Ao longo de 2019, li muitas análises sobre pesquisas de opinião que exageravam a queda na aprovação do presidente Jair Bolsonaro. Eu procurava mostrar que não era bem assim: Bolsonaro continuava ganhando força em alguns setores, a saber, na classe média e entre os mais instruídos, que são politicamente estratégicos por seu poder de influência nas redes sociais.
Em qualquer país, setores hegemônicos na classe média acabam, mais cedo ou mais tarde, conquistando o poder político.
Hoje, se dá o contrário. Vejo que alguns analistas estão exagerando a força de Bolsonaro, sem observar o seu declínio acentuado justamente naqueles setores que foram responsáveis por sua vitória, e onde ele ainda mantinha prestígio até pouco tempo: os eleitores mais instruídos e de maior renda.
Não faz sentido, além disso, analisar pesquisas sem considerar o contexto.
O PT conseguiu se manter no poder por vários anos após perder apoio na classe média, mas através de uma estratégia de custo altíssimo, que o partido paga até hoje: eleger a classe média como inimiga de classe. Todas aquelas narrativas de que a classe média não gostava do PT porque odiava pobre, porque se irritava com pobre andando de avião, e porque, no limite, era “fascista”, eram argumentos inventados para demonizar categorias sociais classificadas como adversárias. Não havia mais esforço para capturar o seu voto, ou conquistar seu coração, mas apenas vencê-las. Isso explica o clima de guerra política que vivemos durante os últimos anos, até chegarmos ao impeachment e à eleição de Bolsonaro.
Foi um erro grave. Ao eleger a classe média como adversária, parte da esquerda, hegemonizada pelo PT, lançou mão de uma falácia, a de que a classe média era o pólo oposto da classe trabalhadora. Esse era o famigerado discurso do “nós contra eles”. É uma falácia porque a classe média é, por excelência, uma classe de trabalhadores. Alguns valores desta classe que passaram a ser vistos como característicos de “elite”, como a sensibilidade à questão ética, o amor à disciplina, o culto à meritocracia, são, ao contrário, valores históricos, em todos os tempos, das classes trabalhadoras. Por razões inúmeras – cuja análise não é o escopo desse texto – o relativismo ético, a cultura do ócio e o desprezo pela meritocracia são características da elite brasileira. O que chamamos de classe média são, na verdade, as vanguardas intelectuais e morais da própria classe trabalhadora, e se estas famílias apresentam às vezes traços conservadores, preconceitos e vícios, é porque estes também são característicos da classe trabalhadora.
O que às vezes é apresentado como “preconceito contra o pobre” nada mais é do que um preconceito muito arraigado no espírito das classes trabalhadoras, contra a cultura do ócio, a indisciplina, e preguiça. Esse preconceito, que nasce todavia de um valor nobre, que é o amor pelo trabalho e em seu poder de transformação, tem sido manipulado com certa facilidade pelas elites, para jogar os trabalhadores contra seus próprios irmãos. É tarefa de intelectuais realmente comprometidos com a emancipação do homem destrinchar essas falácias.
A classe média é, em sua grande maioria, formada por famílias de vida humilde. Não deixa de ser uma ironia que, para grande parte dessas famílias, o esquerdismo seja associado a símbolos de elite. Esse é um processo aliás que se repetiu em quase todas as democracias do mundo. Muitos livros tem sido publicados, nos Estados Unidos, analisando essa associação entre “liberalismo” (que por lá tem uma acepção parecida com o conceito que nós temos de “esquerda”) e privilégios de classe. A eleição de Trump tem sido explicada, em boa parte, como uma vingança da “classe média”, que alguns hoje preferem chamar simplesmente de “classe trabalhadora”, contra o que passou a ser visto como uma nova aristocracia, a elite liberal.
No Brasil, no entanto, há diferenças bem marcantes em relação aos EUA. Os liberais do Partido Democrata nunca sofreram, junto à classe média americana, os níveis de rejeição que testemunhamos no Brasil contra setores da esquerda.
Bolsonaro surfou nessa rejeição ao PT junto a classe média para conquistar o poder, e agora vemos um outro processo se consolidando. São movimentos cuja magnitude, importância e consequência não podemos subestimar: Bolsonaro está perdendo, rapidamente, apoio na classe média.
Esse apoio da classe média não é apenas importante por causa da influência deste eleitorado nas redes sociais, mas também por sua hegemonia quase absoluta no funcionalismo público.
Quando testemunhamos, alguns com perplexidade, outros com terror, e muitos com entusiasmo, a depender da posição de cada um no tabuleiro das preferências políticas, que instituições inteiras, como mídia, judiciário, legislativo, polícia, pareciam se comportar como verdadeiros partidos de oposição, a razão disso era porque essas instituições fazem parte do arsenal político da classe média.
E aí voltamos ao Brasil e a duas pesquisas, cujos relatórios estratificados foram divulgados hoje pelo Datafolha e pelo Poder 360.
Ambas trazem a mesma informação: Bolsonaro perdeu apoio junto aos extratos de renda média e de maior instrução.
Ainda há alguns números contraditórios: por exemplo, observei que alguns analistas de oposição se surpreenderam com o fato de uma maioria ainda achar que Bolsonaro tem “capacidade de liderar o Brasil”. Entretanto, essa é uma pergunta “agônica”: é como perguntar a um paciente, no meio de uma cirurgia, se ele acha que o cirurgião tem condições de lhe salvar a vida. É uma pergunta capciosa, que induz a uma resposta desesperada.
Aliás, é importante ficar atento a esse contexto. Em situações de grande crise de segurança nacional, existe uma tendência natural de apoio às lideranças políticas. Isso fica claro no aumento do apoio aos governadores, por exemplo. E isso também ajudaria Bolsonaro, caso ele reagisse à crise com mais responsabilidade. Parte do apoio que ele está recebendo pode estar vindo desse sentimento de insegurança.
A principal pergunta neste momento, por isso mesmo, é como a população avalia o desempenho do presidente Bolsonaro no combate ao coronavírus.
Essa é a questão central, que definirá tendências, até porque a previsão lógica, pela matemática da epidemia, é que as situação piore: mais mortes, mais infectados, mais desemprego.
É aí, portanto, que podemos ver a vulnerabilidade e a deterioração do presidente Bolsonaro, e começando de onde mais dói nele: as classes médias são as que avaliam de maneira mais negativa o seu desempenho no combate ao coronavírus.
Entre famílias com renda de 5 a 10 salários, 50% consideram ruim ou péssimo o desempenho de Bolsonaro no combate ao coronavírus, segundo a pesquisa do Poder 360, e 42% segundo o Datafolha. Entre famílias com renda acima de 10 salários, 79% consideram ruim ou péssimo o desempenho de Bolsonaro no combate ao Covid, segundo o Poder 360.
Essa rejeição deve crescer de cima para baixo, na medida em que a informação sobre a irresponsabilidade de Bolsonaro espalhar-se junto com o vírus.
Sem o suporte na classe média, rejeitado por boa parte da imprensa, antagonizado por governadores, legislativo e judiciário, a situação de Bolsonaro ficará cada vez mais difícil.
A cartada do “golpe militar” não é verossímil nesse quadro. Por tradição, golpes militares na América Latina apenas foram possíveis no contexto da guerra fria, com apoio de classe média e imprensa, e se vendendo como movimento “democrático”. Nenhuma dessas condições existe hoje.
Sebastião
19/04/2020 - 21h35
Na classe média ele não ganha mais apoio, mas perderá cada vez mais. Enquanto diminuirá a rejeição dele – por causa do auxílio emergencial, as classes mais baixas. E são as classes mais baixas quem elegem. Embora, que quem saem às ruas e quem fazem barulho e manifestações, sejam a classe média. Essa classe média desacreditada de Bolsonaro, irão adotar Dória em 2022.
Sebastião
19/04/2020 - 21h32
Na classe média ele não ganha mais apoio. Só diminuirá a rejeição, por causa do auxílio as classes mais baixas. E são as classes mais baixa que elegem. Embora, que quem sai as ruas e quem fazem barulho é manifestação, sejam a classe média. Essa classe média desacreditada Bolsonaro, irão adotar Dória 2022.
Idalgo
19/04/2020 - 16h54
A DITADURA DE 64 ESCONDEU A EPIDEMIA DE MENINGITE.
Veja como os ditadores agiram diante da epidemia que ceifou a vida de milhares e milhares de crianças e adultos, e você perceberá que Bolsonaro pensa em agir de maneira semelhante com relação ao coronavírus: negando a pandemia, censurando informações, confundindo os brasileiros, agredindo a imprensa. No final, ninguém saberá quantos brasileiros foram vitimados pelo coronavírus, como não sabemos até hoje quantas crianças e adultos morreram de meningite.
Veja neste vídeo denominado EPIDEMIA SECRETA, como os ditadores pós-64 esconderam a epidemia de meningite. São todos criminosos e, agora, com a pandemia de coronavírus, o povo brasileiro vai se phoder novamente.
Assista ao vídeo EPIDEMIA SECRETA: https://youtu.be/IBV1SUyGzWw
Alexandre Neres
19/04/2020 - 13h15
Miguel está querendo reinventar a roda. Por meio de um pensamento original, quer sair desse lodaçal em que nos metemos. O culpado é o de sempre. O mordomo. Os valores da classe trabalhadora são os impingidos pela classe dominante para adestrá-la, que foram instilados ao longo do tempo, para mantê-la dócil. Lembram-se de onde estava a frase: “O trabalho liberta”? Em vez da luta em prol de emancipar o homem, contenta-se com migalhas. Parece resquício do MBL. A esquerda é plural, diversa, libertária, ligada à contracultura. É efervescente. Em vez de se pautar, por exemplo, por um guia punk do ativismo político, da cantora do Pussy Riot em busca de novos caminhos para sair do imobilismo, o Miguel acha por bem fazer manifestações que não atrapalhem o trânsito. É defensor da ordem, daqui a pouco citará o progresso. Fica a impressão que o Miguel está trilhando o seu caminho e se encontrando durante a jornada. Como diria o saudoso Brizola, parece estar costeando o alambrado.
MARINALVA
19/04/2020 - 11h23
CORREÇÃO: 8,82 MILHÕES EM VEZ DE 88,2. MAS ESSA DIFERENÇA NÃO FAZ DE BOLSONARO UM ENVIADO DE DEUS
Coronavírus: Bolsonaro disse que 70% da população brasileira será infectada
70% de 210 milhões de habitantes são 147 milhões de brasileiros
A taxa de letalidade no Brasil até agora é de 6,5%. Vamos arredondar para 6%
6% de 147 milhões são (6 x 147)/100 = 8,82 milhões de BRASILEIROS
Não foi esta quantidade total de pessoas que ele ameaçou matar durante a campanha eleitoral. Ele falava em 30 mil comunistas.
Você é COMUNISTA? Não? Pois se prepare: o coronavírus é daltônico e não consegue identificar a cor VERMELHA
putin
19/04/2020 - 11h53
marinalva,
o numero de infectados já é 100 vezes maior (só uma pequena parte é detectada) entao a taxa de mortalidade é 100 vezes menor.
André Tenreiro
19/04/2020 - 09h10
Paulo César Cabelo, por mais que eu concorde que a meritocracia e o amor a disciplina sejam utilizados para o controle e limitação da ascensão dos trabalhadores – apesar de serem “vendidas” como o oposto – é fato irrefutável que tal classe social se agarra a tais princípios também para se diferenciar e manter sua posição em relação ao que Marx chamou de lumpesinato.
O texto acerta quando diz que a classe média reproduz os valores hegemônicos “operários”. Como a maioria da direção do PT sempre representou aquela parte da classe média que buca ouvir o “grito dos excluidos” acabou se afastando ideologicamente dos seus pares de classe e até mesmo parte do setor operário que sempre legitimou o nome do partido. Ao buscar dar voz a camelôs, índios, profissionais do sexo e a todos os que não se enquadram no “sistema” acabou enxergando no pacto de não agressão com a elite econômica uma oportunidade de “incluir o pobre nas estatisticas”. Contudo, ao não cobrar dos super ricos o que eles deveriam pagar pelo desenvolvimento do país, acabaram empurrando a conta das políticas de inclusão nas costas da classe média mais abastada, congelando, por exemplo, o salário de juizes por anos e anos. E o que parecia um preço “aceitavel” a pagar acabou sendo o seu pé de barro.
Espero que uma nova experiência da esquerda aconteça em breve e torço para que dessa próxima vez a estratégia seja mais inteligente. Que se construa uma narrativa onde a ética e o mérito não sejam mais apropriados pela direita e sim recursos efetivos no enfrentamento com o real polo opositor: a alta burguesia financeira e imperialista.
putin
19/04/2020 - 11h35
andré,
os juizes brasileiros ganham o quadruplo que os italianos (in termos absolutos, muito mais em termos relativos ao pib ou a renda media) e tem uma “densidade” 7 vezes maior (numero de juizes / populaçao).
nao arriscam o proprio capital, nao perdem nada com as crises economicas.
esta “classe media” (na verdade é classe alta) é pior que a classe empresarial-financeira.
MARINALVA
19/04/2020 - 09h07
Coronavírus: A TRÁGICA SITUAÇÃO DE FORTALEZA E DE TODO O ESTADO DO CEARÁ por quem entende do assunto.
Luis Carlos Azenha entrevista o ex-secretário de saúde do Estado do Ceará, o médico Arruda Bastos.
https://youtu.be/UNbez9NIYPI
André Tenreiro
19/04/2020 - 08h26
Miguel do Rosário, por gentileza, não publique esse primeiro texto que enviei. Ele está incompleto. Esbarrei no botão e foi enviado antes de termina-lo. Copiei a parte enviada e vou escrever o resto. Assim que der lhe envio o outro.
Abs
Rodovalho
19/04/2020 - 03h21
Quero somente comentar um fato que passou despercebido pelo autor do texto: nunca tinha visto uma campanha (mídia, judiciário, legislativo, forças armadas e policiais) tão grande difamando um partido, bem como a malfadada lava jato. Pergunto, sem a lava jato a esquerda teria perdido o poder?
João Henrique Francalino
19/04/2020 - 00h21
Oi Miguel. Ótimo texto. Poderia desenvolver mais seu parágrafo final, prognosticando o papel dos militares e o futuro do governo Bolsonaro. Abs!
Francisco
18/04/2020 - 22h48
Como a distópica série, “The Plot Against America”, baseada no livro de Philip Roth, em cartaz na HBO, que conta ‘a escalada do nazismo nos Estados Unidos após FDR ser derrotado por Charles Lindbergh’, embora não, faz sentido Miguel deitar falação sobre o ‘anti-petismo’, não literariamente com ‘o não ocorrido’ utilizado por Roth, mas abduzindo ‘o ocorrido’: ser consequência e parte de um projeto, por parte da Classe Dominante (à falta de Elite, propriamente dita no Brasil), para criminalizar o PT e líderes, sobretudo Lula, e destruí-los, exatamente para que a história desse ‘dependente’ país não fosse mudada de dentro para fora na forma soberano, utilizando-se de armas por essa Classe Dominante criadas, para manterem-se no poder, sustentados pela desigualdade no cangote do povo brasileiro, além de atenderem a Metrópole com a dependência.
Tal como FDR derrota Lindbergh, o ‘anti-petismo’ como consequência de avassaladora campanha jurídica-midiática, fracassada ao não cumprir o objetivo maior de destruí-lo, é a realidade ao correr da história, por mais que tentem abduzir e reescrever os fatos ‘a lá carte’, ao gosto do freguês da hora, pois passageiro pela simples razão que não sustenta-se à luz dos fatos, e como não é arte, resta ‘fake-news’.
Vincent Velazquez
18/04/2020 - 22h41
O que move a classe média é o medo. E como naquela aventura do Asterix entre os vikings, o medo dá asas.
Alan C
18/04/2020 - 22h25
Algumas considerações:
1) Não conheço a fundo a questão filosófica do termo meritocracia ao longo dos tempos aplicada às classes, porém, na prática, não me parece que o conceito de meritocracia seja usado pelas classes trabalhadoras, pelo contrário, nos últimos anos foi amplamente utilizado pelas classes dominantes quase sempre pra atacar os trabalhadores, dizendo que basta apenas se dedicar que o cidadão chega onde quer, fazendo crer que o filho do milionário e a filha da doméstica partem do mesmo ponto com as mesmas chances.
2) Não me parece ter havido vingança nenhuma na eleição do Trump. O pleito nos EUA é diferente, a Hillary esteve na frente em absolutamente todas as pesquisas de intenção de voto, da primeira à ultima. Os eleitores dela acharam – erroneamente – que a eleição já estava ganha e muitos não foram votar, ao passo que os eleitores do Trump compareceram em massa e conquistaram os delegados que precisavam.
3) Se a pergunta fosse “Bozo NÃO TEM capacidade de liderar o Brasil” talvez o resultado fosse diferente. O grau de instrução do brasileiro é horroroso e muitos tem a tendência de concordar com a pergunta, sem contar que pesquisa por telefone quase sempre tem resultado consideravelmente diferente de uma feita por questionário onde não há apenas perguntas estimuladas.
4) Senti falta da classe média de 3 a 5 salários. Se tivessem sido incluídos provavelmente a avaliação do bozo seria ainda pior.
Redação
19/04/2020 - 11h21
Não se pode confundir a verdadeira meritocracia, onde as chances são equânimes, com a falsa meritocracia, onde apenas o rico tem oportunidade. A verdadeira meritocracia é uma aspiração milenar da classe trabalhadora, porque ela intui que, em ambientes minimamente justos, ela vence. Até mesmo pelo fato básico de sua superioridade numérica.
Tiago Silva
18/04/2020 - 21h29
Análise enviesada em muitos sentidos. Inicia o texto de forma a querer ampliar um anti-petismo que leva toda a esquerda junto. Utiliza-se muitas vezes os mesmos argumentos utilizados por MBL ou Vem Pra Rua… Inicialmente aponta-se o viés acima, pois esse argumento revanchista eram usados por estes para inflar uma aspiração por direitos além dos já realizados para gerar insatisfações. De outro modo não quer enxergar que os Think Tanks que guiaram a argumentação da classe média (equiparável a Ipês e IBADs de um passado possivelmente comparável) se utilizaram de conceitos como “mérito” para que se ampliasse um ódio aos que necessitavam de rendas mínimas (e que moveu a política de consumo que inclusive gerou bastante crescimento para as classes médias) e não enxergar que isso incitou uma onda de neofascistas (remodelado como o neoliberalismo que pregam aqui) e, pior, fez se criar uma lente ideológica para que não se enxergasse os feitos do PT (ou quaisquer outro partido/político de esquerda – como o ódio que também têm a Brizola por exemplo) ou manter uma classe média em um delírio para que não enxergasse a realidade com Temer ou Bolsonaro. Desde a Ditadura Militar, a classe média pode ser dividida entre alta classe média e baixa classe média…e se busca na desigualdade para que ampliasse os ganhos da alta classe média (aspiração que se observou na Ditadura Militar, Collor, FHC e Temer/Bozo). Claro que o sistema tributário não foi alterado nós governos do PT o que modificou pouco a estrutura de os ricos sempre ganharem e o resto pagando a conta, mas a ampliação do Simples, Mei, gastos governamentais do PAC, concursos públicos (e aumento de rendimento de servidores), não tributação de lucros e dividendos fizeram os maiores ganhos da classe média em 50 anos… Porém hoje alimenta-se o delírio para que não se compare ou de perceba a realidade.
Outro viés dessa análise está na pesquisa propriamente dita. Pois não se observa a alteração na baixa classe média (apesar de se ver alteração na alta classe média e ricos, que tem ganhos maiores que 30 SM), além de se deixar escapar que o Bolsonarismo nasceu via orientação política de Olavo de Carvalho no sentido de se criar uma “elite” (na mídia, mídias sociais, graduados, etc) que iria influenciar as camadas inferiores… E isso está se conseguindo através da adesão dos pobres (que antes eram legais ao Getulismo/Lulismo) e que o Bozo está penetrando. Isso deveria ser motivo de preocupação, pois não se vislumbra algum outro líder ocupando espaço na classe média, mas se vê a esquerda (inclusive a que embarca no anti-petismo) perdendo o povão que é muito mais populoso.
As lentes ideológicas deturpam a realidade, cegam ou até fazem alguma viverem no delírio (como citei quando da formação de Bolsominions ou Novominions por inúmeras Think Tamos) e isso assola também quem se diz de esquerda – como quem escreveu o texto dessa notícia.
Alexandre Neres
18/04/2020 - 19h58
O Miguel não tá batendo bem. Só pode. Se não, vejamos.
“Todas aquelas narrativas de que a classe média não gostava do PT porque odiava pobre, porque se irritava com pobre andando de avião, e porque, no limite, era ‘fascista’, eram argumentos inventados para demonizar categorias sociais classificadas como adversárias.”
“Alguns valores desta classe que passaram a ser vistos como característicos de “elite”, como a sensibilidade à questão ética, à disciplina, à meritocracia, são, ao contrário, valores históricos, em todos os tempos, das classes trabalhadoras. Por razões inúmeras cuja análise não é o escopo desse texto, o relativismo ético, a cultura do ócio e o desprezo pela meritocracia são características da elite brasileira.”
“O que às vezes é apresentado como ‘preconceito contra o pobre’ nada mais é do que um preconceito muito arraigado no espírito das classes trabalhadoras, contra a cultura do ócio, a indisciplina, e preguiça. Esse preconceito, que nasce todavia de um valor nobre, que é o amor pelo trabalho e em seu poder de transformação, tem sido manipulado com certa facilidade pelas elites, para jogar os trabalhadores contra seus próprios irmãos.”
Meudels, quanta abobrinha. Desta vez, vou me abster de rebater. Só ler certas coisas é o maior contraponto que se pode fazer. A proximidade com o campo bolsonarista é imensa, por isso nem vale a pena entrar nesse jogo. Fica fácil de entender porque 32% da população acha que a situação vai melhorar com a saída do Mandetta ou porque uma enorme parcela apoia a condução do bolsonero como timoneiro em tempos de pandemia. Pra mim, o Capitão Corona saiu bem na fita no Datafolha.
Argumentos inventados pelo petê pra demonizar classes sociais. Tá. Ora ora, era natural que a classe média não quisesse dividir elevador social, shopping, faculdade particular, universidade pública, aeroporto e quetais, pois esses feudos sempre foram seus.
Bem, já que não temos ética, diferentemente dos anglossaxões e dos holandeses, por exemplo, pelo menos vamos transplantar para cá a ideia de meritocracia. Se não há igualdade de oportunidade e de condições, então organizemos a nossa corrida de 100 metros. Tudo bem que uns poucos vão sair dos 90 metros, uma parcela um pouco maior dos 50 metros, mas não faz mal nem vai haver prejuízos estatísticos, até porque a maioria absoluta vai sair da linha de saída e descalça.
A disciplina é um valor histórico de todos os tempos da classe trabalhadora. Miguel, só por curiosidade, você já leu Foucault? Esse amor pelo trabalho e seu poder de transformação é uma característica genuína do homem? Esses valores vêm desde a Antiguidade ou é algo mais recente? Devemos todos nos pautar por essa visão? O que acha de Max Weber? Hanna Arendt? Hein, Miguel? Definitivamente, essa quarentena não te fez bem.
Redação
19/04/2020 - 11h23
Sim, já li tudo isso. Não sou dono da verdade assim como ninguém é. Estou muito bem, obrigado. É preciso pensar com originalidade pra entender o buraco em que nos enfiamos.
Tiago Silva
19/04/2020 - 14h31
Alexandre Neres,
As lentes ideológicas ainda no Miguel do Rosário não estão fazendo ele perceber que utiliza os mesmos argumentos fomentados por Think Tanks como MBL e de Bolsomínions de toda ordem…
Brizola e Darcy Ribeiro tinham uma tirada ótima para descrever essa introdução do texto do Miguel do Rosário que não quer evoluir para além do anti-petismo que dragou toda a esquerda:
É a esquerda que a Direita gosta…
Kayk Santos
18/04/2020 - 19h53
Parabéns, Miguel pela análise cuidadosa. O argumento sobre o antagonismo de classe forjado pelo PT é preciso. Como simpatizante da esquerda, sempre estive sensível a esse argumento mesmo intuindo que não correspondia de fato ao que testemunhava na prática. Enfim, a sua análise destaca aspectos relevantes nesse quadro cultural. O prognóstico sobre Bolsonaro é um alento.
Paulo
18/04/2020 - 19h49
Hoje, quem apoia incondicionalmente Bolsonabo são os evangélicos, alguns conservadores de vertentes variadas e certa fatia do empresariado, que se beneficia diretamente do intervencionismo pró-patronato do Capetão nas relações de trabalho, como Véio da Havan e companhia (quanto aos ruralistas já tenho dúvidas a respeito, pelo menos acerca da quase-unanimidade, num passado recente). De qualquer forma, esse grupo, que representa algo em torno de 1/3 do eleitorado, e que tende a não abandoná-lo em 2022, é um “bastião” quase inamovível, acredito que mesmo diante de uma carnificina no Sistema de Saúde que, aparentemente, se avizinha, talvez já pro final de abril…Em sendo assim, ele precisaria arrebatar, para ser reeleito, uma faixa “flutuante” de eleitores, também refratários à esquerda, mas que não mais o apoiarão a qualquer preço. Por isso, acho que a esquerda teria que apoiar um candidato de centro, apartado do lulo-petismo, para atrair essa faixa oscilante. Mas quem?
Wellington
19/04/2020 - 22h45
Doria ou Frota…kkkkkkkkk
José Souza Filho
18/04/2020 - 18h58
Sou leitor assíduo desta página. Discordo de muita coisa que é postada, mas isso é normal. O que vale é que aqui se pensa fora da caixinha e dos dogmas. E isso amadurece qualquer debate ou reflexão teórica. Essa questão do conceito de classe é um conceito mal resolvido na tradição marxista, ressalvado o trabalho de Olin Wright. O que chamamos de classe média é algo muito complexo, cheio de divisões internas ( que vai do assalariado ao pequeno e médio empreendedor). Há comportamentos distintos dentro de tudo isso.E os tais “valores” de meritocracia, disciplina, trabalho, ética, etc e tal, nem sempre vão além de um ideário meramente retórico. Mas esse é um debate muito longo…
Mas uma coisa é certa: pra onde a classe média tende, o resultado eleitoral também tende a seguir.
Paulo Cesar Cabelo
18/04/2020 - 18h41
Embora eu admita que Miguel disse muita coisa que faz sentido nesse texto sobre o PT e a classe média essa glorificação moralista do trabalho e da meritocracia é equivocada.
A meritocracia é a mãe do Nazismo , então um deficiente mental grave que não pode trabalhar vale menos do que eu e você Miguel?
Você contraria o maior filósofo do século vinte Sr Madruga.
“Não existe um mal trabalho o mal é ter que trabalhar”
Aonde estaria a humanidade se Newton , Einstein , Freud , Nietzche ou mesmo Jesus Cristo tivessem que trabalhar para prover seu próprio sustento?
Eu , assim como Aristóteles , sonho com o dia em que teremos máquinas para fazer todo trabalho e a humanidade possa se dedicar inteiramente ao prazer e evolução intelectual.
É fácil pregar o trabalho quando se ganha a vida com um blog , sem chefe enchendo o saco e sem acordar cedo pra pegar ônibus lotado.
Redação
18/04/2020 - 18h52
Sua interpretação da meritocracia é estranha. Além disso, achar que Newton não “trabalhava” é bizarro. De resto, não entendi nada do que você disse. A cultura da meritocracia, de qualquer forma, é bem diferente de valorizar o sofrimento. É uma outra coisa.
Paulo Cesar Cabelo
18/04/2020 - 20h31
Newton não trabalhava de fato , assim como qualquer cientista , filósofo ou artista.
Cientistas estudam , filósofos pensam , artistas fazem arte.
.Assim como Jesus e Buda não trabalhavam de fato , talvez você se ache superior a eles.
Quem tem mais mérito , um faxineiro que limpa uma escola ou um blogueiro?
Acredito que esse blog lhe renda muito mais do que qualquer faxineiro ganha , isso não é nada meritocrático.
Mérito é uma questão de ponto de vista , por isso a meritocracia é uma falácia enorme , acredito na igualdade e na solidariedade , assim como os “vagabundos” Jesus e Buda.
Paulo
19/04/2020 - 12h32
“Quem tem mais mérito , um faxineiro que limpa uma escola ou um blogueiro?”
Para você, o faxineiro, pelo que entendi. Mas aí, você se contradiz, pois pretende justamente suprimir o trabalho braçal para aquinhoar a humanidade de livres pensadores e artistas, como se estes formassem uma elite da humanidade, e privilegiada, ainda. Privilégio que você reivindica para todos, aparentemente, o que é justo (desde que todos queiram, naturalmente).
Para mim, ambos podem ter méritos e deméritos, tanto em termos de capacidade para o trabalho que exercem quanto do ponto de vista moral, o que já não decorre do trabalho em si, mas se antepõe a ele e o influencia…
André Tenreiro
19/04/2020 - 08h10
Paulo César Cabelo, por mais que eu concorde que a meritocracia e o amor a disciplina sejam utilizados para o controle e limitação da ascensão dos trabalhadores – apesar de serem “vendidas” como o oposto – é fato irrefutável que os trabalhadores se agarram a tais princípios também para se diferenciar e manter sua posição em relação ao que Marx chamou de lumpensinato. O texto acerta quando diz que a classe média reproduz os valores hegemônicos “operários”. Como o PT sempre representou aquela parte da classe média que buca ouvir o “grito dos excluidos”. Acabou rompendo o diálogo com seus pares de classe. Ao dar voz a camelôs, índios, profissionais do sexo e a todos os que não se enquadravam
Redação
19/04/2020 - 11h17
Exatamente!
Alan C
19/04/2020 - 12h46
Obrigado por compartilhar seu conhecimento conosco, André.
Vando
19/04/2020 - 09h37
Pelo que entendi vc acha que devemos viver sem trabalhar.
pedrowilsonneto@gmail.com
18/04/2020 - 17h45
Fantastica annalise Miguel!!Parabens!!!