FMI impõe desvalorização do peso antes de liberar US$ 20 bi à Argentina

No Minuto Uno, o jornalista Gustavo Sylvestre compartilhou um vídeo onde o editor do Coindesk, Danny Nelson, confirmou que o cofundador da $Libra, Hayden Davis, disse que poderia controlar os irmãos Milei com dinheiro.No Minuto Uno, o jornalista Gustavo Sylvestre compartilhou um vídeo onde o editor do Coindesk, Danny Nelson, confirmou que o cofundador da $Libra, Hayden Davis, disse que poderia controlar os irmãos Milei com dinheiro.

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Dólares frescos para Caputo e Milei.

O governo argentino anunciou a assinatura de um novo acordo de dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI) no valor de 20 bilhões de dólares. Na prática, trata-se de um resgate financeiro em meio à forte pressão cambial que, nos últimos meses, forçou o Banco Central a gastar bilhões de dólares para evitar uma nova desvalorização. Isso ocorreu em um cenário de reservas negativas e inflação que voltou a subir, alcançando 3,7% em março, acumulando três meses consecutivos de alta. Na noite de sexta-feira, o presidente Javier Milei celebrou o acordo em rede nacional: “A Argentina passou a ser o melhor aluno”, disse.

O aceno do FMI vem acompanhado do que soa como uma desvalorização disfarçada do câmbio oficial. Foi anunciada a eliminação das restrições cambiais e a implementação de um regime de bandas de flutuação livre do dólar, no qual o Banco Central não intervirá diretamente vendendo reservas. O teto da banda será de 1400 pesos a partir de segunda-feira, enquanto o piso será de 1000 pesos. Ambos se moverão 1% ao mês em direções opostas, ampliando gradualmente o intervalo. Mesmo assim, com Caputo no comando e recursos frescos em caixa, o governo poderá tentar conter o dólar dentro da banda.

As restrições cambiais serão completamente eliminadas para pessoas físicas, permitindo a compra de dólares sem limite. Para empresas, a liberação será parcial: lucros acumulados até o fim de 2023 continuam bloqueados, mas os ganhos futuros poderão ser enviados ao exterior. O “dólar turista” será mantido, o acesso a divisas para importadores será facilitado e será extinto o chamado “dólar blend”, que permitia aos exportadores vender parte de suas receitas no mercado paralelo.

Falando em tom refundacional, Milei afirmou: “Hoje podemos dizer que está concluído o processo de ordenamento macroeconômico da Argentina. Passamos de ser o pior aluno a ser o exemplar. O programa aprovado pelo FMI é inédito: pela primeira vez, não se financia uma economia desordenada, mas sim um plano que já mostrou resultados”. Também prometeu mais ajuste em caso de novas turbulências.

A diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgieva, elogiou os “esforços impressionantes” de desregulamentação da economia e destacou que o programa busca aprofundar reformas estruturais para impulsionar o crescimento, especialmente nos setores de energia e mineração.

Exaltação oficial

Nesta sexta-feira, o governo se mostrou eufórico com o anúncio. Além do discurso de Milei, o ministro da Economia, Luis Caputo, afirmou que a Argentina será o país que mais crescerá nas próximas duas ou três décadas, que está entre as cinco economias mais bem preparadas para enfrentar choques externos e aproveitou a coletiva de imprensa para agradecer, como uma celebridade, seus colaboradores e familiares.

Essa demonstração de autoconfiança, independentemente de sua veracidade interna, é essencial para convencer o mercado. O governo precisa urgentemente que os investidores voltem a confiar em Caputo para reativar o ciclo da “bicicleta financeira” que tanto beneficiou o ministro no passado. Em relação a investimentos produtivos, a aposta está nos setores primários exportadores, como mineração e energia, por meio do RIGI.

O otimismo também precisa ser vendido à população: após o forte choque inflacionário do início do mandato, que corroeu os salários, o governo se prepara para nova alta da inflação, agora vinculada à valorização do dólar oficial. Se o câmbio chegar ao teto da banda, isso representará uma desvalorização de 30%, um número expressivo mesmo para os padrões históricos do país.

Vale lembrar que a Argentina tem vasta experiência com anúncios de acordos “históricos” com o FMI que acabam em ruína social. O último, em 2018, teve justamente Luis Caputo como secretário de Finanças e depois presidente do Banco Central. O fracasso daquela negociação faz parte central da herança que o próprio Caputo — agora ministro — critica, sem entrar em muitos detalhes.

Apoio empresarial

As principais entidades empresariais do país saíram em apoio ao governo. A Associação Empresária Argentina (AEA) declarou que o acordo “ajudará a dinamizar a atividade econômica, aumentar a previsibilidade e estimular os investimentos produtivos”.

O Instituto para o Desenvolvimento Empresarial da Argentina (IDEA) afirmou que “a liberação do controle cambial e o novo acordo com o FMI, voltado a fortalecer o patrimônio do Banco Central, terão efeitos positivos sobre o investimento e o acesso ao crédito”. A Câmara Argentina de Comércio e Serviços (CAC) também se pronunciou favoravelmente.

Era parte da estratégia

Repetindo a estratégia de Marcelo Gallardo em 2018, quando o River Plate deu a volta por cima após um péssimo início de ano, Caputo sugeriu que “perder fazia parte do plano”, para esconder que, sem o acordo, o programa econômico estava à beira do colapso.

Segundo o ministro, agora começa a terceira etapa do plano econômico, mas o acordo com o FMI já estaria fechado desde meados do ano passado. “Temos o esquema cambial fechado com o Fundo há oito meses”, disse Caputo. O atraso se deu, segundo ele, pelo valor elevado do pedido (20 bilhões de dólares) e do primeiro desembolso (12 bilhões). “Não há precedentes de um adiantamento tão alto. Nosso argumento foi que, ao contrário de outras vezes, o país já havia feito o dever de casa”, afirmou.

A incerteza que se abre agora, com possível efeito inflacionário, é justamente o que o governo tentou evitar para não comprometer suas chances eleitorais. O acordo com o FMI, antes duramente criticado por Milei, virou a tábua de salvação. Agora, Milei e Caputo jogam suas fichas: esperam que o mercado confie novamente e que os dólares frescos sustentem a abertura das importações e ajudem a controlar os preços. É uma aposta de risco, pois esses dólares são toda a munição disponível do Banco Central diante de um mercado que estará mais livre e poderoso.

O acordo

Segundo Caputo, o novo acordo prevê um desembolso imediato de 12 bilhões de dólares, programado para esta terça-feira. Em junho, virão mais 2 bilhões, e outros 1 bilhão até o fim do ano, totalizando 15 bilhões de dólares em 2025. A isso se somam 2,5 bilhões do Banco Mundial e do BID, além de 2 bilhões por meio de operações REPO do Banco Central.

O ministro também insistiu que “a dívida não aumenta, na verdade diminui”, pois a nova dívida quita títulos que o Tesouro havia emitido ao Banco Central. No entanto, trata-se de substituir dívida interna em pesos por dívida externa em dólares com organismos internacionais — uma troca com implicações bastante distintas.

Caputo reafirmou ainda o compromisso do governo com o ajuste fiscal, elevando a meta de superávit de 1,3% para 1,6% do PIB em 2025. “Máxima ortodoxia fiscal e monetária”, definiu.


Autor: Javier Lewkowicz
Data de publicação: 12 de abril de 2025
Fonte: Página/12

Redação:
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