Conflitos internos, a oposição ganhando força na Câmara dos Deputados, fracasso no leilão do arroz importado e um ministro indiciado. Além disso, membros do próprio governo estão se alfinetando nos bastidores e através de notas na imprensa. Embora essa conjuntura de fatores tenha contribuído para a oposição ganhar força no Congresso nesta semana, o “inferno astral” do governo Lula começou no final de maio, durante as votações dos vetos presidenciais nas sessões do Congresso Nacional, especialmente na votação da criminalização das fake news.
Um artigo da jornalista Malu Gaspar detalha a reorganização da oposição. O texto descreve o papel ativo do senador Flávio Bolsonaro, filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, na mobilização contra a criminalização das fake news. Flávio pediu que parlamentares gravassem vídeos e utilizassem suas redes sociais para criar uma onda de apoio à medida. Com essa mobilização, começou uma articulação alegando ao Centrão que teriam mais votos do que realmente tinham, e o Centrão, que segue a maioria, embarcou na iniciativa. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP), focado em sua sucessão, aderiu à articulação.
Além de Flávio, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL), da bancada evangélica, também estava envolvido. Sóstenes, que havia apontado a desarticulação da base de oposição, agora se empenha no Projeto de Lei 1904/24, que pune vítimas de estupro que abordarem fetos resultantes do crime.
A oposição percebeu algo evidente desde o início do mandato de Lula: o governo não tem controle sobre sua base, não conta votos, não acompanha dissidências e tem um líder na Câmara dos Deputados mais próximo de Lira do que do próprio Lula. A oposição cria tumulto, faz barulho e se apresenta como maior do que realmente é, o que funcionou tão bem que até Arthur Lira entrou na confusão, buscando garantir votos para seu sucessor, em um movimento semelhante ao realizado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), no início do ano.
Pacheco, preocupado com sua sucessão, levantou diversas pautas da oposição e ameaçou avançar sobre o Supremo Tribunal Federal (STF), deixando o governo apreensivo. Quando garantiu os votos para sua sucessão, voltou a colaborar com o governo, muitas vezes de forma mais eficiente do que as próprias lideranças governistas.
Embora Lira não se torne um aliado confiável do governo, certamente espera algo em troca, além dos votos “superfaturados” da oposição.
A oposição, antes desarticulada, está animada com o sucesso de sua articulação. No entanto, os créditos da situação não são exclusivos da oposição. Desde o início, o governo tem tratado os problemas de articulação política com desdém. Quando a liderança do governo na Câmara decidiu não resistir ao PL 1904/24 e deixou claro que o assunto não era de interesse do governo, abriu a porteira para a oposição.
Desde a tramitação atrapalhada da Medida Provisória (MP) do Pis/Cofins até o recuo na discussão do PL 1904/24, passando pelo fracasso do leilão do arroz e a insistência na manutenção do problemático Ministro das Comunicações, Juscelino Filho (UNIÃO), no cargo, o governo tem facilitado o trabalho dos conservadores.
Isso significa que o governo Lula está sob risco de impeachment? Não. A oposição hoje se vale principalmente dos erros de articulação política do governo. Um impeachment depende de um poder de mobilização política que a oposição não tem em nenhuma das duas casas.
A tendência é que nas próximas semanas a situação se acalme, proporcionando ao governo uma oportunidade para rever sua articulação no Congresso Nacional.