Informações preliminares coletadas pelo telescópio Euclid, da Agência Espacial Europeia (ESA), levantam questionamentos sobre a atual compreensão da energia escura e sua relação com a expansão do universo.
O anúncio foi feito durante coletiva de imprensa conduzida pela diretora científica da ESA, Carole Mundell, com base em dados divulgados nesta semana.
Os primeiros resultados, divulgados com o apoio de 27 artigos científicos, representam menos de 0,5% da área total que será observada ao longo da missão, prevista para durar seis anos.
Lançado em 2023, o telescópio Euclid tem como objetivo mapear cerca de um terço do céu e catalogar informações de aproximadamente 1,5 bilhão de galáxias, criando um mapa tridimensional da estrutura cósmica.
Durante a apresentação, Carole Mundell afirmou: “A teoria da relatividade de Einstein passou por inúmeros testes, mas ainda não explica, em sua forma atual, a expansão acelerada do universo”.
A declaração foi feita em referência à possibilidade de que a energia escura, descoberta em 1998, esteja passando por transformações ainda não explicadas pelos modelos teóricos vigentes.
A energia escura é considerada a principal responsável pela aceleração da expansão do universo, fenômeno identificado no final da década de 1990 por meio da observação do afastamento progressivo das galáxias.
A teoria da relatividade geral, formulada por Albert Einstein no início do século XX, não oferece explicação completa para essa dinâmica em sua versão atual.
O Euclid busca fornecer dados capazes de testar as leis da gravidade em escalas cosmológicas. “No final das contas, queremos testar as leis da gravidade”, declarou Mundell. A coleta de dados permitirá aos pesquisadores rastrear a interação entre matéria escura e energia escura ao longo da história do universo.
A matéria escura, segundo os modelos cosmológicos, atua na coesão das galáxias, enquanto a energia escura exerce efeito oposto, promovendo a expansão acelerada do espaço. Os dados preliminares obtidos pelo Euclid contribuem para aprofundar a investigação sobre o comportamento dessas forças.
Ofer Lahav, pesquisador da University College London, classificou o momento como significativo para a física cósmica.
“Estamos à beira de uma das maiores descobertas em astronomia em uma geração”, declarou. Segundo ele, os indícios observados até o momento podem indicar a necessidade de reformulação dos modelos teóricos atualmente adotados.
O relatório da missão destaca a identificação de elementos da chamada “teia cósmica”, estrutura formada por filamentos que conectam galáxias em padrões não explicados apenas pela matéria visível. Cientistas apontam que forças invisíveis, como a matéria escura e a energia escura, desempenham papel central na formação desse padrão.
O Consórcio Euclid, responsável pela análise dos dados, é formado por cerca de dois mil pesquisadores de países como Alemanha, França, Itália, Reino Unido, Estados Unidos, Canadá e Japão. O grupo classificou a divulgação dos dados como um “marco para nosso detetive do universo escuro”.
Apenas uma semana de observação gerou 35 terabytes de dados. Essa quantidade equivale a cerca de 200 dias de vídeo em resolução 4K, segundo estimativas do consórcio. As informações divulgadas até o momento abrangem três regiões celestes e incluem o registro de aproximadamente 26 milhões de galáxias, algumas situadas a mais de 10 bilhões de anos-luz da Terra.
Entre os fenômenos registrados, os pesquisadores identificaram cerca de 500 lentes gravitacionais, nas quais a luz de objetos distantes sofre curvatura devido à gravidade de galáxias localizadas à frente. Esse efeito permite observar estruturas que, de outra forma, estariam fora do alcance dos instrumentos atuais.
O processo de análise contou com o apoio de inteligência artificial e colaboração de mais de 10 mil voluntários. Os algoritmos de IA foram utilizados na identificação de possíveis lentes gravitacionais, posteriormente revisadas e validadas por especialistas humanos.
Embora os dados iniciais não permitam conclusões definitivas sobre a natureza da energia escura, a ESA aponta que o material reunido ao longo da missão poderá esclarecer as causas da aceleração da expansão do universo. Segundo Mundell, “isso é apenas uma amostra do que está por vir”.
A previsão é que o catálogo completo com os dados coletados seja publicado no próximo ano. Caso os indícios sejam confirmados, os pesquisadores consideram a possibilidade de uma mudança de paradigma na física teórica.
Essa hipótese implicaria a revisão dos modelos que explicam o tempo, o espaço e as forças fundamentais que regem o comportamento do universo.
A missão Euclid integra uma série de projetos internacionais voltados à investigação da matéria escura, energia escura e estrutura cósmica. Os próximos anos devem trazer novos resultados a partir da análise contínua das observações realizadas pelo telescópio.
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