
Boicotes e tensões geopolíticas afetam setor de viagens e pressionam projeções do PIB
A retração nas viagens internacionais aos Estados Unidos e os boicotes a produtos norte-americanos podem provocar uma perda de até 0,3% no Produto Interno Bruto (PIB) do país em 2025, segundo estimativa do Goldman Sachs Inc.
O valor representa aproximadamente US$ 90 bilhões e se soma a um conjunto de fatores que mantêm elevado o risco de desaceleração econômica.
De acordo com dados divulgados nesta segunda-feira pela Administração de Comércio Internacional (International Trade Administration – ITA), as chegadas de passageiros estrangeiros por via aérea aos EUA recuaram quase 10% em março na comparação anual.
O declínio ocorre após anos em que o turismo internacional vinha contribuindo positivamente para a economia, sobretudo com o fim das restrições impostas pela pandemia.
Os analistas atribuem parte do recuo ao aumento de tensões diplomáticas, políticas tarifárias e à percepção de endurecimento nos procedimentos de entrada no país.
Em março, a ITA havia projetado 77 milhões de visitantes internacionais aos EUA em 2025, número próximo ao recorde registrado em 2019. A previsão incluía a possibilidade de um novo pico em 2026. No entanto, os indicadores mais recentes têm levado a revisões nas projeções.
Relatos sobre detenções de viajantes de países como França e Alemanha em aeroportos norte-americanos impactaram negativamente a imagem do país entre turistas.
No Canadá, principal origem de turistas internacionais nos EUA, medidas recentes adotadas pelo presidente Donald Trump, incluindo tarifas sobre produtos canadenses e declarações sobre anexação territorial, têm influenciado decisões de viagem.
Curtis Allen, cinegrafista canadense, afirmou ter cancelado suas férias nos Estados Unidos após as declarações de Trump e mencionou também a suspensão de uma assinatura de serviço de streaming e a recusa em adquirir produtos norte-americanos. “Vamos gastar o mesmo dinheiro em outro lugar”, afirmou.
A Bloomberg Intelligence calcula que cerca de US$ 20 bilhões em gastos de varejo de turistas internacionais nos EUA estão em risco. No ano passado, viajantes estrangeiros deixaram um total de US$ 254 bilhões no país, segundo a ITA.
O Bureau of Labour Statistics (Departamento de Estatísticas do Trabalho) informou que passagens aéreas, diárias de hotéis e aluguéis de carros registraram queda em março, refletindo, em parte, a menor demanda internacional.
A redução nos preços foi observada especialmente na região nordeste, onde a queda nas tarifas de hospedagem chegou a 11%, segundo Omair Sharif, presidente da consultoria Inflation Insights.
“Considerando o que sabemos sobre a queda nas viagens para o Canadá, isso pode ser um pouco preocupante para a região”, declarou Sharif.
A Rainbow Air Helicopter Tours, empresa localizada nas Cataratas do Niágara, investiu US$ 25 milhões em nova estrutura e equipamentos em preparação para a alta temporada. O gerente de vendas e marketing da empresa, Patrick Keyes, afirmou que o momento é de expectativa. “Estamos aguardando para ver os resultados”, disse.
Segundo relatório da OAG Aviation Worldwide, as reservas de voos do Canadá para os Estados Unidos caíram 70% até setembro em comparação com o mesmo período do ano anterior.
Já a rede hoteleira Accor SA apontou queda de 25% nas reservas de turistas europeus para o verão de 2025. O CEO da empresa, Sébastien Bazin, relacionou a redução a episódios de detenções na fronteira, que geram receio e direcionam os turistas a outros destinos.
Economistas do Goldman Sachs, Joseph Briggs e Megan Peters, afirmaram que “os anúncios de tarifas dos EUA e uma postura mais agressiva em relação aos aliados históricos prejudicaram as opiniões globais sobre os EUA”.
Para eles, a retração no turismo representa mais um fator que pode levar o crescimento econômico do país a ficar abaixo das expectativas em 2025.
A Travel Oregon, comissão de turismo do estado do Oregon, informou que continua promovendo o destino no exterior, mesmo diante do cenário adverso.
O diretor-executivo da entidade, Todd Davidson, disse que a equipe participou de uma conferência de turismo de aventura em Vancouver e deve receber, nas próximas semanas, representantes de vendas de países como Reino Unido, Índia e Brasil.
Apesar dos esforços internacionais, Davidson indicou que a entidade já considera a possibilidade de realinhar o foco para o público doméstico. “O Oregon não está e não desviará os olhos desses mercados internacionais. Estaremos aqui quando nossos visitantes internacionais sentirem que estão prontos para retornar”, declarou.
O impacto do turismo sobre o desempenho econômico dos Estados Unidos é monitorado por diferentes instituições. Além da contribuição direta para o consumo e o setor de serviços, o fluxo de visitantes tem influência sobre as cadeias de fornecimento, emprego local e investimentos regionais.
O agravamento das tensões diplomáticas e as consequências das políticas comerciais em curso adicionam novos elementos de risco à conjuntura econômica projetada para os próximos trimestres.