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Ipec confirma curioso fenômeno visto na Quaest e na Atlas: Lula vem crescendo na classe média

Mais uma vez, acho que está havendo um drama excessivo com uma pesquisa de avaliação do governo. É preciso bom senso, calma e sangue frio. Os dados econômicos estão sólidos. O desemprego caiu. A inflação enfrentou um pequeno repique em janeiro, concentrado em alguns alimentos, mas está controlada e a previsão para este ano é […]

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07.03.2024 - Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a reunião do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, no Palácio do Planalto. Brasília - DF. Foto: Ricardo Stuckert / PR

Mais uma vez, acho que está havendo um drama excessivo com uma pesquisa de avaliação do governo. É preciso bom senso, calma e sangue frio.

Os dados econômicos estão sólidos. O desemprego caiu. A inflação enfrentou um pequeno repique em janeiro, concentrado em alguns alimentos, mas está controlada e a previsão para este ano é de uma inflação ainda menor que a de 2023.

Muitos projetos anunciados ou iniciados pelo governo em 2023 darão frutos agora, alguns deles muito grandes, como o programa Pé de Meia, de ajuda financeira aos estudantes, e isso certamente terá impacto positivo na avaliação de Lula.

Mas vamos à pesquisa Ipec, divulgada hoje, com entrevistas realizadas nos dias 1 a 5 de março deste ano.

Lula perdeu alguns pontos de aprovação pessoal, que agora está em 49%. Na pesquisa Atlas, Lula pontuou 47%, na Quaest, 51%.

Não há surpresas, portanto.

Lula tem apoio de um pouco mais da metade da população, enquanto uma outra metade, ou pouco menos que a metade, o rejeita. Foi assim que Lula ganhou as eleições presidenciais. É curioso que os bolsonaristas, que sempre negaram pesquisas, e até mesmo os resultados eleitorais, agora venham legitimar números que apenas confirmam a polarização, com viés favorável a Lula, que vimos nas urnas.

Entretanto, assim como vimos na Quaest e na Atlas Intel, vem acontecendo, meio que subterraneamente, um fenômeno curioso: Lula está se recuperando na classe média.

Na Ipec, Lula ganhou 8 pontos de aprovação na classe média tradicional, que ganha renda familiar acima de 5 salários, passando de 32% para 40% de aprovação.

Sua rejeição nesse estrato, que estava em perigosos 64% em dezembro, caiu para 56%.

Repito o que já disse nas últimas análises: o principal perigo vem da classe média. Foi ela quem derrubou Dilma Rousseff, foi ela quem sustentou a Lava Jato, foi ela que levou Lula a cadeia e foi ela que elegeu Bolsonaro.

Se Lula está reconquistando a classe média, mesmo que às custas de uma perda relativa do total de eleitores, isso significa um trunfo extraordinário, no médio e longo prazo, para o governo Lula.

Outro dado importante da pesquisa é o recorte de gênero.

Na contramão da média geral, Lula não perdeu nenhum ponto de aprovação entre homens. Ao contrário, oscilou um ponto para cima, e agora tem aprovação de 50% dos homens, contra 49% em dezembro. Isso tem um significado importante, porque confirma o caráter específico e pontual da queda na avaliação. Não foi uma perda de apoio de caráter estrutural.

Repare também que Lula permanece com aprovação alta, de 57%, entre quem ganha até 1 salário – embora tivesse incríveis 64% em dezembro. Essa queda é possivelmente decorrência do repique inflacionário de janeiro, mas também pode ser fruto da manipulação pesada que algumas lideranças religiosas fizeram das declarações de Lula sobre Israel. O presidente também oscilou positivamente entre eleitores com renda famíliar de 1 a 2 salários, de 51% para 52%.

Conclusão

A Ipec revela um fenômeno muito parecido com que vimos na Quaest e na Atlas Intel: Lula perdeu apoio sobretudo entre mulheres evangélicas de classe média baixa (2 a 5 salários) e classe muito baixa (até 1 salário).

No recorde por religião da Ipec, Lula mantém apoio forte de 56% dos eleitores católicos, embora 2 pontos a menos que tinha em dezembro, e perdeu 3 pontos entre evangélicos, de 39% para 36%.

Se a economia estivesse apresentando algum problema estrutural grave, uma queda na pesquisa, mesmo que pequena, poderia indicar uma consolidação perigosa de um processo de rejeição. Não me parece que seja isso.

Aparentemente, o bolsonarismo usou a fala de Lula sobre Israel para agitar as massas evangélicas, e conseguiu aumentar a rejeição do presidente nesse extrato, especialmente entre as mulheres. Como isso não é um fato estrutural nem da política nem da economia, pode ser uma onda passageira, e não seria surpresa se Lula recuperasse, nas próximas pesquisas, os pontos perdidos nas últimas semanas.

Mesmo assim, vale o alerta para o governo. Lula fez o certo em subir o tom contra Israel, que está protagonizando um genocídio na Palestina, mas agora está claro que as lideranças evangélicas bolsonaristas conseguiram inculcar na cabeça de alguns fieis, com notável rapidez, que a Israel de Netanyahu é a mesma do Antigo Testamento. Então é preciso, de fato, cuidado com a linguagem ao se falar desse assunto.

De maneira geral, todavia, essa é mais uma pesquisa tranquila para o governo, e que apenas nos revela o mesmo país polarizado que vimos nas urnas.

A íntegra da Ipec de março pode ser baixada aqui. A pesquisa da Ipec de dezembro está aqui.

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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Tiago Silva

09/03/2024 - 17h42

O problema do momento é que Bolsonaro está em campanha no Brasil… enquanto Lula está em campanha fora do Brasil.

Um problema mais estrutural consiste no erro de avaliação, inclusive de Miguel do Rosário. Lula não perdeu a mulher evangélica, pois nunca a teve… o que acontece é que Micheque está ainda mais ativa e está conseguindo politizar esse público feminino. Bolsonaro sempre teve dificuldade com o público feminino, pois conseguiu mais facilmente ideologizar o público masculino de classe média em um efeito de manada em redes sociais (muito impulsionado por Youtubers que depois viraram parlamentares mais votados). Agora quem busca ideologizar esse público feminino é Micheque, que está tendo sucesso no meio evangélico e poderá ter sucesso no meio católico de classe média.

Bolsonaro já ideologizou quem se acha empresário ou quem quer ser empresário (por isso mais um motivo para o quanto antes aprovar o fim da isenção sobre lucros e dividendos), além do agro, militares e evangélicos (que são outras classes cheias de privilégios e que pagam pouco impostos no Brasil, mesmo se declarando “patriotas”).

Porém, o problema maior (além da falta de ideologização ou politização dos eleitores de esquerda, em sua maioria ganham até dois salários mínimos e tem relação utilitária com o governo em relação a benefícios sociais – contentes pq turbinaram o bolsa família, mas não são ideologizados – ou benefícios da CLT) é diminuir a sensação de desigualdade ou que “o governo trabalha pra ricos”.

Os poucos eleitores de esquerda ideologizados estão entre os universitários de universidades públicas (e por isso o governo dá tiro no pé toda vez que amplia o Fies de estudantes de universidades privadas), fração minoritária da classe média (servidores públicos, artistas e empresários ou autônomos oriundos de universidades públicas), além de sindicatos que foram desidratados. Não a toa a direita quando esteve no poder buscou combater universidades públicas, sindicatos e artistas (apesar de favorecer artistas do agro ou empresários de artistas como no Perse).

Em pesquisa recente do QUAEST há o indicativo forte que os eleitores de esquerda acham que “o governo Lula trabalha pra ricos”… E também para os eleitores de Bolsonaro (não os que ganham mais de 20 SM, mas os que estão entre 3SM e 10SM) acham ainda mais que “o governo trabalha pra ricos” (além de eleitores de direita achem que o governo trabalha mais para a minoria de LGBT). Observe: https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2024/03/09/quaest-bolsonaristas-creem-que-perderam-importancia-com-inclusao-social.htm

Ou seja, para resolver o maior problema do governo… teria que:

1) Fortalecer Universidades Públicas (e aumentar o número de escolas de aplicação vinculadas às universidades públicas), sindicatos, agricultura familiar, empreendedores que tenham ganhos até o limite da isenção mensal do IRPF, além de artistas.

2) Tentar politizar e ideologizar os beneficiários de benefícios sociais como bolsa família e trabalhadores celetistas.

3) Retirar privilégios de Empresários (isenção de lucros e dividendos, diminuir os limites de receita do simples a patamares mais aceitáveis no mundo, fazer pagar os tributos previdenciários, etc), privilégios de igrejas empresas, privilégios de militares, privilégios patrimoniais (como ITR, Heranças, tributar a propriedade de armas, etc), além de fazer reforma trabalhista para diminuir para 40 horas semanais. E poderia começar a mostrar quem são essas pessoas que recebem privilégios, além de impor que caso receba privilégio do governo… teria que publicizar a sua contabilidade pessoal ou empresarial para que todos possam ver se merece ou não merece esses incentivos fiscais.

4) Criar empresas públicas ligadas à universidades públicas que seriam objetivadas a fazer produtos de maior valor agregado ligados à tecnologias recentes (drones, automóveis elétricos, sistemas dr e energia eólica e solar, etc)

5) Não ficar submisso a Reformas Estruturais tocadas pela Direita (as reformas do governo Temer e inclusive a reforma tributária no governo Lula) para que possa efetivar um governo menos frustrante para quem está ideologizado ou politizado da esquerda.

O problema não foram falas sobre Israel ou Ucrânia, apesar do apreço destes países respectivamente por evangélicos e neoliberais… mas a falta de ações internas ao Brasil que possa fazer um governo menos frustrante.

Aliás, é frustrante politizar alguém para ser esquerda tendo como governo um Lula que se deixa virar refém do Centro e com indicações conservadoras (até para o STF como no caso de Zanin e de tantos outros que infelizmente fez também), além de ter como outro expoente o Haddad que poderia ser o sorvete de chuchu que acompanha o Alckimin picolé de chuchu.

Vai demorar muito pra Lula conseguir politizar os seus eleitores como já fez Bolsonaro (até pq a maioria de seus fanáticos são de classe média, empresários – inclusive de igrejas, segurança pública e do agro -, que tiveram mais acesso às redes sociais com influencers ideologizadores), mas daria para Lula buscar melhorar sua imagem para os dois públicos (votantes de Lula e votantes de Bolsonaro) ao realizar ações que diminuam as desigualdades e que dê a entender que não se estaria a trabalhar “para ricos” (como uma reforma tributária sobre rendas, herança, patrimônio, além de mais direitos trabalhistas, mais educação pública, mais saúde pública, mais segurança pública com câmeras, menos terceirizações, menos privilégios a empresários, igrejas, agro e militares).

Paulo

09/03/2024 - 11h43

E isso vale tanto para a esquerda quanto para a direita – basta verificar o festival de favores pré-eleitorais de Bolsonaro…

Paulo

09/03/2024 - 11h42

Enquanto houver bolsa-família e quejandos ninguém precisa se preocupar com a classe média, que será extinta progressivamente…

Marcelo Barros

08/03/2024 - 22h36

De saída, gostei bastante de sua avaliação. A minha caminha nesse mesmo sentido. É importante um movimento mais claro em direção a classe média, que para mim é o fiel da balança no jogo eleitoral.

Carlos Lobo

08/03/2024 - 19h03

A questão é a percepção de alta nos preços: das contas ( 63%), dos alimentos (72%), dos combustíveis (51%)

Zulu

08/03/2024 - 17h35

Não existe classe média no Brasil, 1% da população ou nada não faz diferença nenhuma.

O que no Brasil chamam de classe média em países normal estaria passando fome.


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