produzido em colaboração com o Grupo de Mídia da China.
Eduardo Santana
07/05/2022 - 03h05
Parabéns, Elias Jabbour! Excelente análise!