Por Paulo Gala
A balança comercial brasileira apresentou um grande superávit de US$ 98 bilhões em 2023, significativamente acima dos US$ 60 bilhões do ano anterior. As exportações para a China se destacaram, atingindo a marca de US$ 100 bilhões e contribuíram muito para a valor total de quase US$ 350 bilhões das exportações brasileiras.
Commodities como petróleo, soja e minério de ferro representaram quase 50% de todas as exportações. A soja atingiu quase 20% do total exportado, sendo parte significativa destinada à China.
Essa dinâmica, especialmente no setor de commodities, traz um cenário positivo para a economia brasileira, impulsionando o fluxo de dólares.
O Brasil, ao lado da China, consolida sua posição como um grande exportador mundial com superávits comerciais expressivos, embora a China lidere em produtos industriais e tecnológicos.
A safra recorde de 2023, superando 300 milhões de toneladas de grãos, e a robusta produção de petróleo, aproximando-se de quatro milhões de barris por dia, são indicadores impressionantes do desempenho brasileiro.
As projeções para 2024 indicam uma balança comercial de pelo menos US$ 80 bilhões, podendo ser ainda melhor, dependendo das condições da safra.
Esse panorama sugere um cenário interessante de fluxo de dólares para o país, garantindo estabilidade e até mesmo uma apreciação da taxa de câmbio.
A expectativa é que o câmbio possa atingir a marca de R$ 4,50 ao longo do ano. O cenário nos EUA também aponta para uma possível virada na página da inflação, sinalizando um ano de redução de juros em 2024.
A situação brasileira de contas externas hoje é muito melhor do que nas crises dos anos 1970, 1980 e 1990. Temos reservas internacionais robustas, e nossa dívida externa pública é muito baixa.
O déficit externo em conta-corrente de 2023 fechou próximo de zero, bem abaixo do volume que entrou de investimento direto externo.
Temos hoje mais de US$ 350 bilhões de reservas cambiais. A grande acumulação de reservas entre 2004 e 2013 acabou aumentando a potência de intervenção do BC no mercado de câmbio via swaps ou leilões de dólar para domar a trajetória do real.
Essa posição robusta de reservas e a utilização de um regime de câmbio flutuante administrado provaram-se muito mais eficiente para nos proteger de crises.
Hoje, nossa taxa de câmbio ainda está numa posição bem desvalorizada quando levamos em consideração o que aconteceu com as outras moedas e com a inflação no Brasil e no mundo; aquilo que os economistas chamam de “câmbio real efetivo”.
Pelo padrão histórico, a tendência é que a moeda brasileira ganhe valor ao longo dos próximos anos. O Brasil está bem melhor do que países emergentes frágeis como Argentina e Turquia. Nosso grande desafio continua sendo, entretanto, gerar empregos de qualidade para mais de cem milhões de pessoas.
Sem a recuperação de nossa indústria, não conseguiremos tamanha façanha. O atual boom de produção de commodities resolve nosso problema de divisas e ajuda no controle da inflação ao contribuir para a apreciação da moeda brasileira; fica faltando ainda a essencial retomada de nosso desenvolvimento industrial e tecnológico.
Ideias-chave:
- A balança comercial brasileira registrou um enorme superávit de US$ 98 bilhões em 2023, um aumento significativo em relação aos US$ 60 bilhões do ano anterior
- A concentração das exportações foi notável, com ênfase em commodities como petróleo, soja e minério de ferro, sendo a soja responsável por quase 20% das exportações
- Esse cenário positivo na economia brasileira impulsiona o fluxo de dólares; a expectativa é que a taxa de câmbio atinja a marca de R$ 4,50 ao longo do ano, com uma perspectiva otimista para a situação cambial
- A situação das contas externas do Brasil é consideravelmente melhor do que nas crises passadas, com reservas internacionais robustas e uma dívida externa pública baixa
- Apesar dos indicadores positivos, nosso desafio central continua sendo a geração de empregos de qualidade para uma grande parcela da população. A recuperação da indústria e do desenvolvimento industrial e tecnológico é crucial para esse objetivo
Paulo Gala é economista-chefe do Banco Master de Investimento. Graduado em Economia pela FEA USP, Gala é mestre e doutor em Economia pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo, instituição em que leciona desde 2002 e na qual foi coordenador do Mestrado Profissional em Economia e Finanças, entre 2008 e 2010. Foi pesquisador visitante nas universidades de Cambridge (RU) e Columbia (NY) e atuou como economista-chefe, gestor de fundos e CEO em instituições do mercado financeiro em São Paulo.