Derrubando a mentira do “rombo fiscal”

Foto: reprodução redes sociais.

Preciso que vocês prestem muita atenção. 

O bolsonarismo “farialimer” está promovendo um terrorismo fiscal mentiroso, com objetivo de produzir instabilidade e prejudicar a economia nacional. A turma da Faria Lima (apelido para o universo de operadores do mercado financeiro que trabalham na avenida Faria Lima, centro financeiro de São Paulo) adora ganhar dinheiro com esse tipo de coisa. Eles convencem os trouxas a vender títulos, que eles compras às escondidas, e depois revendem com altíssimos lucros. 

As contas públicas estão sólidas e as perspectivas econômicas do país são boas. A produção industrial está forte, indicando que o país iniciou um processo de reindustrialização. Nosso superávit comercial vem batendo recordes sobre recordes. O desemprego chegou em sua mínima histórica. E a renda do trabalho vem crescendo de maneira vigorosa.  Temos problemas políticos, mas isso aí não tem jeito. Esse é o Brasil, e teremos que lidar com esse tipo de instabilidade por muito tempo ainda, talvez por toda a eternidade, até porque é uma instabilidade típica do regime democrático que escolhemos para nos organizar.

Vamos lá. O post vem com um monte de gráfico, que eu preciso que vocês examinem, assimilem, e entendam. São todos muito simples e intuitivos. 

Ontem eu me deparei com seguinte postagem, cheia de malícia e intenções manipuladoras, de um internauta nomeado “Faria Lima Elevator”, usando um gráfico do Poder 360, que por sua vez deve ser o site mais malicioso de todos. 

O internauta comenta: “estamos no mesmo nível de déficit nominal da pandemia, mesmo não estando na pandemia”.

Aí vem um monte de comentário catastrófico, alimentando uma falácia, porque não é assim que se avalia a solidez fiscal de um país. 

Não sou eu que digo. É o próprio presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, queridinho da Faria Lima, em sua mais recente apresentação para um evento da Lide, de 27 de maio de 2024. Segundo Campos Neto, o resultado primário do setor público consolidado (que reúne todos os entes públicos: federal, estadual, municípios, estatais, autarquias) está em rota acelerada de melhora de seus números. Resultado primário é, grosso modo, uma conta simples: receita menos despesa, ou seja, quanto o governo recebe menos o que gasta. Quando se fala em superávit primário, é porque o resultado primário é positivo. Quando se fala em déficit primário, é porque é negativo. 

Então, a previsão do Banco Central, com dados colhidos no mercado (ou seja, na própria Faria Lima) é de que o déficit primário do setor público, que tinha chegado a mais de 9% do PIB em 2020, caiu para 2,16% em 2023, e deve cair paulatinamente para 0,7% em 2024, 0,63% em 2025 e 0,50% em 2026. 

Esta é a previsão do mercado, na pesquisa do Banco Central de Campos Neto. O governo, por sua vez, tem números mais otimistas, e espera zerar o déficit este ano, repetir o desempenho dem 2025 e alcançar superávit primário de 0,25% em 2026. 

Apenas a história vai dizer, naturalmente. Mercado e governo fazem apenas previsões, mas somente o desempenho real da economia traz verdades objetivas. A Faria Lima costuma esquecer, mas nós não podemos esquecer, que esses números são relativos ao PIB, ou seja, ao desempenho econômico. Se o PIB crescer mais do que o mercado ou o governo prevêem, o resultado primário será melhor. 

Então a primeira, e principal, mentira, está exposta. Não há expectativa negativa para as contas públicas. Mantenha em mente que essas previsões do mercado são muito sérias, pois envolvem a credibilidade dos principais e mais respeitados analistas do mercado financeiro. Mas é preciso fazer uma observação. Esses analistas tem um viés fortemente liberal, e suas previsões em relação à economia no governo Lula tem sido sistematicamente pessimistas demais. 

Examinem os gráficos abaixo, que também estão na recente apresentação do Campos Neto. O Boletim Focus, que reúne as previsões da Faria Lima, tem reajustado para cima a estimativa para o PIB de 2024 quase toda semana. Em julho de 2023, a Faria Lima previa um crescimento do PIB em 2024 pouco maior que 1%. Foi elevando essa projeção e hoje está em mais de 2%. O FMI previu 2,2% para o PIB deste ano, e o governo Lula agora estima em 2,3%. A mesma coisa para o primeiro trimestre de 2024, para o qual se previa, em meados do ano passado, um crescimento inferior a 1%, e que agora se estima que deve ter sido superior a 2%. 

Entenda, que em se tratando de PIB, estamos falando de trilhões de reais, de maneira que uma diferença de 1% é muito grande. 

Até agora ficamos no campo das expectativas. Desmentimos, com dados e análises de fontes idôneas, e até mesmo conservadoras, que haja qualquer expectativa negativa para as contas públicas nacionais. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, vem realizando um trabalho brilhante, respeitado por todos os espectros ideológicos, inclusive pelos economistas liberais. 

Vamos agora aos dados consolidados. Agora não se trata mais de expectativas, mas de receitas e despesas reais, já efetivados e descontados. É dinheiro vivo. 

Os terroristas mencionados no alto do post inventaram que o déficit nominal de abril deste ano, no acumulado de 12 meses, estaria maior do que no auge da pandemia. Mentira. Para contar a mentira, o malandro usou valores correntes, e não se faz isso. Se foremos usar valores correntes, então o governo Lula poderia se gabar que o PIB acumulado nos 12 meses até abril de 2024 foi de 11 trilhões de reais, quase 50% acima do PIB nos 12 meses até abril de 2020. Mas não se faz isso. Tem que descontar inflação, para começar. 

Um país hipotético pode ter um déficit nominal de 1 trilhão de reais num determinado ano, e isso ser de fato um risco fiscal, porque poderia representar 30% do PIB, mas num outro momento de sua história, o mesmo trilhão de déficit poderia ser insignificante, e representar apenas 0,1% do PIB, e corresponder, portanto, a uma situação saudável. 

O importante é olhar sempre o percentual sobre o PIB, par termos um senso de proporção. A propósito, todos os gráficos aqui se referem a períodos acumulados de 12 meses. 

Ao contrário do que o picareta lá de cima vendeu, o déficit nominal de hoje está muito menor do que o registrado durante a pandemia. Em outubro de 2020, o déficit nominal foi de 13,48% do PIB, ao passo que o de hoje, abril de 2024, está em 9,41% do PIB. Bem menor, portanto. Menor inclusive que o déficit de janeiro de 2016, quando chegou a 10,73% do PIB. 

Aliás, é importante desmistificar outra falácia, a de que os governos petistas seriam “gastadores” ou irresponsáveis do ponto-de-vista fiscal. Isso não é verdade. O gráfico abaixo mostra que os governos Lula 1 e 2, e Dilma 1, praticaram apenas superávits primários. A situação fiscal no país se deteriorou exatamente quando a direita liberal decidiu remover o PT do poder, de forma não democrática, primeiro através da operação Lava Jato e depois pelo golpe de 2016. 

Abaixo o déficit nominal em valores correntes: sim, se o usarmos, o déficit nominal de abril de 2024, que foi de R$ 1,04 trilhão, é superior ao de outubro de 2020. Mas o PIB do Brasil de hoje é muito maior, em valores correntes, ao de outubro de 2020. 

O déficit nominal foi muito ruim em 2020, naturalmente, por causa da pandemia. Registra uma recuperação em 2021, também por conta do processo de volta da atividade econômica, mas volta a piorar a partir de 2022, em resultado da desorganização tanto das finanças quanto da adminstração pública, ao final do governo Bolsonaro. Como já vimos na previsão do Banco Central, há expecativa de melhora a partir deste ano. 

Outro dado fiscal importante para se medir a solidez das contas públicas, e se comparar períodos diferentes, é a dívida bruta do governo federal. Eu fiz um gráfico com 3 momentos diferentes, para novamente desmascarar a mentira de que estamos pior hoje do que na pandemia. 

Em outubro de 2020 (lembre que todos os gráficos deste post se referem a acumulado em 12 meses), a dívida bruta do governo federal chegou a 87,7% do PIB, Hoje caiu para 76% do PIB. Ou seja, melhoramos, e muito! A propósito, em agosto de 2019, com sete meses de Bolsonaro, a dívida estava em 77,6% do PIB. 

Entretanto, se é para compararmos os momentos econômicos, é imporante não olharmos apenas para os dados macroeconômicos, sob o risco de não entendermos a conjuntura. Não adianta muito ter solidez fiscal e um desemprego brutal no país. 

Eu sei que Faria Lima não costuma dar bola para detalhes, como a taxa de desemprego no país, mas a gente dá. Em março de 2016, período conturbado pelas agitações golpistas, nas quais incluo a Lava Jato, o desemprego chegou a 11,3% da população ativa. No auge da pandemia, em setembro de 2020, chegou a quase 15%. Depois de 1 ano e 4 meses de governo Lula, o desemprego no país chegou a 7,5%. Esse é um dado fundamental, porque sinaliza estabilidade econômica e social. 

 

A apresentação do Campos Neto também traz dados sobre o mercado de trabalho. E os gráficos são igualmente impressionantes. Há uma queda muito acentuada do desemprego, com destaque para o aumento na população ocupada em empregos formais. O Brasil está chegando a 110 milhões de pessoas trabalhando, um recorde histórico. 

  

Outro dado muito positivo é a elevação dos rendimentos do trabalho, que também registra uma curva ascendente impressionante. Talvez isso explique o mau humor da Faria Lima, cujos operadores aparentemente só estão felizes quanto o povo está na pior. 

Ainda usando a apresentação do Campos Neto, temos um gráfico para a inflação (IPCA, que é a sigla usada pelo IBGE para medir a inflação no país). A inflação em 12 meses vem literalmente despencando desde 2022. Em abril de 2022, chegou a mais de 12%, e hoje está em 3,7%, o que é uma taxa de país desenvolvido.  

Conclusão

O governo brasileiro enfrenta problemas políticos no congresso, mas é preciso ter um pouco mais de compreensão, serenidade e tolerância com o momento atual. Temas relacionados a segurança pública e costumes ainda serão dominados, por um bom tempo, pelos setores mais conservadores, até porque os parlamentares não conseguem se descolar do conservadorismo da própria população nestas áreas.

As “derrotas” da esquerda serão comuns quando as batalhas se derem nestes campos. Deixemos a direita se jactar à vontade. Talvez seja até bom, para distensionar o ambiente político. Tem o lado triste que são os retrocessos sociais, como o fim do direito dos presos à visitar suas famílias, mas veja que o judiciário já começou a moderar isso. O ministro André Mendonça, o que não deixa de ser irônico, pois foi o nome mais conservador indicado pelo ex-presidente Bolsonaro, determinou que os presos atuais não perderam o direito adquirido das saidinhas, reduzindo sensivelmente o impacto que essa medida poderia ter sobre o sistema prisional. Outras diatribes bolsonaristas também devem passar pelo mesmo tipo de moderação. Ao final, as vitórias da oposição, como já disse em outro artigo, se revelarão muito mais simbólicas do que objetivas.

A população brasileira não é conservadora na economia. As pessoas querem investimento do Estado em infra-estrutura, mobilidade urbana, saúde e educação. É aí que a esquerda pode ganhar, com apoio do centro político no parlamento, e da maior parte da sociedade.

Outro ponto importante é que não podemos exagerar a importância de indicadores de opinião. Eles são excelentes para entendermos o humor da sociedade naquele momento, mas não se pode jamais analisá-los de maneira descolada dos dados econômicos e sociais. Reitero o que venho dizendo há algum tempo: a esta altura do mandato do presidente Lula, o que importa é que o povo esteja bem, empregado, com renda crescente e inflação baixa, e não que ele esteja super bem avaliado. Se a economia continuar avançando, a tendência é que Lula se reeleja ou eleja um sucessor.

Keep calm e bom feriado para todos!

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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