A CGT (Confederação Geral do Trabalho) e outras organizações sindicais e de movimentos sociais se mobilizaram e reuniram milhares de pessoas nesta quarta-feira, 27/12, em Buenos Aires. Em um dia ensolarado, caminharam até o Supremo Tribunal para exigir a anulação do DNU (Decreto de Necessidade e Urgência) uma medida inconstitucional que o presidente de extrema-direita, anunciou há uma semana.
Desde o anuncio do mega decreto do governo, população fica indignada e sai às ruas de forma espontânea ou convocada, em todo o país. Protestos já duram vários dias e a aprovação de Javier Milei despenca. Greve Geral é convocada para janeiro. Em mais uma jornada de mobilizações, que aumentam a cada dia a tensão entre a cidadania e o governo, as confederações sindicais entregaram à Suprema Corte uma medida cautelar solicitando a suspensão do DNU, que é considerado ilegal.
Bruno Falci, de Buenos Aires, Especial para o Portal O Cafezinho
Além da poderosa confederação peronista, somaram aos protestos a CTA – Central de Trabalhadores da Argentina, o UTEP – Sindicato dos Trabalhadores da Economia Popular, a ATE- Associação dos Trabalhadores do Estado- o UEJN – Sindicato dos Funcionários Judiciais da Nação, a FOL- Frente de Organizações em Luta-, Unidade Piquetera, Polo Obrero e outros partidos de esquerda.
À tarde, quando terminou a mobilização em frente aos Tribunal Federal da Argentina, milhares de manifestantes começaram a espalhar-se nas ruas e avenidas do centro da capital. A concentração foi massiva. Várias artérias da zona da Plaza Lavalle foram cortadas pelos cidadãos durante algumas horas, derrubando, mais uma vez, as medidas repressivas da Ministra da Segurança Patrícia Bullrich, que contou com apoio de seus colaboradores do Governo da Cidade de Buenos Aires, e já pode ser considerada a “dama de ferro” da repressão política na Argentina. Assim, ela repete o sinistro papel que desempenhou durante a presidência de Mauricio Macri (2015-2019).
Na sua tentativa de aplicar o “protocolo de ordem pública” para impedir a mobilização perante o Supremo Tribunal, Bullrich delegou poderes à Polícia Municipal de Buenos Aires, que intimidava quem passava pela calçada. Agressões e espancamentos de manifestantes, que caminhavam pacificamente nas ruas, foram vistos por toda a parte.
No seu ataque violento pelas ruas circundantes, policiais espancaram jornalistas e detiveram várias pessoas, incluindo um funcionário de imprensa da ATE – Associação dos Trabalhadores do Estado. Ocorreram várias prisões arbitrárias e pessoas feridas foram conduzidas em ambulâncias para atendimento médico. Nesta quarta-feira, uma Argentina incerta, sofrida e sombria, mas ao mesmo tempo disposta lutar por suas conquistas populares, parece ter ressurgido nas ruas de Buenos Aires.
No dia seguinte, quinta-feira, 28/12, a CGT convocou uma greve geral nacional para 24 de janeiro em protesto contra as medidas econômicas e sociais recentes do governo, como o DNU. “Quarta-feira, 24 de janeiro, será o dia em que os deputados discutirão esse projeto”, disse o dirigente da confederação peronista, Héctor Daer, sobre a data escolhida.
Decreto: pobreza e repressão política
Diante da possibilidade de um veto parlamentar, Milei ameaçou submeter o DNU a uma consulta popular. O megaprojeto, que o Governo apresentou esta quarta-feira, na Câmara dos Deputados, dedica várias páginas à repressão ao protesto social, que crescerá devido aos efeitos devastadores do ajustamento econômico. O texto, de 351 páginas e 664 artigos, tem um objetivo central. Ao pedir ao Congresso que declare uma “emergência pública em questões económicas, financeiras, fiscais, previdenciárias, de segurança, de defesa, tarifárias, energéticas, de saúde, administrativas e sociais até 31 de dezembro de 2025”, o governo Milei procura criar as ferramentas formais para ser capaz de ditar leis sem debate legislativo.
Em matéria de segurança, o texto de Milei e de ministros como Patrícia Bullrich propõe “um regime de organização de manifestações” que permita, segundo eles, “garantir a livre circulação e o desenvolvimento normal das atividades económicas e laborais de todos os países”. O megaprojeto presidencial propõe a reforma do Código Penal com aumento das penas contra os manifestantes. Inclui a exigência de que se três ou mais pessoas se reunirem em espaços públicos, tenham de pedir autorização ao Ministério da Segurança. Além disso, amplia o leque de pretextos para os policiais atirarem sem fazer perguntas.
Longe de estabelecer diretrizes para atender às demandas trabalhistas, sociais, ambientais ou indígenas, o projeto busca garantir que ninguém seja incentivado a protestar. Sua implementação é duvidosa, visto que a Constituição estabelece que o Poder Executivo só pode convocar referendo não vinculativo.
Greve nacional à vista
A mobilização teve início às 11 horas, na Plaza Lavalle, onde fica a Suprema Corte de Justiça da Nação (CSJN). Também houve manifestações em outros pontos da cidade de Buenos Aires e nos subúrbios, que afetaram as rotas de ônibus.
As lideranças máximas da CTA – Central dos Trabalhadores Argentinos- estiveram presentes na manifestação junto com a CGT para rejeitar o mega DNU de Javier Milei, e anteciparam que, nos dias seguintes, definirão a data de uma greve nacional com mobilizações em todo o país contra as políticas de ajuste do novo governo.
Todos marcharam como um bloco independente. O protesto foi conduzido sob os seguintes lemas: greve ativa nacional e plano de luta; abaixo o DNU e o protocolo repressivo antipiquete, não ao plano de ajuste de Milei e do FMI, sem demissões. A direção da Central nacional apresentará recursos ao Poder Judiciário, tentando fazer com que seja anulado ou questionado aspectos do mega decreto.
A CTA Autónoma e a CTA dos Trabalhadores; o Sindicato dos Trabalhadores da Economia Popular (UTEP); a Associação dos Trabalhadores do Estado (ATE) e a Frente de Organizações em Luta (FOL), participaram da marcha, que teve como epicentro a Plaza Lavalle, em frente aos Tribunais – onde fica o Supremo Tribunal de Justiça da Nação. Uma das reivindicações centrais é uma greve nacional e um plano de luta até que o mega DNU e o ajustamento de Milei sejam derrotados.
Operação policial sequestra ônibus
Num acontecimento típico de ditadura militar, uma operação da Polícia Federal comandada pela ministra da Segurança, Patricia Bullrich, deteve um ônibus no qual viajavam representantes de diversas organizações, entre elas o líder sindicalista Carlos Santillán, que vinham de Jujuy para a mobilização convocada pela CGT e foram impedidos de se deslocar em direção à cidade de Buenos Aires, onde o sindicalismo combativo e a esquerda caminharam aos tribunais contra o mega DNU de Milei. O grave incidente ocorreu no pedágio de Campana, Havia 45 pessoas no ônibus.
“Infelizmente nos pararam em Zárate-Campana. A Gendarmaria disse que faltava um pedaço de papel no ônibus. Queríamos descer, mas não deixaram. Isso me lembra muito de a ditadura ou os tempos em que ela vigorou, o estado de sítio na Argentina”, disse Santillán em declarações à Rádio 10.
Em Janeiro novos protestos foram convocados e uma greve geral de 24 horas. A tensão entre o governo e a cidadania segue escalando em a Argentina caminha para um futuro incerto.