Chapa “Minas Muda CFM”, encabeçada por Unaí Tupinambás e Karine Zanini, será lançada na quarta (19)
A chapa “Minas Muda CFM”, que concorre às eleições para representar Minas Gerais no Conselho Federal de Medicina (CFM), será lançada oficialmente na quarta-feira (19), no Sindicato dos Jornalistas, em Belo Horizonte. O movimento tem como candidatos a titular e suplente os médicos Unaí Tupinambás e Karine Zanini, respectivamente, e busca recolocar no comando da entidade a defesa da saúde pública e da ciência.
No último período, o CFM foi duramente criticado por emitir posicionamentos não científicos e influenciados pelos interesses da extrema direita.
Um dos fatos de maior repercussão foi a postura do conselho durante a pandemia de covid-19, conferindo aos profissionais autonomia no uso do chamado “kit covid”, composto por medicamentos sem comprovação de eficácia para o combate ao coronavírus.
Mais recentemente, enquanto o governo federal busca recompor os índices de vacinação infantil, o conselho fez uma pesquisa pública com a categoria médica sobre a obrigatoriedade da imunização de crianças.
Na segunda-feira (17), em debate no Senado Federal sobre o projeto de lei (PL) 1904/2024, que tem causado revolta e manifestações dos movimentos de mulheres e de proteção às crianças, membros do CFM defenderam a equiparação do aborto ao crime de homicídio, mesmo nos casos em que a interrupção da gravidez está prevista em lei, como em situações nas quais a gestação é fruto de abuso sexual.
Segundo os candidatos pela chapa “Minas Muda CFM”, foi em resposta a essas posturas que o movimento de oposição começou a se articular no estado e em todo o Brasil.
“O conselho manchou a sua própria história. O CFM tem jogado contra a ciência. Queremos montar uma diretoria que se alinhe com os interesses da população brasileira”, avaliou Unaí Tupinambás.
“Defendemos uma mudança no CFM, com conselheiros independentes e comprometidos com a saúde da população brasileira, que defendam efetivamente a prática assegurada pela pesquisa científica, priorizando o pilar relação médico-paciente, a atuação ética e digna”, enfatiza Karine Zanini.
Unaí Tupinambás é infectologista e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O médico ganhou destaque ao compor o Comitê de Enfrentamento à Covid-19 da Prefeitura de Belo Horizonte. Já Karine Zanini, é coloproctologista e docente da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
As eleições para o CFM serão realizadas nos dias 6 e 7 de julho. O Brasil de Fato MG conversou com os candidatos.
Leia a entrevista completa:
Brasil de Fato MG: O que motivou a construção da chapa “Minas Muda CFM”?
Unaí Tupinambás: Existe um movimento nacional que se chama Associação Brasileira de Médicos e Médicas pela Democracia (ABMMD) que, desde a época do impeachment de Dilma Rousseff, vem se mobilizando.
Logo depois, veio a pandemia e a postura completamente acrítica do CFM aos posicionamentos de Jair Bolsonaro (PL), com um partidarismo barato ao governo federal, que negava a ciência e as medidas protetivas contra o vírus.
Isso tudo fez com que uma grande parcela da categoria se mobilizasse para fazer frente às posturas do conselho, que não representava mais os anseios e o histórico da categoria.
Karine Zanini: O CFM é o órgão supervisor da ética profissional em todo o Brasil e, ao mesmo tempo, julgador e disciplinador da categoria médica, cabendo-lhe zelar e trabalhar, por todos os meios ao seu alcance, pelo perfeito desempenho ético da medicina e pelo prestígio e bom conceito da profissão e dos que a exercem legalmente.
Entretanto, as últimas gestões do CFM se caracterizaram por posições e iniciativas em defesa de uma suposta “autonomia” médica, endossando medidas distanciadas das evidências científicas, baseadas em crenças propagadas no meio digital, e alienadas da segurança dos pacientes, dos princípios éticos e das próprias bases da Medicina.
Por tudo isso, vem crescendo entre os médicos, um sentimento de indignação que clama por mudanças, reforçando o nosso compromisso com a ética e a ciência, em prol da saúde coletiva.
Quais são as principais pautas e bandeiras defendidas pela chapa?
Unaí Tupinambás e Karine Zanini: Nós propomos a defesa incondicional do SUS e do direito à saúde. Para isso, queremos: apoiar e promover eventos de educação médica; contribuir para o aumento das vagas de residência médica; exercer vigilância sobre publicidade e propaganda médica, cobrando o rigor científico das informações; participar ativamente de fóruns deliberativos de implementação de políticas públicas de saúde, como o Conselho Nacional de Saúde; defender condições adequadas de trabalho; denunciar o exercício ilegal da medicina e as más práticas; e contribuir para que todos os médicos tenham acesso irrestrito às informações científicas.
Qual a avaliação de vocês sobre os posicionamentos do CFM durante a pandemia da covid-19?
Unaí Tupinambás: O papel cumprido pelo CFM durante a pandemia talvez tenha sido um dos atos mais inomináveis de sua história. O conselho manchou a sua própria história, ao aderir às propostas de utilização de medicamentos sem comprovação científica, o “kit covid”, apoiando as medidas implementadas pelo governo de Jair Bolsonaro.
Essa postura foi um grande catalisador desse movimento de médicos que não se sentiam representados pela gestão do CFM. São vários estados com chapas de oposição à atual gestão. A infeliz posição do conselho durante a pandemia nos mobilizou a fazer essa mudança.
Karine Zanini: A emergência da pandemia de covid-19 explicitou a existência de uma parcela da categoria médica, fortemente apoiada pela atual gestão do CFM, pautada pela negação da ciência e das evidências científicas, tentando justificar condutas absolutamente questionáveis, com argumentos enviesados, defesa de um modelo de “autonomia médica” individual.
Qual papel o CFM deve cumprir para contribuir para o avanço da saúde brasileira?
Unaí Tupinambás”: O CFM tem muito o que contribuir para a saúde pública nacional, tanto para proteção da sociedade como um todo, como para a proteção da categoria médica.
No último período, o CFM se afastou dos conselhos de Saúde e de Residência Médica, deixando de participar desses fóruns consultivos e, às vezes, deliberativos do governo federal. Além disso, temos visto o CFM atuar como linha auxiliar da extrema direita no Congresso Nacional.
Precisamos voltar a atuar em temas importantes para a saúde pública, como a questão das vacinas, da ciência, da abertura de escolas médicas com rigor, etc. O conselho tem muito a contribuir, desde que ele cumpra o seu papel.
Karine Zanini: Na década de 1980, as entidades médicas, incluindo o CFM, estiveram ao lado da população brasileira na luta pela democracia, que resultou na promulgação da Constituição Federal de 1988. Conquistamos o direito universal à saúde, que, sob a responsabilidade do Estado, por meio de governos sucessivos, vem implementando o Sistema Único de Saúde (SUS).
Defendemos uma mudança no CFM, a partir de uma atuação com transparência contábil, com conselheiros independentes e comprometidos com a saúde da população brasileira, que defendam efetivamente a prática assegurada pela pesquisa científica, priorizando o pilar relação médico-paciente, a atuação ética e digna, em conformidade com a bioética e seus princípios.
No último período, vivemos uma ascensão de ideias “anticiência”. Qual deve ser a postura do conselho, diante dessa conjuntura?
Unaí Tupinambás: O CFM tem jogado contra a ciência. Recentemente, vimos a forma como o conselho se posicionou no debate sobre a obrigatoriedade da vacinação de crianças contra a covid-19. E nós sabemos que existe uma epidemia no mundo de casos graves em crianças, com mortes e síndrome inflamatória grave. No ano passado, por exemplo, foram 300 mortes de crianças.
O conselho fez uma enquete em sua página na internet, perguntando se os médicos acham que deve ser obrigatória ou não a vacinação das crianças. Isso é jogar contra a ciência e contra a vacina.
Acredito que isso, inclusive, impactou muito no calendário vacinal de outros imunizantes. A atual gestão do governo federal, de Lula (PT), tem feito um esforço gigantesco para ampliar a cobertura da vacinação contra a poliomielite e o sarampo, por exemplo, que são doenças graves e de rápida disseminação. Sem cobertura vacinal adequada, essas doenças podem retornar.
O CFM tem cumprido papel “deseducador”.
Karine Zanini: O CFM deve ter independência e autonomia em relação a partidos políticos e governos. Além disso, a defesa incondicional do SUS, com aperfeiçoamento e qualificação profissional. Também, o protagonismo, visando o aperfeiçoamento dos currículos médicos junto aos Ministérios da Saúde e Educação, com rigorosa fiscalização das faculdades médicas. A viabilização de amplos debates com a categoria e com instituições científicas da saúde coletiva em relação a temas polêmicos e sensíveis da bioética.
Como é realizada a eleição e quais são as perspectivas da chapa?
Unaí Tupinambás e Karine Zanini: Será realizada pela internet nos dias 6 e 7 de julho, das 8h às 20 horas, e podem participar os médicos ativos que estiverem com seus dados cadastrais atualizados e em situação regular junto ao seu Conselho Regional.
Cada estado da Federação e o Distrito Federal deverão eleger um conselheiro federal efetivo e um conselheiro federal suplente. Serão 28 membros. Depois, é eleita a mesa diretora.
Nós temos chapas de oposição em mais de 15 estados, muitas delas com grande aceitabilidade da categoria médica. Boa parte da categoria médica não se sente representada pelo atual CFM. Então, nós temos boas chances de eleger um contingente grande de médicos e médicas que defendem a ciência, o SUS e a saúde. Queremos montar uma diretoria que se alinhe com os interesses da população brasileira.
Mais informações
Para saber mais informações, leia o manifesto “Muda CFM”, lançado em maio, acompanhe a página da chapa e siga o perfil @minasmudacfm no instagram.
Publicado originalmente pelo Brasil de Fato em 18/06/2024 – 18h57
Por Ana Carolina Vasconcelos – Belo Horizonte (MG)
Edição: Elis Almeida
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