Pesquisadores da China divulgaram os resultados dos primeiros ensaios clínicos avançados de uma terapia experimental contra o câncer baseada na utilização de um vírus geneticamente modificado.
A tecnologia, segundo os cientistas, foi capaz de provocar colapso tumoral em pacientes em estágio terminal, em casos em que os tratamentos convencionais não apresentaram eficácia.
A pesquisa foi conduzida por uma equipe do Primeiro Hospital Afiliado da Universidade de Zhejiang, liderada por Liang Tingbo, do departamento de cirurgia hepatobiliar e pancreática. Os resultados foram publicados em artigo na revista Nature no dia 20 de março.
A terapia utiliza o vírus herpes simplex modificado, identificado como VG161. De acordo com os pesquisadores, o vírus demonstrou capacidade de se infiltrar em tumores hepáticos resistentes a medicamentos e desestruturar suas células, enquanto promovia o fortalecimento da resposta imunológica dos pacientes.
O ensaio clínico foi aprovado no ano passado para avançar para uma nova fase de testes sob o protocolo de emergência adotado pelas autoridades regulatórias da China.
A autorização se baseou nos dados preliminares obtidos com 40 pacientes com câncer de fígado, nos quais foi registrada uma expectativa de vida significativamente superior em relação aos padrões observados com tratamentos anteriores.
Segundo o relatório da equipe médica, o VG161 também reverteu a resistência observada em determinados tumores à imunoterapia. Os cientistas afirmam que os chamados tumores “frios”, considerados pouco responsivos ao tratamento imunológico, passaram a ser classificados como “quentes”, ou seja, susceptíveis a intervenções terapêuticas.
A pesquisa insere-se em uma estratégia de desenvolvimento de terapias oncolíticas por meio de vírus modificados geneticamente, área que tem sido foco de estudos em diferentes países.
O artigo afirma que os resultados obtidos colocam a China em posição de destaque na área, tradicionalmente dominada por instituições dos Estados Unidos e Japão.
A equipe científica informou que a terapia poderá permitir que pacientes sejam submetidos a aplicações repetidas do vírus até que a progressão da doença seja controlada.
O protocolo prevê que a aplicação possa ser retomada em diferentes ciclos, com o objetivo de impedir a retomada do crescimento tumoral.
O estudo foca em tipos de câncer considerados de alta letalidade e difícil controle, como o câncer hepático e o câncer gástrico. A proposta dos pesquisadores é ampliar a utilização da tecnologia viral em terapias combinadas, integrando o VG161 a outros agentes imunoterapêuticos.
O artigo não especifica ainda os dados detalhados da taxa de sobrevida global dos pacientes nem os efeitos adversos observados durante os testes, mas indica que a nova fase da pesquisa, já aprovada, buscará expandir o número de participantes e consolidar a segurança clínica da abordagem.
O uso de vírus modificados para combate ao câncer tem sido explorado em outros países, mas ainda enfrenta desafios regulatórios e técnicos. A proposta se baseia na capacidade do vírus de invadir preferencialmente células cancerígenas, destruí-las e, simultaneamente, ativar o sistema imunológico do paciente contra os tumores.
A publicação ressalta que o avanço registrado representa uma mudança nos métodos de tratamento e uma possível expansão das alternativas terapêuticas para pacientes em estágios avançados da doença.
O estudo está em fase de transição para ensaios multicêntricos com amostras maiores. A expectativa dos pesquisadores é que os dados da nova etapa sejam analisados por órgãos reguladores para possível aprovação do uso clínico em larga escala, caso os resultados de eficácia e segurança sejam mantidos.
O governo chinês tem apoiado projetos de desenvolvimento de biotecnologias para aplicação na área da saúde. Nos últimos anos, diferentes centros de pesquisa no país passaram a integrar plataformas de ensaios clínicos voltados ao uso de agentes virais no tratamento de câncer, doenças autoimunes e infecções resistentes.
O avanço da terapia baseada no VG161 reforça a tendência de utilização de abordagens combinadas no combate a tumores. A integração de ferramentas genéticas e imunológicas tem sido apontada como uma das principais linhas de desenvolvimento de medicamentos oncológicos em nível global.
Até o momento, não há previsão de submissão da tecnologia desenvolvida na China a outras agências internacionais, como a FDA (Agência de Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA) ou a EMA (Agência Europeia de Medicamentos), mas os responsáveis pelo estudo afirmaram que os próximos estágios da pesquisa devem incluir parcerias com centros de outros países.
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