Sanções e tarifas do Norte Global atrasam transição energética

A possibilidade de que o aquecimento suba de 2,5 para 3 graus será influenciada por políticas globais, argumentam os analistas da Wood Mackenzie / Getty Images

A meta climática global está em risco: desaceleração na transição energética e dependência de combustíveis fósseis desafiam o Acordo de Paris.


A meta do Acordo de Paris de manter o aquecimento bem abaixo de 2 graus Celsius em relação aos níveis pré-industriais não está apenas cada vez mais distante; a transição energética global também está perdendo ritmo.

Esse foi o alerta emitido pelo Energy Transition Outlook da Wood Mackenzie, relatório anual da consultoria sobre o progresso global rumo à descarbonização da economia.

“O progresso em direção a um sistema de energia de baixo carbono está tropeçando em várias frentes, deixando o mundo dependente de combustíveis fósseis por mais tempo”, destacam os autores.

Junto com o Global Energy Outlook da Agência Internacional de Energia (AIE), que revelou que uma demanda global de eletricidade mais alta do que o previsto ameaça as metas de Paris, e com o Emissions Gap Report do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que alertou que limitar o aquecimento a 1,5 grau Celsius “se tornaria impossível” sem uma redução urgente das emissões, o relatório completa uma visão preocupante.

A pergunta agora é menos “O mundo pode atingir as metas do Acordo de Paris?” e mais “Como vamos lidar com isso após falharmos?”

A Wood Mackenzie projeta um cenário de 2,5 graus de aquecimento como seu “caso base”, em linha com outras estimativas, incluindo as da AIE.

Os autores expressam pouco otimismo quanto à meta de emissões líquidas zero até 2050 e ao limite de 1,5 grau de aquecimento. Em vez disso, o relatório “destaca o potencial de uma transição atrasada”, na qual o aquecimento pode chegar a 3 graus, afirmou Jonathan Sultoon, chefe de mercados e transições da Wood Mackenzie, em conferência nesta segunda-feira.

“Estamos no meio da década de 2020, a década crucial para acelerar a transição energética”, disse Sultoon, “e nenhum país importante — e poucas empresas — estão no caminho certo para atingir suas metas climáticas para 2030”.

Para atingir o cenário de 2,5 graus — o qual cientistas alertam que pode resultar em impactos climáticos imprevisíveis e potencialmente irreversíveis — seria necessário que as emissões globais atingissem o pico até 2027.

No entanto, as emissões estão aumentando, em cerca de 1,3% em 2023, segundo as Nações Unidas.

A possibilidade de que o aquecimento suba de 2,5 para 3 graus será influenciada por políticas globais, argumentam os analistas da Wood Mackenzie. Fatores como a guerra na Ucrânia e a instabilidade no Oriente Médio podem fazer os países reinvestirem em combustíveis fósseis por segurança energética, enquanto políticas protecionistas podem restringir as importações de tecnologia renovável de baixo custo da China.

“A China é o produtor de menor custo em tecnologia limpa”, disse Sultoon. “Ou o resto do mundo precisa depender da manufatura chinesa para acelerar a transição”, ou “o Ocidente pagará um custo maior — ou, de fato, atrasará a transição. E parece muito mais provável que seja essa última situação do que a primeira.”

Políticos de regiões altamente emissoras, especialmente os Estados Unidos, reconhecem o domínio da China em tecnologias de baixo carbono, como painéis solares e refino de lítio.

No entanto, buscam desenvolver suas próprias indústrias, tanto para garantir o abastecimento de energia em casos de conflitos quanto para proteger trabalhadores e setores nativos.

Embora a lógica política e de segurança dessas ações possa ser clara, os analistas da Wood Mackenzie demonstram ceticismo quanto a seus benefícios para a descarbonização. “Esses objetivos duplos — de descarbonização e redução da dependência do fornecimento de metais da China — estão em desacordo”, dizem eles. “Levará anos, se não décadas, para se afastar da China porque ela controla até 70% das cadeias de suprimentos globais em várias commodities.”

Outro fator crucial é o aumento da demanda por eletricidade, um ponto destacado pela AIE.

Embora qualquer cenário de redução global de emissões dependa de uma elevada eletrificação de processos hoje dependentes de combustíveis fósseis, essa nova demanda pode ter efeitos ambíguos sobre as emissões totais, dependendo da capacidade da geração de energia sem carbono de atender a essa demanda.

“A rápida expansão do fornecimento de eletricidade é frequentemente limitada pela infraestrutura de transmissão, que leva tempo para se desenvolver”, explica o relatório.

Isso significa que a nova demanda pode ser atendida por combustíveis fósseis, encarecendo a transição energética ou até mesmo limitando o nível de eletrificação crucial para a redução de emissões.

“Como devemos lidar com crises geopolíticas, restrições comerciais e políticas protecionistas se estas se tornarem normas a longo prazo? E onde encontraríamos a redução de custos para energias alternativas?” questionou David Brown, diretor da prática de transição energética da Wood Mackenzie. Em um cenário de continuidade, ele alerta, essa é uma questão que o mundo terá de enfrentar.

Por Heatmap

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