Quando Simon Harris se tornou o futuro primeiro-ministro da Irlanda em março, ele recorreu a uma plataforma favorita para se expressar: o TikTok.
Num vídeo com “OBRIGADO” escrito em letras amarelas, o homem que será o mais jovem Taoiseach da Irlanda contou aos seus 95 mil seguidores sobre a sua ascensão de um “adolescente teimoso e temperamental” irritado com a falta de ajuda educacional para o seu irmão autista.
Harris, às vezes apelidado de “TikTok Taoiseach”, faz parte de uma vanguarda de políticos europeus que adota a plataforma de mídia social de propriedade chinesa, calculando que a necessidade de alcançar os eleitores mais jovens supera as preocupações de segurança.
Com a aproximação das eleições europeias em Junho, os principais políticos estão receosos de ceder terreno a partidos marginais que exploraram com sucesso o seu formato de vídeo curto.
Mas o TikTok está sob crescente escrutínio no Ocidente devido ao temor de que os dados dos usuários do aplicativo de propriedade da empresa ByteDance, com sede em Pequim, possam acabar nas mãos do governo chinês.
As agências de segurança da Alemanha, por exemplo, alertaram contra o uso do aplicativo devido a preocupações de que ele pudesse compartilhar dados com o governo da China ou ser usado para influenciar os usuários.
Nos EUA, os legisladores querem forçar a venda da plataforma por seu proprietário chinês ou proibi-la das lojas de aplicativos. O presidente Joe Biden levantou preocupações com o presidente chinês Xi Jinping.
MACRON AGORA 4 MILHÕES DE SEGUIDORES
O TikTok afirma que os avisos de segurança são injustificados e não coleta mais informações do que outros aplicativos. Numa tentativa de amenizar as preocupações, lançou, abre uma nova abaum site para armazenar dados de usuários europeus em Dublin no ano passado e contratou uma empresa de segurança terceirizada para monitorar os fluxos de dados.
A ByteDance negou o uso de seu produto para espionagem, enquanto o governo chinês também negou qualquer intenção desse tipo.
Harris, 37 anos, foi um dos primeiros a adotar em março de 2021, produzindo vídeos que variavam de um resumo do orçamento de 60 segundos com fundo musical a imagens dele fazendo uma xícara de chá enquanto assistia futebol.
Outro foi o presidente francês Emmanuel Macron, que possui 4 milhões de seguidores desde que ingressou no TikTok em 2020.
Na Alemanha, a adoção do TikTok por políticos seniores é uma tendência mais recente, com o ministro da Saúde, Karl Lauterbach, a tornar-se o primeiro ministro do país a abrir uma conta em março.
“Revolução no TikTok: começa hoje”, disse ele.
“Não podemos deixar as redes sociais para a AfD”, disse ele, do partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD), que se tornou o segundo mais popular da Alemanha.
O chanceler Olaf Scholz também sugeriu em fevereiro que seu governo abrisse uma conta no TikTok.
Em contrapartida, os principais ministros da Alemanha já têm uma presença estabelecida noutras redes sociais. Por exemplo, Scholz, o ministro das finanças, o ministro da economia e o ministro dos Negócios Estrangeiros têm contas no Instagram, tal como Lauterbach.
Chegar aos eleitores jovens é particularmente urgente, uma vez que os jovens de 16 anos na Alemanha podem votar nas eleições europeias de junho.
‘PÂNICO’ DAS FESTAS PRINCIPAIS
Entre os partidos alemães, a AfD domina o TikTok. O partido tem 411 mil seguidores e seu principal candidato, Maximilian Krah, 41 mil.
“Portanto, todos os outros partidos democráticos estão em pânico neste momento para não deixar esta importante plataforma e o grupo demográfico jovem, os eleitores jovens, a este partido radical”, disse o consultor político Johannes Hillje.
Num vídeo, Krah incentiva os alunos a confrontarem os professores de esquerda. Outro o vê dando conselhos sobre namoro a jovens, dizendo-lhes para não assistirem pornografia ou votarem nos Verdes. “Homens de verdade são de direita, homens de verdade têm ideais, homens de verdade são patriotas.”
Os principais políticos que desejam imitar esse alcance enfrentam um dilema porque também suspeitam de utilizar uma plataforma de um país autoritário.
Lauterbach disse que pode ter reservas em relação ao TikTok, embora reconheça sua eficácia. “Não dou qualquer legitimidade à plataforma ao usá-la”, disse ele. Para evitar vazamentos de dados, ele comprou um telefone separado para uso no TikTok.
A equipe de Macron também diz que o presidente francês vê a utilidade do TikTok e a necessidade de regulamentação como questões distintas. “Não podemos ignorar esta população, a grande maioria da qual não vê notícias na televisão nem lê a imprensa”, disse à Reuters um conselheiro que não quis ser identificado.
Mostrando o nível de preocupação com a segurança, a Grã-Bretanha e a Áustria baniram o TikTok dos telefones comerciais dos funcionários do governo no ano passado.
Mas o TikTok está se tornando mais difícil de ignorar. Um relatório do Instituto Reuters para o Estudo do Jornalismo do ano passado descobriu que menos pessoas estavam confiando na mídia tradicional e mais recorrendo ao TikTok para obter notícias.
O TikTok foi a rede social que mais cresceu no relatório, usada por 20% dos jovens de 18 a 24 anos para obter notícias.
No Reino Unido, o ministro mais antigo com presença significativa no TikTok é o secretário de Defesa Grant Shapps.
Quando a proibição do TikTok de dispositivos governamentais foi anunciada, Shapps respondeu na plataforma com um clipe do filme “Lobo de Wall Street” de 2013, onde o personagem de Leonardo DiCaprio, Jordan Belfort, declara: “Não vou embora, porra”.
Shapps acrescentou que nunca usou o TikTok em dispositivos governamentais e que a proibição era sensata.
A Bélgica proibiu ministros e funcionários públicos de instalarem o TikTok nos seus dispositivos oficiais, mas os políticos contornam esta situação utilizando a aplicação em dispositivos separados.
Os políticos do Partido Verde, co-governante, publicam vídeos do TikTok com dispositivos que estão conectados apenas a 4G e não têm outros aplicativos instalados, e os telefones não são mantidos pelos próprios políticos, mas por seus funcionários.
“Outra razão pela qual estamos nisso (TikTok) é que não queremos deixar o campo para a extrema esquerda ou para a extrema direita”, disse um porta-voz do Partido Verde à Reuters.
“Os jovens recebem notícias através das redes sociais e o TikTok é uma das maiores plataformas. Alguns políticos estão confortáveis com isso, outros não.”