Gastos com cuidados de saúde devido a inatividade física chegam a quase US$ 4 bilhões/ano no Brasil. O quadro exige políticas públicas para incentivar a prática de atividades físicas
A saúde da população está profundamente ligada a diversos fatores, como alimentação, moradia, saneamento básico, educação, e, claro, a prática de atividades físicas. A Lei 8.080 de 1990, que organiza o Sistema Único de Saúde (SUS), destaca essa interdependência, reforçando que a saúde vai além de consultas médicas e hospitais, mas também depende das condições de vida da população.
Praticar atividade física regularmente traz inúmeros benefícios para a saúde física e mental, enquanto o sedentarismo está associado a diversos problemas de saúde, incluindo uma redução de até dois anos na expectativa de vida. Além disso, os gastos diretos com cuidados de saúde devido à inatividade física chegam a quase 4 bilhões de dólares anuais no Brasil, evidenciando a necessidade de políticas públicas eficazes para incentivar a prática de atividades físicas.
O Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas (Vigitel), em 2023, estabeleceu que, para uma pessoa ser considerada suficientemente ativa, ela precisa acumular, pelo menos, 150 minutos semanais de atividades físicas moderadas ou 75 minutos de atividades físicas vigorosas. Em 2014, uma pesquisa revelou que cerca de um terço da população brasileira não atinge as diretrizes de saúde pública para atividade física.
A maior parte das atividades físicas estava relacionada ao trabalho, um dado preocupante devido à tendência mundial de redução dessa atividade nos ambientes laborais. Além disso, a prática de atividades físicas no lazer mostra significativas desigualdades em termos de raça, classe e gênero. Pessoas com maior nível de escolaridade tendem a ser mais ativas: em 2020, aqueles com 12 anos ou mais de estudo mostraram índices mais elevados de atividade física.
Apesar dos desafios, dados mostram um aumento significativo na prática de atividades físicas no tempo livre no Brasil. Entre 2009 e 2020, a frequência de adultos praticando ao menos 150 minutos de atividade física moderada por semana subiu de 30,3% para 36,8%, com um destaque para o aumento entre as mulheres. As faixas etárias de 25 a 44 anos apresentaram os maiores crescimentos, saltando de 34,2% para 41,5%.
A falta de tempo e de dinheiro são os principais motivos citados pelas pessoas para não se exercitarem, seguidos pela ausência de locais próximos para a prática de exercícios, falta de companhia e condições climáticas extremas. Essas barreiras estão diretamente relacionadas a questões socioeconômicas que geram desigualdades importantes no acesso à atividade física, destacando a necessidade urgente de políticas públicas que promovam a prática de atividades físicas de forma inclusiva e equânime.
Embora as evidências sobre a efetividade das intervenções para aumentar a atividade física ainda sejam limitadas, algumas recomendações podem ser úteis:
• Para crianças, é importante melhorar o ambiente físico e social, com a participação ativa das famílias.
• Para adultos, recomenda-se a melhoria do ambiente de trabalho, como o uso de mesas ajustáveis, por exemplo.
• Para pessoas idosas, recomenda-se atividades acessíveis, motivacionais, seguras, que proporcionem independência e conexão social.
• Nas universidades, pausas ativas durante as aulas e métodos de aprendizado que envolvam movimento podem aumentar a atividade física, reduzir o sedentarismo, melhorar o bem-estar e diminuir a fadiga dos estudantes.
• Nos locais de trabalho, oferecer estações de trabalho que permitam trabalhar sentado e de pé, junto com lembretes para fazer pausas e variar a postura, pode ser eficaz. Utilizar esteiras para trabalhar andando também é uma opção.
• Intervenções digitais, como o uso de pedômetros e comunicação via celular (mensagens de texto ou chamadas), são úteis para reduzir o comportamento sedentário em pessoas com transtornos mentais graves. Monitores de atividade física e aplicativos de smartphone são eficazes para aumentar a atividade física, especialmente em pessoas com doenças cardiovasculares.
Recomendações da Organização Mundial da Saúde para Fortalecer Políticas de Atividade Física
Fortalecer a liderança política do governo
• Estabelecer e reforçar a liderança em atividade física dentro e entre todos os departamentos governamentais relevantes e em todos os níveis.
• Aumentar a conscientização sobre as contribuições transversais da política de atividade física para o desenvolvimento nacional, em conformidade com o estabelecido nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.
Integrar a atividade física às políticas relevantes
• Revisar e fortalecer políticas nacionais, regulamentos e padrões para incluir atividade física.
• Desenvolver e disseminar ferramentas práticas e treinamentos adaptados ao contexto local.
Fortalecer parcerias e envolver comunidades
• Criar mecanismos de coordenação nacional para fortalecer a colaboração entre governo e partes interessadas.
• Envolver agentes não governamentais e comunidades para garantir a relevância e sustentabilidade das políticas, com foco em grupos menos ativos, incluindo pessoas com deficiência, idosos e jovens.
Reforçar os sistemas de dados, o monitoramento e a tradução do conhecimento
• Fortalecer sistemas de monitoramento e informação para acompanhar o progresso das políticas.
• Investir em pesquisa e tradução de conhecimento através de parcerias.
Garantir financiamento sustentável e alinhar-se aos compromissos da política nacional
• Garantir financiamento sustentável, revisando alocações orçamentárias e explorando mecanismos de financiamento inovadores, especialmente em planos de recuperação da covid-19
Publicado originalmente pela Agência Gov em 31/08/2024 – 09h30
Por Victória Paulo Menin
Este artigo é informado por uma das diversas respostas rápidas realizadas de forma voluntária pelos Institutos Veredas e Cíclica para órgãos do governo federal que, no ano de 2023, estavam em busca de evidências para apontar os melhores caminhos para enfrentar alguns desafios. A pesquisa que inspirou este artigo e outras você encontra aqui.
Victória Paulo Menin é psicóloga, especialista em Saúde da Família e Comunidade, mestranda em Psicologia Social e Institucional e pesquisadora do Instituto Veredas.