Folha lança documentário sobre 8 de janeiro com 42 minutos. Assista aqui

Outro fato questionável foi o emprego de policiais inexperientes, ainda no curso de formação de praças (CFP) Foto: Joedson Alves/Agência Brasil

Documentário “Domingo no Golpe” relata dia de caos em Brasília

O segundo domingo de 2023 amanheceu tranquilo na capital do Brasil, Brasília. Contrariando o habitual movimento dos funcionários públicos, o silêncio dominava os prédios quase vazios da cidade. No entanto, essa calmaria foi quebrada à tarde, quando apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, vestidos de verde e amarelo, entraram em confronto com a polícia, invadiram a Esplanada dos Ministérios e promoveram vandalismo na praça dos Três Poderes.

As cenas desse caos foram capturadas por câmeras de segurança e são o cerne do documentário “Domingo no Golpe”, dirigido por Giselle Beiguelman e Lucas Bambozzi. Uma prévia de cerca de nove minutos da obra será lançada em 8 de janeiro no site do Museu da Democracia, marcando um ano do ataque. Em março, uma versão estendida será lançada para o público, coincidindo com os 60 anos do golpe militar.

Giselle Beiguelman, em declaração para o jornal Folha de São Paulo, contou que a ideia do documentário surgiu quando o GSI disponibilizou quase 800 horas de gravações mostrando a ação dos golpistas. Coordenadora do projeto Acervos Digitais e Pesquisa, Beiguelman decidiu analisar o material, percebendo seu potencial documental. “Percebi que aquilo rendia um documentário, porque estamos discutindo no projeto onde estão a memória e os arquivos na contemporaneidade e como esse acervo é distribuído”, explicou Beiguelman, artista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.

O documentário utiliza imagens de vigilância como testemunho oficial dos eventos, transformando registros que seriam descartados em documentos históricos. “Os registros revelam pontos de vista sobre Brasília que, para mim, eram inéditos. São imagens que fogem completamente da lógica monumental que se tem sobre essa região”, disse Beiguelman para a Folha de São Paulo. A produção destaca a transformação drástica da paisagem pela multidão, contrastando com a normalidade anterior.

Lucas Bambozzi, ao falar para o jornal Folha de São Paulo, comparou os registros com sinfonias de metrópole, um gênero que explora o cotidiano urbano. “As câmeras de vigilância capturam também a euforia da multidão. Esses atos se transformaram em uma espécie de domingo no parque para essas pessoas. As câmeras permitem ver, sobretudo, as nuances e os gestos que se deram ali.”

Interessante notar, como Beiguelman aponta, a quase onipresença de celulares entre os golpistas, que documentavam os atos de vandalismo, inconscientes de estarem produzindo provas contra si mesmos. “É uma compulsão pela documentação. Qualquer tomada que aparecia tinha gente carregando a bateria do aparelho”, observou Beiguelman.

O documentário também destaca a destruição de obras de arte, com 78 peças danificadas no Congresso. Beiguelman reflete sobre o significado disso: “O ódio à cultura é o pressuposto do ódio à democracia”, disse ela para a Folha de São Paulo.

Além da destruição, as câmeras também capturaram momentos de resistência democrática. “Por outro lado, o modo como colocaram rapidamente aquilo tudo em ordem novamente é um indicador de que não é tão fácil demolir uma construção que vem se fazendo desde meados dos anos 1980”, afirmou Beiguelman ao jornal.

O filme começa com a votação do impeachment de Dilma Rousseff em 2016, um evento precursor do 8 de janeiro. “Não é porque é público que você pode ir lá e fazer o que você quiser. É exatamente por se público que esse ambiente é negociado, princípio que é um dos pilares da compreensão sobre o que é a democracia”, concluiu Beiguelman.

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