Pitacos sobre a eleição em Fortaleza

A disputa eleitoral em Fortaleza está se afunilando entre os dois candidatos da “polarização”: André Fernandes e Evandro Leitão.

Nos últimos dias foram divulgadas muitas pesquisas em Fortaleza. Uma das mais recentes foi a Quaest, contratada por R$ 85 mil pelo grupo de mídia Verdes Mares, proprietário do jornal Diário do Nordeste e da TV Verdes Mares, afiliada da Globo no Ceará.

Segundo esta pesquisa, André Fernandes e Evandro Leitão dispararam, para 25% e 23%, respectivamente, enquanto Wagner e Sarto desabaram ou estagnaram, empatando em terceiro lugar, com 18%.

Um ponto importante nos dados estratificados da Quaest é a oscilação negativa de André Fernandes entre eleitores masculinos, de 28% para 26%. Evandro Leitão, no mesmo segmento, viu seu percentual de intenções de voto disparar de 20% para 25%.

A análise dessas variações nos estratos tem de ser lida, de qualquer forma, com uma certa leveza de espírito, quase como uma curiosidade, pois  a margem de erro desses estratos é muito elevada. A do eleitorado masculino, por exemplo, é de 5 pontos…

Seria injusto, porém, tratar os dois que lideram a pesquisa apenas como candidatos fantoches de seus respectivos padrinhos.

André Fernandes, apesar da juventude, tem uma carreira política própria de muito sucesso, entre o eleitorado conservador do estado e da capital. Em 2022, com apenas 24 anos, ele foi o deputado federal mais votado do Ceará, com 229 mil votos. Apenas em Fortaleza, André obteve 106 mil votos.

Evandro Leitão, por sua vez, eleito deputado estadual em 2022 com 114 mil votos, é o presidente da Assembléia Legislativa do Estado. Está no terceiro mandato consecutivo como deputado estadual.

Além disso, Evandro foi presidente do Ceará Sporting Club,  um dos principais times esportivos do Nordeste, de 2008 a 2015.

Mas é um fato que tanto André Fernandes como Evandro tem padrinhos importantes.

André Fernandes é um dos principais queridinhos de Jair Bolsonaro. O ex-presidente veio pessoalmente em Fortaleza dar seu apoio à candidatura de André para a capital e o PL está despejando milhões de reais em sua campanha. Segundo o TSE, o candidato já recebeu R$ 11,8 milhões para sua campanha à prefeitura de Fortaleza, praticamente tudo do partido. As únicas doações individuais mais significativas vieram dos empresários Beto Studart e Paulo Henrique Sampaio Nobre, que contribuiram com R$ 50 mil cada um.

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Por curiosidade, olhei também a planilha de receitas e despesas do candidato José Sarto, atual prefeito que tenta a reeleição.

É a campanha mais cara de todas, com orçamento de R$ 17 milhões, dos quais 15 milhões vieram do PDT nacional. Sarto recebeu ainda R$ 1 milhão de Prisco Bezerra, o que é curioso, pois Bezerra é primeiro suplente do senador Cid Gomes, que apoia Evandro. Tasso Jereissati, ex-senador e ex-presidente nacional do PSDB, colocou R$ 600 mil na campanha de Sarto. O Beto Studart também aparece na lista de doares, aportando R$ 125 mil. Amarílio Proença Macedo, um dos empresários mais ricos do Ceará, doou R$ 50 mil para Sarto. Outro doador da campanha sartista foi o “empresário e poeta” Pio Rodrigues Neto, proprietário da C.Rolim Engenharia, que aportou R$ 50 mil.

O padrinho político de Sarto é o ex-governador Ciro Gomes, mas que, curiosamente, quase não aparece na campanha do prefeito.

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Em se tratando de padrinho, porém, Evandro Leitão leva a melhor sobre André, até porque ele tem dois: o presidente Lula e Camilo Santana.

Para se ter uma ideia do tamanho político de Camilo, é importante saber que ele obteve, apenas em Fortaleza, 768.233 votos para sua eleição ao Senado, o que foi quase seis vezes mais votos do que Ciro Gomes, então candidato a presidente da república, teve na mesma cidade, no mesmo ano.

Segundo o TSE, Fortaleza tem hoje 1.769.681 eleitores aptos a votar.

Quanto ao tempo de TV de cada um, quem saiu na frente, de longe, foi Evandro Leitão, que tem 5 minutos por dia, contra 1,58 minuto de André Fernandes e 1 minuto cada para Sarto e Wagner.

Outro dado importante para se entender a força dos padrinhos de cada candidato é a quantidade de votos votos que cada um recebeu nas últimas eleições.

No primeiro turno das eleições presidenciais de 2022, os principais candidatos tiveram o seguinte resultado:

Lula (PT): 802.009 votos (53,20%)
Jair Bolsonaro (PL): 530.162 votos (35,17%)
Ciro Gomes (PDT): 130.584 votos (8,66%)
Simone Tebet (MDB): 30.491 votos (2,02%)

No segundo turno, Lula (PT) voltou a ser o candidato mais votado em Fortaleza (CE), com 880.559 votos, o equivalente a 58,18% do total da cidade. Bolsonaro (PL) foi a escolha de 41,82% dos eleitores e recebeu 633.009 votos.

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Em se tratando de receita de campanha, Evandro já arrecadou R$ 10.374.193, sendo que 4,6 milhões vieram do PSD, 4,3 milhões do PT e 1 milhão do Republicanos. Evandro também recebeu doação do empresário Beto Studart, de R$ 140 mil.

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Com exceção de Sarto, todos os candidatos preconizam o fim da “taxa do lixo”, uma tarifa criada pela prefeitura de Fortaleza que se tornou altamente impopular.

Mas os candidatos não usam o argumento mais poderoso contra a essa taxa, que é o fato de ser uma medida tributária totalmente na contramão da modernidade, na contramão inclusive da reforma tributária que se discute no congresso nacional.

A tendência moderna é a simplificação tributária, sobretudo a partir da unificação dos impostos. Criar tarifas extras, pagas à parte, apenas complica a vida de indivíduos e empresas. Além disso, tarifas desse tipo nem ajudam muito as finanças, em função do seu alto índice de inadimplência.

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Agora vamos analisar alguns dados estratificados da Quaest. Dois gráficos que me parecem importantes é sobre a percepção dos eleitores sobre o apoio dessas duas lideranças políticas: Camilo e Lula. Os eleitores já sabem que candidato é apoiado por eles?

Segundo a Quaest, 47% dos eleitores sabem que Camilo Santana apoia Evandro Leitão, mas 39% não sabem e 8% acham que ele apoia o prefeito José Sarto.

Quanto a Lula, 66% sabem que o presidente apoia Evandro, mas 21% disseram ignorar isso, e 9% acha que Lula apoia Sarto.

Está evidente que Evandro tem um bom espaço para crescer entre os eleitores de Lula e Camilo, e essa é uma informação fácil para sua campanha entregar, ainda mais considerando o bom tempo de TV e rádio de que o candidato dispõe.

Examinemos outros estratos da pesquisa. Na divisão por faixa etária, nota-se que a força principal de André Fernandes está entre os jovens de 16 a 34 anos, junto aos quais ele lidera com 32%, muito acima de seus adversários.

Mas Evandro leva a melhor entre eleitores com idade acima de 35 anos: tem 27% na faixa etária de 35 a 59 anos, e 28% entre eleitores com mais de 60.

Quando se olha para as intenções de voto por renda familiar, sempre segundo a Quaest, Evandro Leitão já lidera entre eleitores com renda até 3 salários mínimos, junto aos quais ele tem 24%, contra 21% de André, 18% de Wagner e 19% de Sarto.

Lembre-se, porém, que a margem de erro desse estrato é de 4 pontos percentuais, de maneira que, em verdade, estão todos embolados, ou empatados tecnicamente.

A força dentro do eleitorado evangélico é o principal trunfo de André Fernandes, pois ele lidera de maneira isolada neste segmento, com 39%, contra 14% de Evandro, 16% de Wagner e 15% de Sarto. Mas esse pode ser também um ponto fraco dele, pois entre católicos Fernandes aparece em quarto lugar. Evandro Leitão é quem lidera, isoladamente, com 27%, entre eleitores católicos.

Um trunfo importante de Evandro Leitão é sua liderança folgada entre eleitores auto identificados como pretos. Entre estes, o petista chegou a 30% das intenções de voto, 9 pontos acima do segundo lugar, ocupado por Sarto e quase o dobro do percentual de André Fernandes.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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