Multidão saiu às ruas da Argentina para tentar barrar uma versão reduzida da Lei Ônibus, derrotada em janeiro nas ruas e no Congresso. Governo usa de violência e prisões para aprovar pacote neoliberal. Apesar de ser vitorioso na votação especialistas afirmam que na verdade Milei saiu derrotado.
por Bruno Falci, de Buenos Aires, para O Cafezinho
Para evitar um desmantelamento brutal da Lei de Bases e do pacote fiscal, o Governo, através da sua bancada de extrema-direita e da ajuda da chamada oposição dialogista, cedeu às exigências da oposição no Senado e aceitou mudanças fundamentais que marcam um duro revés pela política predatória de Javier Milei. Essa Lei é um grande pacote governamental que inclui vários pontos, entre eles o que propõe uma ampla reforma do Estado, o que até agora não foi alcançado.
Alguns analistas e parlamentares observaram que o governo obteve uma vitória de Pirro, expressão utilizada para se referir a uma vitória obtida a alto preço, potencialmente acarretadora de prejuízos irreparáveis. Esta expressão não se utiliza apenas em contexto militar, mas também está, por analogia, ligada a atividades como economia, política e justiça para descrever luta similar, prejudicial ao vencedor.
As mudanças anunciadas são produto da própria fragilidade do governo, numa sessão tensa e incerta. O projeto, que sofreu modificações, obteve 36 votos afirmativos e 36 negativos. A presidente do Senado, Victoria Villarruel, desempatou a favor da Lei. A aprovação ocorreu após um amplo debate (treze horas) e em um dia em que foram registrados graves incidentes e repressão brutal nas proximidades do Congresso, que deixou vários manifestantes feridos e alguns presos.
A Praça do Congresso amanheceu completamente cercada, como sempre que se prepara para votar contra o povo trabalhador argentino. Desde cedo, membros de assembleias de bairro, movimentos sociais e partidos de esquerda que rejeitam o conteúdo da lei reuniram-se em frente ao Congresso. Também estiveram presentes as duas centrais sindicais do país, a Confederação Geral do Trabalho (CGT) e a Central Operária da Argentina (CTA).
Privatizações derrotadas
Entre as modificações na Lei, decidiu-se retirar da lista Aerolíneas Argentinas, Correo Argentino e Radio y Televisión Argentina (TV Pública e Rádio Nacional) da lista de empresas a serem privatizadas. Originalmente, o mandatário desejava a venda do Banco Nación, o principal do país. A ideia foi retirada do texto. Outra mudança foi incorporar a proibição de dissolução de organizações vinculadas à cultura, sob ás quais pairavam iniciativas destruidoras.
A Comissão Nacional de Energia Atômica (CNEA) e os setores Mineiro, Energético, Tecnológico, Agroflorestal e Infra-estruturas também ficaram excluídos da possibilidade de intervenção. Desta forma, apenas a Enarsa e a Intercargo foram incluídas na lista das empresas a privatizar, enquanto permanecem as empresas a serem concessionadas: Aysa, Belgrano Cargas, Corredores Viales e Sociedad Operadora Ferroviera (Sofse). Trata-se de uma moeda de troca: As empresas estatais foram excluídas da lista de privatizações para obter votos da oposição, mas isso não significa que poderá surgir novas negociações no futuro.
Também foi derrotada a proposta estabelecendo que o Executivo poderia tomar decisões em áreas importantes, como a administrativa, a econômica e a financeira, sem a necessidade de consultar o Congresso. Eles tiraram o capítulo que eliminou a moratória da reforma e aumentou a idade de reforma das mulheres para 65 anos. O texto mantém a reforma trabalhista que o Senado agravou e ataca os direitos trabalhistas e promove o trabalho não registrado.
O que se segue dentro da Lei de Bases contém muitos ataques aos trabalhadores, especialmente no capítulo da reforma trabalhista (que o Senado agravou) e no ataque ao emprego público. Mantém também a delegação de poderes a Javier Milei em quatro áreas e durante um ano, alterações na legislação energética que terão impacto em tarifas mais caras, e benefícios exclusivos para os mais ricos do país e um regime de saque e entrega dos bens comuns naturais.
Repressão policial
Ao final de um dia com repressão policial, a Lei de Bases foi votada em geral. O Governo teve que fazer concessões e mudanças, enquanto negociava com a oposição durante semanas. Após as mudanças que forem votadas em especial, a norma volta à Câmara dos Deputados.
Apesar da repressão comandada pela Ministra de Segurança Patrícia Bullrich, o Governo não pode impedir que milhares de pessoas chegassem à Praça do Congresso para se manifestarem contra a Lei de Bases e o pacote fiscal em debate no Senado. Avançaram sobre os sindicatos, organizações sociais, grupos políticos e grupos auto-organizados que se manifestavam pacificamente contra os megaprojetos do partido no poder.
Neste contexto, legisladores da coalizão peronista Unión por la Patria e manifestantes ficaram feridos. A Polícia também fez prisões. As forças policiais atacaram deputados com spray de pimenta. Carlos Castagneto, Leopoldo Moreau e Eduardo Valdés, entre outros, foram afetados.
Papa Francisco recebe e apoia sindicalistas
Já passava da 13h quando a Associação Argentina de Aeronautas divulgou imagens de Francisco posando no Vaticano com Juan Pablo Brey, Verónica Espósito, Horacio Calculli; secretário-geral, deputado e segurança, respectivamente. Os sindicalistas, que tinham em mãos uma bandeira do grupo e outra das Aerolineas Argentinas, entregaram-lhe uma carta que destacava a importância da companhia aérea como instrumento do Estado. Durante a reunião, detalharam, “puderam mostrar a sua preocupação com a difícil situação económica que o país e a indústria aeronáutica atravessam”.