A lua de mel acabou

Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

A conclusão principal que se pode extrair da pesquisa Quaest é que a lua de mel entre a população e o governo Lula chegou ao fim. 

E isso é perfeitamente natural e previsível. Os casais vivem isso após alguns anos, e os governos, após a conclusão da primeira metade da gestão.

O povo entende as dificuldades iniciais, e dá sempre um crédito, e tempo, para o governo arrumar a casa. Depois disso, a propaganda e a boa vontade passam a fazer menos efeito. As pessoas passam a fazer julgamentos baseados na experiência do dia a dia. 

Lula e seu governo não podem reclamar. A população brasileira demonstrou paciência e otimismo desde a posse de Lula em janeiro de 2023. 

Isso acabou. Segundo a Quaest, a aprovação de Lula desabou para 47% em janeiro, ao passo que sua rejeição subiu para 49%. Pela primeira vez, Lula aparece na Quaest com mais rejeição que aprovação. 

 

É um alerta importante, mas o governo e apoiadores devem encará-lo também sem catastrofismo. 47% de aprovação é quase metade da população brasileira. Não é nenhum desastre. Para efeito de comparação: Bolsonaro manteve uma rejeição de quase 70% durante boa parte de seu governo, contra aprovação de 27%, na pesquisa Ipec (ex-Ibope), e quase ganhou eleição em 2022. 

Os eleitores de Lula, a propósito, ainda aprovam o presidente.

Segundo a Quaest, 81% dos eleitores de Lula no segundo turno o aprovam, com uma melhora sobre a pesquisa em dezembro, quando este número tinha caído para 77%. O problema maior de Lula se deu entre bolsonaristas, junto aos quais Lula vinha conseguindo penetrar, provavelmente entre as camadas de baixa renda, e entre os eleitores que votaram em branco ou não foram votar em 2022. 

 

A Quaest mostrou ainda que a tal fake news de “regular o PIX” foi a “notícia mais negativa” contra o governo e, aparentemente, ajudou a derrubar a aprovação do presidente. Caso tenha realmente produzido efeito, porém, isso pode ser passageiro, pois o recuo rápido do governo e a campanha de esclarecimento tendem a neutralizar o estrago. 

   

Entretanto, o fator mais estrutural por trás da deterioração do prestígio de Lula é mesmo a inflação dos alimentos. 

A pesquisa mostra que, em janeiro deste ano, 83% dos entrevistados identificaram alta nos preços dos alimentos. Esse percentual havia sido de 65% em outubro do ano passado. A pergunta seria mais precisa se incluísse nuances, como aumentou muito ou pouco, e que tipos de alimentos. Mas ela confirma o que os números da inflação tem mostrado, e que o próprio governo admite. 

Outro fator que deveria preocupar mais o governo é o tema da segurança pública. A Quaest identificou que houve um aumento dramático do percentual de brasileiros que consideram a violência como o principal problema nacional, seguido pelos que consideram a questão social (o que provavelmente tem a ver com o problema da carestia, ou deterioração do poder de compra, em consequência da inflação dos alimentos). 

 

Conclusão

A conjuntura política chegou a um momento em que não adianta mais o campo progressista se preocupar com pesquisas. É hora de exercer a boa crítica democrática para que o governo ponha em prática projetos estruturantes, que sinalizem mudanças concretas na vida da população. A questão da mobilidade urbana, por exemplo, deveria ser levada mais sério pelo governo e pela sociedade.

Será dificil reverter a deterioração, no médio e longo prazo, do poder de compra dos brasileiros, sem investimentos que permitam o aumento da produtividade da economia, e a maneira mais horizontal e eficaz de fazer isso é modernizar o transporte de mercadorias e pessoas.

A mesma coisa vale para a segurança pública. Apenas será possível atacar estruturalmente a violência nas cidades com investimentos em mobilidade e vigilância, que permitam ao Estado ampliar a securitização das áreas problemáticas, através do deslocamento rápido das forças de segurança.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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