Os BRICS e o ocaso do Ocidente

O presidente chinês Xi Jinping, ao centro, e o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa, o segundo a partir da esquerda, participam da mesa redonda de diálogo de líderes China-África durante a Cúpula do BRICS em Joanesburgo, em agosto de 2023. © Reuters

Entre os dias 22 e 24 de outubro, será realizada na Federação Russa a cúpula dos países que integram os BRICS+. O encontro acontecerá na cidade de Kazan, capital da República do Tartaristão, às margens do rio Volga. Até o ano passado, os BRICS+ eram compostos por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. No dia 1º de janeiro de 2024, quatro novos países se uniram ao grupo: Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita. A Argentina, que havia sido indicada para ingressar, rejeitou a filiação em nome de um alinhamento geopolítico com o G7 e a OTAN.

Os dez membros dos BRICS+ representam atualmente 46% da população mundial, 37,6% do Produto Interno Bruto (PIB) global e mais de dois terços da produção mundial de hidrocarbonetos. Há três décadas, o G7 (composto pela Europa Ocidental, Japão, Estados Unidos e Canadá) representava 50% do PIB mundial, enquanto os BRICS alcançavam apenas 16%. Durante a cúpula de Kazan, os BRICS deverão atingir 32% do PIB global, enquanto o G7 ficará em torno de 29%, uma diferença que tende a aumentar nas próximas décadas.

Até agosto deste ano, 32 países manifestaram interesse em se unir aos BRICS+. Entre os pedidos de adesão estão os casos paradigmáticos de Cuba e Turquia. No caso de Cuba, o país sofre há seis décadas com um bloqueio imposto pelos Estados Unidos. Seu ingresso nos BRICS+ criaria oportunidades para romper esse bloqueio por meio da cooperação oferecida pelo Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), que oferece financiamento sem interferências geopolíticas. Já o pedido de adesão da Turquia, se aceito, representaria um golpe significativo para a OTAN, enfraquecendo sua coesão.

Enquanto Washington e Bruxelas continuam a promover bloqueios, sanções unilaterais, interferências políticas, econômicas e financeiras, guerras híbridas e confusão cognitiva, os BRICS+ propõem uma nova ordem global baseada no respeito às soberanias nacionais e na regulamentação das grandes corporações. Ao contrário do Ocidente, que insiste em criar caos e manipulação, os BRICS+ defendem um modelo alternativo de governança global, desconectando o Sul Global das extorsões atlanticistas e buscando superar a paralisia das Nações Unidas diante da militarização da OTAN, da guerra tecnológica contra a China e da crise no Oriente Médio.

Um dos temas centrais da cúpula de Kazan será a continuação da política de desdolarização. Quatro décadas atrás, o dólar era utilizado em 80% das transações do comércio internacional. Hoje, esse número caiu para 45%. Para acelerar esse processo de desconexão monetária, será discutida a criação do BRICS Bridge, uma plataforma de pagamentos supranacional que competiria com o sistema Swift ocidental, utilizado por 11 mil instituições financeiras. O BRICS Bridge permitirá pagamentos em moedas nacionais dos países membros, com o Novo Banco de Desenvolvimento atuando como um sistema de compensação. Isso facilitaria o comércio entre os membros e simplificaria as transações de governos, empresas e indivíduos.

Outro tópico que será debatido é a criação de uma moeda digital única para os BRICS, chamada R5, uma referência à primeira letra das moedas dos países membros: real, rublo, rupia, renminbi e rand. A proposta da Rússia inclui o uso dessa moeda tanto para transações internacionais quanto para reservas de valor.

Uma pesquisa realizada por Zongyuan Liu e Mihaela Papa, acadêmicos norte-americanos, questionou em 2022 se os BRICS seriam capazes de aprofundar a desdolarização. A resposta foi clara: o Sul Global contribuirá para o declínio do modelo estabelecido em Bretton Woods. A decisão do governo de Javier Milei de recusar o ingresso da Argentina nos BRICS no início de 2024, sob pressão de Washington, provocou debates sobre as responsabilidades e compromissos dos membros. O chanceler brasileiro Mauro Luiz Vieira confirmou que um dos temas a serem abordados em Tartaristão será o estabelecimento de regras para futuras adesões.

O clube que desafia o Ocidente continuará a crescer, enquanto o Ocidente tentará conter esse avanço com guerras cognitivas, híbridas e de procuração, sinalizando seu ocaso.

Por Jorge Elbaum, para o Página 12

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