Após um dezembro turbulento, o mercado brasileiro viveu uma reviravolta histórica em janeiro, com juros caindo, dólar recuando e bolsa em alta. Entenda os motivos por trás dessa recuperação surpreendente e o que esperar para os próximos meses
Janeiro terminou com uma recuperação notável nos mercados brasileiros, contrastando fortemente com o pessimismo de dezembro. A curva de juros recuou significativamente, com taxas longas, como a de 2034 e 2035, caindo de 15% para 14,5%, um movimento expressivo. Nos últimos dias, houve um forte rally na curva de juros, refletindo uma série de fatores positivos.
Principais Fatores da Recuperação
- Correção do Exagero Cambial
- O dólar, que chegou a R$6,30 em dezembro, foi considerado um exagero. A valorização recente do real trouxe mais estabilidade ao mercado.
- Ação do Banco Central
- O Banco Central brasileiro mostrou firmeza no combate à inflação e na oferta de liquidez, se necessário, o que gerou confiança no mercado.
- Melhoria no Resultado Fiscal
- O déficit primário do governo central foi praticamente zerado, desconsiderando os gastos emergenciais do Rio Grande do Sul.
- Com ajustes fiscais, o governo teria alcançado um superávit primário.
- O resultado primário do ano fechou em 0,4% do PIB, representando uma economia de R$100 bilhões em relação ao ano anterior e uma contração fiscal de R$100 bilhões por ano nos últimos dois anos.
- Déficit Nominal e Conta de Juros
- Apesar da melhora fiscal, o déficit nominal segue elevado devido aos altos juros.
- Apenas em dezembro, foram pagos R$90 bilhões em juros, e a conta anual de juros se aproxima de 10% do PIB, cerca de R$1 trilhão.
- Moderação no Impulso Fiscal
- As transferências de renda foram contidas no segundo semestre de 2024.
- O ajuste do arcabouço fiscal, aprovado em dezembro, trará mais contração fiscal ao longo de 2025.
- Declarações do Governo
- O presidente Lula fortaleceu a posição do ministro Haddad, reforçando o compromisso com a estabilidade fiscal.
- O governo já terá um Banco Central nomeado inteiramente por Lula e medidas fiscais concretas sendo implementadas.
- Rally da Bolsa e do Real
- A bolsa brasileira subiu 11% em dólar, se descolando de outros mercados emergentes.
- O real se valorizou, após semanas de forte desvalorização.
Fatores Internacionais
- Donald Trump confirmou que imporá tarifas de 25% sobre México e Canadá e avalia uma taxa de 10% sobre a China.
- As tarifas contra a China já são altas desde a gestão de Trump e foram mantidas por Biden.
- Após a decisão do Copom, o mercado abriu mais arisco, mas a curva de juros recuou ao longo do dia, refletindo confiança na política monetária.
Preocupações com Atividade Econômica
- O mercado de trabalho dá sinais de enfraquecimento:
- O CAGED mostrou uma destruição de 550.000 vagas em dezembro, acima da média de 450.000 a 500.000 nos últimos anos.
- Em 2023, foram 400.000 vagas fechadas em dezembro, mostrando um padrão sazonal, mas com uma deterioração maior do que o normal.
- Confiança do consumidor caiu nos últimos dois meses.
- Venda de papelão ondulado, um indicador de produção e embalagens, também recuou.
- Dados de atividade econômica em novembro foram fracos: comércio, serviços e o IBC-Br ficaram estáveis.
- Banco Central já reconhece desaceleração e deve reforçar esse ponto na ata da próxima terça-feira.
Estados Unidos e Política Monetária
- O PIB dos EUA no 4º trimestre veio fraco, fortalecendo expectativas de cortes de juros pelo Fed.
- O PCE, principal indicador de inflação do PIB americano, ficou em 0,3% na última leitura e fechou o ano em 2,6%, próximo da meta de 2%.
- O núcleo da inflação (Core PCE) veio em 0,2% no mês e 2,8% no acumulado do ano.
- O mercado ainda teme que tarifas de Trump possam gerar nova pressão inflacionária, mas ele não deve arriscar um choque que prejudique a economia americana.
Perspectivas para a Próxima Semana
- Dados do mercado de trabalho dos EUA serão cruciais para calibrar as expectativas sobre cortes de juros do Fed.
- Taxa de desemprego no Brasil fechou no menor nível da série histórica, evidenciando um mercado de trabalho aquecido.
- O destaque de janeiro foi a forte recuperação da bolsa, do real e da curva de juros, revertendo o pessimismo extremo de dezembro.
Em resumo, o mês de janeiro foi altamente positivo para o mercado financeiro brasileiro, mostrando uma reprecificação forte dos ativos e uma recuperação das expectativas econômicas. O cenário de curto prazo ainda envolve desafios, mas os ajustes fiscais e a política monetária sinalizam um caminho de maior estabilidade.
Por Paulo Gala, graduado em Economia pela FEA-USP. Mestre e Doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo, CGA-Anbima. Foi pesquisador visitante nas Universidades de Cambridge UK e Columbia NY. Foi economista, gestor de fundos e CEO em instituições do mercado financeiro em São Paulo. É professor de economia na FGV-SP desde 2002, Conselheiro da FIESP. Brasil, uma economia que não aprende é seu último livro.