Algumas análises sobre a indústria brasileira de transformação ficaram obsoletas. Ou exageradas, pelo menos.
Os números da exportação brasileira de produtos industriais contam uma história um pouco diferente do senso comum sobre a “desindustrialização”.
Dados do Ministério da Indústria divulgados há pouco mostram que as exportações industriais brasileiras, no acumulado dos últimos 12 meses até maio, totalizaram US$ 177 bilhões, o segundo maior patamar da história, apenas superado pelo ano anterior. Em cinco anos, o aumento foi de 35%, e, em 20 anos, o crescimento das exportações industriais brasileiras cresceram quase 200%.
A maior parte dos produtos exportados pelo país, ou 52%, são classificados como “indústria de transformação”. Os produtos agropecuários não industrializados representam, por sua vez, 22,8%, e os produtos da indústria extrativa correspondem a 25% das nossas exportações. Esses percentuais se referem à receita das exportações brasileiras em 12 meses, até maio último.
No universo desses manufaturados, o grupo maior de produtos brasileiros exportados, nos últimos 12 meses até maio, foi o de insumos industriais elaborados.
O Brasil exportou, em 12 meses, US$ 68 bilhões em insumos industriais elaborados, o segundo maior valor da história, atrás apenas do período anterior.
Em cinco anos, o aumento foi de 16% e, em 20 anos, de 265%!
Entretanto, para que o entusiasmo também não seja exagerado, lembremos que a maior parte desses produtos, apesar do nome pomposo de “insumos industriais elaborados”, tem baixa complexidade. São produtos químicos, resíduos de soja, metais, madeira, couros, pedras, laminados. Mas são muitos. Contei quase 300 produtos deste grupo com exportação acima de 1 milhão de dólares nos cinco primeiros meses de 2024. Uma de suas maiores vantagens, portanto, é a diversificação.
Outra excelente notícia para a indústria nacional, e que também sinaliza uma mudança estrutural importante no tecido produtivo brasileiro, foi a exportação recorde de bens de capital (que são maquinários para uso industrial), que atingiu mais de 11 bilhões de dólares em 12 meses. Esse sim, não há dúvida de que é um produto de alto nível de complexidade econômica.
Se o Brasil está exportando mais bens de capital, isso significa que está conseguindo produzir esses maquinários também para a demanda doméstica.
O Brasil está conquistando, além disso, um espaço importante no mercado mundial de alimentos e bebidas industrializados.
A exportação brasileira desses produtos vem crescendo de maneira extraordinária desde 2020, e reflete, possivelmente, uma reacomodação do Brasil na divisão internacional do trabalho.
O Brasil não é mais visto apenas como fornecedor de produtos agropecuários in natura, mas também de alimentos já processados, destinados tanto à indústria (para embalagem ou reprocessamento), quanto para consumo direto.
Dentro do setor de alimentação, alguns produtos merecem destaque, como açúcar, carnes, sucos e ração animal. Somados, esses quatro produtos geraram US$ 55 bilhões em divisas para o Brasil, nos últimos 12 meses!
Alguns setores mais nobres, como o de aeronaves e veículos, também estão vivendo momentos promissores, tanto de recuperação para níveis que já tinham antes, mas também atingindo valores que nunca conquistaram.
As exportações brasileiras de aeronaves, por exemplo, totalizaram US$ 3,8 bilhões nos 12 meses encerrados em maio último, um aumento de quase 20% em 1 ano e superior a 53% em dois anos!
Conclusão
A indústria nacional parece estar encontrando, rapidamente, novas brechas para se desenvolver. Possivelmente ela está se beneficiando de mudanças na divisão internacional do trabalho, como o desinteresse crescente da China, por exemplo, em setores menos complexos, em função de seu foco absoluto no fortalecimento de suas indústrias tecnologicamente mais avançadas, como o setor de semicondutores.
Os setores industriais brasileiros que vem experimentando recuperação são principalmente aqueles onde temos vantagens comparativas, como o de alimentos, ou conectados a nossos vastos recursos naturais, como o de celulose e aço. E também aqueles onde temos larga experiência, como os setores de veículos e aeronaves.
O governo Lula está apostando pesado na neoindustrialização do país, usando sobretudo recursos do BNDES, e o instrumento de compras públicas. O setor industrial da saúde, por exemplo, ainda não decolou, mas os programas implementados pelo governo, e magnitude dos recursos disponíveis no próprio SUS para compras de produtos nacionais, o tornam um dos mais promissores.