A base de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro enfrenta um cenário de incerteza em 2024, sem um sucessor claro definido para as próximas eleições presidenciais, após a inelegibilidade de Bolsonaro em junho do ano passado.
Em meio a várias investigações em curso contra o ex-presidente e seus aliados, os eleitores bolsonaristas mantêm a convicção de que estão sendo alvo de perseguição, especialmente entre os mais leais, e resistem a avaliar positivamente qualquer medida do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Essas tendências foram observadas em pesquisas qualitativas realizadas ao longo de 2023 pelo Laboratório de Estudos da Mídia e Esfera Pública (Lemep) da Uerj e pelo Instituto da Democracia (INCT) com eleitores bolsonaristas. A pesquisa foi divulgada pelo GLOBO.
Durante esse período, o Lemep e o INCT acompanharam dois grupos, cada um com 18 integrantes, divididos entre eleitores que apoiaram Bolsonaro no segundo turno de 2022, mas discordaram das invasões aos Poderes ocorridas em 8 de janeiro do ano passado (considerados moderados) e aqueles que apoiaram os atos golpistas (os convictos).
Desde a inelegibilidade de Bolsonaro, a discussão sobre o futuro do bolsonarismo nos grupos monitorados aponta para nomes como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ou a ex-primeira-dama Michele Bolsonaro (PL).
No entanto, não há consenso ou entusiasmo em torno de suas possíveis candidaturas neste momento.
Os cientistas políticos Carolina de Paula e João Feres Jr., responsáveis pelo monitoramento, destacam que é comum a avaliação de que Bolsonaro seria “insubstituível”, com a expectativa de que ele possa reverter sua inelegibilidade e concorrer novamente em 2026.
Além disso, o “efeito teflon” em relação a Bolsonaro continua forte, com a narrativa de que ele está sendo alvo de perseguição por parte da esquerda e das instituições do Estado.
“Vejo isso como um complô de esquerda para denegrir a imagem do ex-presidente”, resumiu um vendedor maranhense de 32 anos, integrante do grupo de bolsonaristas moderados, ao comentar a segunda vez em que Bolsonaro foi declarado inelegível pelo TSE, em outubro.
Esse sentimento se repete quando os entrevistados são confrontados com investigações que envolvem Bolsonaro, como o caso que apura se houve desvio de joias, relógios, esculturas e outros itens de luxo recebidos pelo ex-presidente como representante do Estado brasileiro. No entanto, existem diferenças entre os perfis de eleitores.
“Os mais moderados tendem a acreditar que todos os políticos têm problemas e são mais críticos em relação à classe política em geral. Eles acreditam que todos devem ser investigados, inclusive Bolsonaro, sem partir da premissa de que ele é inocente. Já os convictos o defendem independentemente das circunstâncias”, explica Carolina de Paula.
A maneira como esses grupos consomem informações desempenha um papel central em seu comportamento.
Os eleitores mais moderados tendem a confiar mais na imprensa tradicional, ao contrário dos convictos, que preferem veículos alinhados ao bolsonarismo.
Essa segmentação mais moderada pode representar uma oportunidade para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva ampliar sua popularidade.
As pesquisas do Datafolha mostraram que a aprovação do governo Lula permaneceu estável durante o primeiro ano de seu terceiro mandato, com uma avaliação positiva de 38%. O governo busca conquistar principalmente o eleitorado evangélico.
Em dezembro, o presidente afirmou durante um evento do PT que pessoas com renda acima de dois salários mínimos já não querem votar em petistas e que a legenda não consegue ouvir e dialogar com os evangélicos.
No entanto, as pesquisas contínuas do Lemep e do INCT indicam que existe uma dificuldade na comunicação com os grupos mais próximos a Bolsonaro. A dúvida é até que ponto é possível reverter a fidelidade desses eleitores ao bolsonarismo.
“Em termos de comunicação com esse público, o governo está tendo dificuldades, mesmo entre os mais moderados. Eles são muito influenciados pelas narrativas bolsonaristas e pela forma de pensar desse grupo”, analisa João Feres Júnior. “No caso dos evangélicos, o problema não está no conteúdo, mas sim nos meios utilizados para transmitir a mensagem.”
Além disso, entre os bolsonaristas monitorados, houve poucas manifestações de apoio às ações de Lula em 2023.
Mesmo eventos positivos, como a repatriação de brasileiros durante o conflito entre Israel e o Hamas ou a iniciativa de buscar uma trégua humanitária na ONU, não geraram uma reação positiva por parte dos bolsonaristas. Há uma desconfiança em relação aos dados apresentados, incluindo a queda na taxa de desemprego.
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