O governo brasileiro monitora com atenção os sinais emitidos por Washington sobre uma possível mudança na política comercial dos Estados Unidos sob a liderança do presidente Donald Trump.
Segundo informações publicadas pela Folha de S.Paulo, integrantes do Palácio do Planalto consideram real a possibilidade de imposição de tarifas abrangentes a produtos brasileiros, medida que pode ser oficializada a partir de 2 de abril como parte de um pacote baseado no princípio de reciprocidade.
A avaliação no governo brasileiro é que o país pode ser atingido por um conjunto tarifário mais amplo do que o inicialmente previsto.
A preocupação vai além das tarifas já aplicadas ao aço e alumínio, em vigor desde 12 de março, e das negociações em torno do etanol.
A possibilidade de uma elevação tarifária sobre diversos itens da pauta exportadora brasileira para os Estados Unidos é tratada como um cenário relevante pelas autoridades.
O plano anunciado pela gestão Trump é baseado na ideia de que os Estados Unidos devem adotar uma política comercial mais agressiva, com foco na reciprocidade tarifária.
A proposta prevê a análise individualizada de cada parceiro comercial, com base em critérios como alíquotas, barreiras não tarifárias, práticas cambiais, subsídios e normas trabalhistas.
Em entrevista à emissora Fox Business, o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, explicou o funcionamento da estratégia.
“No dia 2 de abril, nós vamos produzir uma lista das tarifas dos outros países e vamos dizer a eles: aqui está o que achamos sobre as suas tarifas, [sobre] barreiras não tarifárias, manipulação de câmbio, subsídios injustos e supressão de direitos trabalhistas. Se vocês pararem com isso, nós não vamos erguer a muralha tarifária. Caso contrário, vamos erguer a muralha tarifária para proteger nossa economia, nossos trabalhadores e nossa indústria”, afirmou.
“Cada país vai receber um número que, acreditamos, representa as suas tarifas. Então, para alguns países, poderia ser [uma tarifa] baixa. Para alguns, poderia ser bastante alta”, completou.
Apesar de contatos diplomáticos mantidos pelo Itamaraty com representantes do governo norte-americano, as informações repassadas até o momento são consideradas insuficientes para medir a real extensão das medidas em estudo. Segundo fontes diplomáticas, os interlocutores dos EUA têm evitado detalhar o alcance do pacote tarifário.
O etanol tem sido um dos principais pontos das conversas bilaterais. O governo norte-americano questiona a tarifa brasileira de 18% sobre o produto, enquanto aplica alíquota de 2,5% para o combustível importado do Brasil. Representantes brasileiros afirmam que não há indicação clara de quais setores serão diretamente impactados pelas possíveis novas medidas.
Relatos da imprensa norte-americana, incluindo o Wall Street Journal, indicaram que o governo Trump chegou a considerar a divisão dos parceiros comerciais em três faixas tarifárias, com base no grau de protecionismo adotado por cada país.
No entanto, essa proposta teria sido substituída por uma abordagem caso a caso, na qual cada país receberia uma classificação específica com base em critérios definidos pelo governo dos Estados Unidos.
No Brasil, a equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanha os desdobramentos com preocupação. A avaliação no Palácio do Planalto é de que uma escalada tarifária poderá afetar significativamente a balança comercial entre os dois países.
Segundo dados da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham), as exportações industriais brasileiras para os Estados Unidos somaram US$ 31,6 bilhões em 2024.
O mercado norte-americano é o principal destino dos produtos industriais brasileiros, com destaque para aeronaves, peças, maquinário, motores, produtos químicos e bens metalúrgicos.
De acordo com a Amcham, oito dos dez principais itens exportados pertencem ao setor de indústria de transformação, o que amplia a preocupação sobre os possíveis impactos diretos na estrutura da economia exportadora brasileira.
Além disso, novas investigações comerciais conduzidas pelo governo norte-americano incluem setores como cobre e madeira, que também integram a pauta exportadora do Brasil.
O último relatório do Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR), publicado ainda durante a administração de Joe Biden, já apontava que o Brasil aplicava tarifas médias de 11,1% em diversos setores.
O histórico reforça a percepção de que o país pode ser enquadrado como parceiro comercial com alto grau de proteção, passível de retaliações no contexto de uma política comercial baseada na reciprocidade.
Diante da ausência de informações concretas e da postura adotada pela gestão Trump, o governo brasileiro trabalha com múltiplas hipóteses sobre a possível configuração do novo pacote tarifário. Interlocutores próximos ao Planalto afirmam que os impactos dependerão da abrangência das medidas a serem anunciadas nas próximas semanas.
A perspectiva de uma elevação generalizada de tarifas é tratada como uma possível origem de instabilidade no comércio bilateral.
A avaliação interna é que, caso se confirmem medidas de grande escala, o Brasil poderá ser inserido em uma nova dinâmica de disputas comerciais, cujos efeitos ainda são considerados incertos.
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