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Imprensa atlantista começa a admitir que invasão de Kursk pela Ucrânia pode ter sido (mais) um erro fatal de Zelensky

Há meses que a imprensa atlantista (ou seja, a imprensa a serviço das narrativas da Otan) não oferece boas notícias sobre a guerra na Ucrânia. O presidente Volodymyr Zelensky apenas dá as caras para pedir dinheiro, ou, mais recentemente, lembrar que também não tem intenção de honrar suas dívidas. Há muito tempo o mundo “rico” […]

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Divulgação

Há meses que a imprensa atlantista (ou seja, a imprensa a serviço das narrativas da Otan) não oferece boas notícias sobre a guerra na Ucrânia. O presidente Volodymyr Zelensky apenas dá as caras para pedir dinheiro, ou, mais recentemente, lembrar que também não tem intenção de honrar suas dívidas.

Há muito tempo o mundo “rico” não testemunhava um sorvedouro tão formidável de recursos. Quase toda semana, ficamos sabendo que algum membro da Otan decidiu enterrar mais alguns bilhões, ou dezenas de bilhões, de dólares, numa guerra que, todos sabem, a Ucrânia já perdeu.

Daí foi com uma certa curiosidade cética, para não dizer cínica, ou quiçá mórbida, que acompanhamos as notícias de que a Ucrânia decidiu invadir território russo e ocupar áreas no entorno da região de Kursk.

A imprensa atlantista, apoiadora incondicional do regime de Zelensky e profundamente hostil à Rússia, tratou a novidade com um mal disfarçado alívio. “Finalmente uma boa notícia”, era o que se podia ler nas entrelinhas, embora a ação de Zelensky fosse tão notoriamente desprovida de senso estratégico que se podia ver, lá e aqui, abordagens cautelosas.

Os russos reagiram furiosamente, como seria de se esperar, com acusações de que teria sido uma operação coordenada, de forma mais direta do que até então já tinham visto, por oficiais militares não-ucranianos. E divulgaram relatos, feito por moradores de Kursk, de mercenários falando inglês americano, além de outros idiomas ocidentais, entre os batalhões ucranianos que tinham invadido a região.

A incursão ucraniana em Kursk teve início no dia 6 de agosto. Portanto lá se vão 10 dias, passados os quais notamos que o tom de euforia da mídia atlantista começa a mudar, e de maneira dramática. Os analistas consultados agora admitem que a iniciativa ucraniana pode ter sido erro trágico de Zelensky, ou de quem tenha sido o idealizador da invasão.

Não vou me estender sobre o diz a mídia russa, como a RT, ou mesmo a turca, como a Agência Anadolu , que traz números devastadores para a Ucrânia.

Trago apenas uma informação:

“Em geral, durante os combates na direção de Kursk, o inimigo perdeu até 2.640 militares, 37 tanques, 32 veículos blindados de transporte de pessoal, 23 veículos de combate de infantaria, 206 veículos blindados de combate, 96 veículos, quatro sistemas de mísseis antiaéreos, três lançadores múltiplos de foguetes, 20 canhões de artilharia de campo e três estações de guerra eletrônica”, informou o ministério da Defesa russo, segundo a agência turca.

Mas vamos para a mídia atlantista, ou mídia pró-Otan, ou mídia ocidental, como queiram. O que ela está dizendo hoje sobre a invasão ucraniana em Kursk?

Bem, definitivamente, o tom triunfante arrefeceu. Os títulos e as chamadas iniciais das matérias em jornais como Washington Post, Politico e CNN ainda tentam manter um falso otimismo nos títulos e nas chamadas iniciais, possivelmente na esperança de que a maioria dos leitores vai ficar por aí. Mas se você examina as reportagens até o fim, chegará a conclusão de que a realidade é bem diferente.

Vamos lá para nossa análise.

Comecemos com a CNN, que publicou ontem à noite (dia 15/ago às 19h) uma notícia cujo título e chamada, curiosamente, vão mudando de sentido conforme o texto avança, até adquirirem um sentido exatamente oposto àquele sugerido no início.

CNN: A Rússia parece ter desviado vários milhares de tropas da Ucrânia ocupada para conter a ofensiva de Kursk, dizem autoridades dos EUA

A Rússia parece ter desviado milhares de tropas de territórios ocupados dentro da Ucrânia para conter uma ofensiva ucraniana surpreendentemente bem-sucedida dentro das fronteiras russas, em uma medida que potencialmente enfraquece o esforço de guerra de Moscou, disseram duas autoridades americanas de alto escalão à CNN.

O acontecimento atraiu a atenção dos EUA e autoridades norte-americanas agora estão trabalhando para determinar precisamente quantas tropas a Rússia está movendo, mas fontes disseram que vários elementos do tamanho de brigadas, compostos por pelo menos 1.000 soldados cada, parecem ter se deslocado para a região de Kursk, onde a Ucrânia lançou uma operação na semana passada.

Uau!

Com um título e chamada dessas, você espera que se trata de uma reportagem que mostra, categoricamente, o triunfo iminente da Ucrânia nessa nova frente de batalha, não? Mais um pouco e os exércitos de Zelensky adentrarão Moscou, fazendo o serviço que Napoleão e Hitler, à frente das maiores forças militares de suas épocas, fracassaram dramaticamente.

Só que não.

Lá para a metade final da reportagem, porém, o que se sugeria no início é virado de cabeça para baixo.

(…) Ainda assim, acredita-se que a Rússia tenha centenas de milhares de soldados na linha de frente da Ucrânia, então desviar alguns milhares pode não ter um grande impacto no curto prazo, disseram autoridades.

A Rússia também não parece estar movendo suas unidades maiores e mais bem treinadas para longe da Ucrânia e para Kursk ainda, disseram duas outras fontes familiarizadas com a inteligência ocidental. Uma dessas fontes disse que a Rússia parece estar reforçando as defesas de Kursk principalmente com recrutas não treinados tirados de outros lugares da Rússia.

“Ainda não vimos uma movimentação substancial [de tropas russas] e não podemos dizer se isso ocorre apenas porque eles estão apenas começando a movimentar forças ou se eles simplesmente não têm forças para se movimentar”, disse uma das fontes familiarizadas com a inteligência dos EUA.

Além das tropas transferidas de dentro da Ucrânia, a Rússia também enviou pessoal do distrito militar de Leningrado e Kaliningrado, na Rússia, para ajudar a defender Kursk, disse uma das principais autoridades dos EUA.

Mesmo reconhecendo o sucesso limitado da operação Kursk até agora, diversas autoridades americanas e ocidentais familiarizadas com as últimas informações de inteligência alertaram que é extremamente improvável que a Ucrânia consiga manter o território por muito tempo e enfatizaram que é muito cedo para julgar como a operação afetará o resultado mais amplo da guerra.

Ou seja, não apenas os “milhares de soldados russos”, que estariam sendo desviados da frente ucraniana para defender Kursk, correspondem a um número insignificante para os centenas de milhares de russos que operam dentro da Ucrânia, como também não são sequer as tropas “mais bem treinadas” que estão sendo usadas. A esta altura, o título e a chamada da matéria já morreram de inanição. Tem mais, porém.

A reportagem se encerra com uma análise extremamente pessimista, para a Ucrânia, feita por “algumas autoridades” consultadas:

(…) Algumas autoridades também levantaram preocupações de que a Ucrânia, que, segundo uma autoridade ocidental, enviou algumas de suas forças mais experientes para Kursk, pode ter criado fraquezas em suas próprias linhas de frente, que a Rússia pode explorar para ganhar mais território dentro da Ucrânia.

“É impressionante do ponto de vista militar”, disse o oficial sobre a operação Kursk. Mas a Ucrânia está “comprometendo tropas bem experientes nisso e eles não podem se dar ao luxo de perder essas tropas”.

“E desviá-los da linha de frente cria oportunidades para a Rússia aproveitar a vantagem e avançar”, acrescentou essa pessoa.

A última frase da matéria significa que, em verdade, a incursão ucraniana em Dursk pode beneficiar a Rússia!

A reportagem do Washington Post, também publicada ontem (15 de ago) à noite, segue o mesmo estilo. Os títulos e os primeiros parágrafos são triunfantes, para a Ucrânia, mas o tom vai mudando ao longo do texto. No meio pro final, a reportagem traz relatos e fotos de soldados ucranianos destroçados, em macas de hospital, em função da fracassada tentativa de ir além de Kursk.

(…) Os ucranianos avançaram cerca de seis milhas, disseram os soldados, tomando posições abandonadas de tropas russas. Mas a luta continuou intensa. “Todo o nosso grupo estava ferido no dia em que chegamos”, disse Hacker. Muitas tropas ucranianas ficaram com concussão ou gravemente feridas, enquanto outras foram mortas e tiveram que ser deixadas para trás, disse ele.

O bombardeio continuou tão intenso que os sobreviventes tiveram que se abrigar em trincheiras russas por dias, até que um veículo blindado chegou para evacuá-los para tratamento médico na quinta-feira de manhã. Alguns ficaram feridos mais de uma vez enquanto esperavam por ajuda.

O hacker disse que temia ser morto na Rússia “porque não conhecíamos o território deles”.

“Estávamos trabalhando às cegas”, acrescentou.

Por fim, temos a matéria publicada no blog Politico ontem pela manhã (15 de ago), que é um pouco mais honesta. Mas só um pouco. 

O título é apenas metade sincero:

Enquanto Kiev ganha terreno em Kursk, a Rússia contra-ataca em Donetsk

Metade sincero porque se inicia com uma mentira. Kiev não vem ganhando terreno em Kursk. Ao contrário, os esforços para ir mais longe fracassaram, e as forças ucranianias já começaram a sofrer pesadas baixas na região. A operação toda é totalmente suicida, pois se a Ucrânia não consegue conter a Rússia em seu próprio território, onde tem abastecimento garantido, o que se pode esperar de seu desempenho dentro da Rússia, onde podem ser cercadas, asfixiadas e destruídas a qualquer momento?

Mas a segunda metade do título, que fala no contra-ataque russo em Donestsk é verdadeira, e você tem que chegar até a metade final da reportagem para encontrar a informação:

(…) Mas enquanto os sucessos da operação surpresa de Kursk aumentaram o moral de Kiev, as forças russas estão contra-atacando, capturando mais território ao redor da região de Donetsk, na Ucrânia.

Desde que a Ucrânia lançou a ofensiva de Kursk, “eu diria que as coisas pioraram em nosso lado do front”, disse Ivan Sekach, porta-voz da 110ª Brigada Mecanizada da Ucrânia, que está atualmente posicionada no distrito de Pokrovsk, na região de Donetsk. “Temos recebido ainda menos munição do que antes e os russos estão pressionando”, disse ele ao POLITICO.

Nas últimas 24 horas, a Rússia ocupou as aldeias de Zhelanne e Orlivka e fez avanços em Nova York, Krasnohorivka, Mykolaivka e Zhuravka em Donetsk, de acordo com uma atualização publicada pelo DeepState, um projeto de mapeamento de guerra próximo ao Ministério da Defesa da Ucrânia.

O Estado-Maior das Forças Armadas Ucranianas não confirmou nem negou o relato, dizendo apenas que intensos combates estavam ocorrendo nessas áreas e que Kiev estava concentrando seus esforços na cidade de Pokrovsk, na região de Donetsk.

Repare na declaração absolutamente desesperada do porta-voz do exército ucraniano, Ivan Sekach, de que as coisas “pioraram no nosso lado do front”, sendo que esse é o lado mais vital para a Ucrânia, que é o front dentro de seu próprio território.

Quando a própria imprensa atlantista não consegue mais esconder o fracasso retumbante dessa ridícula guerra da Otan contra a Rússia (sim, porque não foi a Rússia que a iniciou, e sim a Otan, com seu expansionismo irresponsável. Leia aqui a análise de Mearsheimer sobre as origens do conflito), então é porque a coisa está realmente feia para o lado do Zelensky!

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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Roberto

06/09/2024 - 08h55

Foi uma tentativa desesperada dos otanistas de mostrar uma imagem diferente. Não durou muito. Milhares de soldados ucranianos morreram, equipamentos foram destruídos, e a Rússia continua avançando.

Jicxjo

19/08/2024 - 16h14

A narrativa da mídia ocidental visa apenas enganar o contribuinte de seus países, para que não se rebele com o desperdício de bilhões de dólares em um atoleiro (e a transferência de riqueza para o complexo industrial-militar).

Ewerton Siqueira

18/08/2024 - 08h26

Esta invasão da Ucrânia em território Russo, creio, que nada mais é do que aquilo que aconteceu no Vietnã com os americanos. Cujos, entraram dentro do Vietnã através de uma rodovia e quando estavam lá com seus armamentos os vietcongues, atacaram sua retaguarda, impossibilitando-os de regressarem. O Governo americano viu que aquele tanto de equipamentos militares seria apanhados e aproveitados pelos vietcongues, então mandou bombardea-los. Tiveram de voltar com muita dificuldade e com as calças nãos mãos. Milhares foram feitos prisioneiros e outros morreram e nunca mais voltaram. Será que não é uma armadilha da Rússia?

Caco Bisol

16/08/2024 - 15h52

Um erro da OTAN, já que foi planejado, entre outros, pela Inglaterra e, parece que EUA tb… Com direito a mercenários de diversos países. O fundamental é que as armas usadas eram da OTAN. Zelensky não tem competência pra esse ato.

Eduardo

16/08/2024 - 15h02

Seria vdd a história da tentativa de tomar uma usina nuclear nesse terreno russo?

João Ferreira Bastos

16/08/2024 - 12h30

Depois do fracasso inicial em dominar a Ucrânia em uma guerra direta e rápida, a Rússia mudou sua estratégia e tem levado adiante uma politica de saturação da Ucrânia.
Ao ponto da Ucraína, atualmente perder mais de 2.500 homens/dia, algo que nunca aconteceu em combates deste porte.

Existem analistas sérios que afirmam que a Rússia ainda pode perder essa guerra, por conta de sua baixíssima audácia e até mesmo uma certa soberba.

Depois deste suicídio em Kursk, vamos ver o comportamento da Rússia, se mantem a guerra de saturação ou parte para o abate completo


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