Desde o início do ano, a Câmara dos Deputados foi tomada por uma discussão que pegou a maioria dos parlamentares de surpresa: a composição das presidências e vice-presidências das comissões da casa. O motivo? O presidente da casa, Arthur Lira (PP), havia decidido que iria desfazer todos os acordos firmados no início da legislatura em 2023.
O plano era simples: criar uma confusão em 2024 olhando para 2025. Preocupado com a eleição do seu sucessor na liderança da casa, Lira entendeu que era melhor tentar garantir os apoios dos partidos do centrão do que tentar agradar o PL (oposição) e o PT (situação). O primeiro, ele sempre julgou já fechado com ele (com exceção da parte bolsonarista), e Lula, no final do ano passado, já havia afirmado que o governo estaria com Lira e seu sucessor de 2025. Por isso, decidiu que o melhor a fazer era mandar os dois partidos às favas.
Depois de quase três meses de idas e vindas, aos 45 minutos do segundo tempo, na noite de terça-feira (05), Lira decide que os acordos firmados seriam respeitados e que as presidências seriam definidas nesta quarta-feira (06); caso contrário, seria apenas em junho ou até mesmo julho. O que mudou de uma hora para outra? Acontece que o PL reagiu e ameaçou lançar candidato próprio na disputa para a presidência da casa no ano que vem. Com a incerteza sobre quantos votos teria para seu sucessor, Lira optou por manter boa parte dos acordos firmados.
Na noite anterior, conforme divulgado por esta coluna, já havia a preocupação de deputados governistas de que, diante da ameaça do PL, Lira poderia romper com o acordo de que nomes de extremistas notórios do partido fossem barrados.
Com tudo (mais ou menos) acertado, até mesmo a relação de quais partidos assumiriam quais comissões foi divulgada e publicada por esta coluna. Mas não adiantou; nas primeiras horas de hoje (06), o clima que já era de apreensão acabou se tornando de confusão total.
Num primeiro momento, Lira foi contra a insistência do PL em indicar os radicais Carolina de Toni para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e Nikolas Ferreira para a Comissão de Educação. Quem esteve nas reuniões de hoje disse que ele chegou a ficar bem incomodado diante de toda a situação e que ele estaria disposto a insistir em barrar os nomes.
O PL chegou até mesmo a cogitar que poderia desistir da indicação dos bolsonaristas se o PT abrisse mão da Comissão de Saúde (rica em emendas).
Diante do impasse que ameaçou implodir a definição das comissões, subitamente, o deputado José Guimarães (que é extremamente próximo de Lira), líder do governo, anunciou que as comissões seriam sim instaladas e que o PL poderia sim indicar os extremistas sem muita oposição do partido do governo.
O anúncio do deputado pegou boa parte da base governista de surpresa, gerando revolta e inconformismo entre muitos deputados que, nos bastidores, criticaram a posição do deputado como um voluntarismo desnecessário e uma atitude isolada que desconsiderou os demais parlamentares.
Em dado momento, parecia que enquanto os líderes das bancadas já haviam se acertado, faltavam os respectivos liderados aceitarem o acordo feito. Quem esteve nas discussões afirmou que o clima era de inconformismo, principalmente na base governista. E mais uma vez, muitos parlamentares davam a entender que a novela das comissões mais uma vez não seria encerrada.
Já na cara do prazo para as votações, o deputado Odair José da Cunha (PT) convocou uma reunião urgente na liderança do PT com todos os deputados petistas. A pauta seria a Comissão de Educação.
Quase duas horas depois da reunião, sem que muita gente entendesse, o deputado Rogério Correia (PT) fez uma publicação em suas redes sociais anunciando que a bancada progressista iria romper o acordo e votar em outro candidato que não fosse o Nikolas Ferreira. Porém, na hora da votação, nenhum outro candidato ofereceu seu nome. Com isso, a publicação do deputado não fez muito sentido. Como o PT anunciaria voto em outro candidato se não havia outro candidato?
Bem, o post era apenas parte da história. Ninguém conta qual foi o santo; porém, todos sabem da missa. Acontece que surgiu na mesa a possibilidade de o PL indicar dois candidatos para a comissão da educação: Nikolas e alguém mais moderado, membro do centrão-raiz. No acordo firmado, apenas o PL poderia indicar nomes para a comissão. Por isso, se fosse para ter alguma alternativa ao deputado bolsonarista, teria que vir do próprio PL. Muita promessa e pouca atitude; no fim, o deputado ficou a ver navios em uma situação um tanto quanto melancólica.
Porém, traz uma coisa interessante: Rogério é extremamente próximo de Guimarães, que aceitou o famigerado acordo, enquanto Rogério deu de ombros para o acordo, costurando eleição direta na comissão. Como ficará o clima na liderança petista? Por enquanto, é difícil dizer.
Mas e a CCJ? Essa batalha já havia sido perdida, principalmente depois do líder do governo anunciar que não havia muito o que fazer.
A avaliação de Guimarães também foi bem pragmática. Embora reconhecesse que a situação toda era um problema sério, ao mesmo tempo entendia que, com base no acordo firmado no ano passado, o PL tinha o direito de escolher a comissão. Logo, não havia muito o que fazer. “Tencionou-se, mas não havia muito o que fazer”, disse uma fonte próxima do deputado.
Segundo outra fonte, a avaliação levada em consideração pelo deputado era simples e objetiva: se o PL ficasse sem as comissões este ano, iria reivindicar no ano que vem. E este ano, o calendário legislativo será extremamente curto, se contarmos com os recessos de meio e final de ano e eleições. Podemos dizer que, de fato, a Câmara terá um pouco mais de 5 ou 6 meses de trabalho, levando em consideração que a peleja das comissões só foi resolvida após três meses de discussões.
O deputado acabou optando pelo mal menor.
Questionada sobre a lógica empregada pelo deputado, uma fonte disse: “tem sentido, mas que vai ser um espetáculo dantesco, vai”.
No fim, para os deputados, a suposta insistência de Lira em barrar os extremistas não passou de mera bravata. Ficou a cargo de Guimarães, seu amigo do peito, desatar o nó.
Com a curta agenda legislativa que a Câmara terá este ano, acho difícil que possa haver um dia mais confuso que hoje ainda este ano. Porém, tratando-se de nossos briosos parlamentares, nunca podemos abaixar a guarda. Por enquanto, este é o dia mais confuso do ano.
Alguns parlamentares da base governista afirmaram que apenas queriam esquecer o dia de hoje.
Nessas horas, resta lembrar o ex-deputado e ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (preso por corrupção): “Que Deus tenha misericórdia dessa nação”. Completo: Brasil, onde um moleque que acredita que a terra é plana, agora comanda uma comissão voltada para a educação de jovens de todo o país.
João Ferreira Bastos
07/03/2024 - 10h35
Essa maldita politica de conciliação e republicanismo está destruindo o PT