Cidade registra desde 2018 rachaduras e tremores de terra, e milhares já tiveram que deixar suas casas. Prefeitura diz que cratera pode surgir a qualquer momento, e governo reconhece estado de emergência.
Atualizado em 09/12/2023
DW — Os moradores de Maceió estão se preparando para uma possível tragédia: o colapso iminente de uma mina de sal-gema da Braskem.
O solo no local já afundou 2,16 metros desde o dia 30 de novembro, segundo dados atualizados divulgados neste sábado (09/12) pela Defesa Civil. A área segue instável, com variações no ritmo de afundamento, que ora acelera, ora desacelera. No início do mês, a velocidade era de 0,26 centímetro por hora; agora, após um período de diminuição, voltou a afundar mais depressa, a 0,35 centímetro por hora.
“Por precaução, a recomendação é clara: a população não deve transitar na área desocupada até uma nova atualização da Defesa Civil, enquanto medidas de controle e monitoramento são aplicadas para reduzir o perigo”, reforçou o órgão em nota.
Após tremores terem sido registrados na região, os moradores foram obrigados a deixar suas casas às pressas – mesmo que sob força policial.
A Defesa Civil decretou alerta máximo, informando na ocasião que um colapso da mina 18, no bairro do Muntage, poderia ocorrer a qualquer momento, e que esse episódio poderia provocar a abertura de uma cratera de 78 metros de diâmetro – três vezes o raio da mina.
Moradores da região protestaram pela remoção ter sido determinada em cima da hora e com falta de clareza sobre quais serão os próximos passos e se eles receberão indenização da empresa.
Um hospital no bairro Pinheiro, vizinho ao Mutange, também foi evacuado como precaução. A cidade está em situação de emergência, com reconhecimento do governo federal, e deve, por isso, ter acesso simplificado a verbas federais.
Como o problema começou
O risco apresentado pelas minas de sal-gema em Maceió já é conhecido há vários anos.
O minério, utilizado para a produção de soda cáustica e PVC, começou a ser extraído da região no final da década de 1970, pela então Salgema Indústrias Químicas S/A, em minas localizadas a cerca de 1.200 metros abaixo da superfície.
Para retirar o minério, a empresa injetava água na camada de sal e extraía a salmoura resultante. Depois, reinjetava líquidos no local para estabilizar o solo. Porém, as minas apresentaram vazamentos.
Em 2018, grandes rachaduras começaram a aparecer no bairro do Pinheiro e tremores de terra foram registrados. No ano seguinte, um órgão do governo federal, o Serviço Geológico do Brasil, confirmou que as minas de sal-gema estavam provocando a instabilidade.
Há, no total, 35 minas na capital alagoana, que foram desativadas em 2019.
Desde junho de 2019, mais de 14 mil imóveis de cinco bairros de Maceió tiveram que ser desocupados devido à instabilidade do solo, criando ruas fantasmas onde antes moravam 55 mil pessoas.
A Braskem vem realizando intervenções para tentar estabilizar as cavernas criadas para extração do minério, mas, em novembro, cinco tremores de terra foram registrados na região.
Qual é o risco no momento
Autoridades locais avaliam que há grande chance de a mina 18, no bairro do Mutange, colapsar a qualquer momento.
O prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, afirmou à emissora CNN Brasil que, na manhã desta sexta-feira, a região estava afundando cerca de 5 centímetros por hora. Ele falou que a cidade está próxima de viver “a maior tragédia urbana do mundo em curso”.
A mina 18 fica parte sob a lagoa Mundaú e parte sob o bairro do Mutange. A Defesa Civil estima que, no momento em que a mina ceder, uma cratera deverá ser criada e preenchida com águas da lagoa.
É possível também que toda a cidade de Alagoas sinta um tremor de terra no momento do colapso. Mas, segundo o órgão, a magnitude do tremor não deve afetar prédios com estruturas saudáveis.
Como a Braskem se posiciona
A Braskem afirmou em nota que reconhece o crescente risco no local e afirma estar tomando todas as medidas cabíveis para reduzir seu impacto, e que segue monitorando e compartilhando os dados com as autoridades.
Segundo a empresa, os dados atuais de monitoramento demonstram que a acomodação do solo segue concentrada na área dessa mina e que essa acomodação poderá ocorrer de forma gradual até a estabilização ou de maneira abrupta.
A empresa vem indenizando os moradores obrigados a se realocar, nos termos de um acordo assinado em janeiro de 2020 com Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado de Alagoas, Defensoria Pública da União e Defensoria Pública do Estado de Alagoas.
Segundo a Braskem, em outubro, 17.828 indenizações já haviam sido pagas, e o montante desembolsado em indenizações e auxílios financeiros somava R$ 3,85 bilhões.
Devido à crise em Maceió, a Braskem anunciou nesta segunda-feira que cancelou sua participação na Conferência do Clima, COP28, em Dubai. Representantes da empresa participariam de ao menos dois painéis na Conferência.
“Nos últimos dias, diante do agravamento da crise de Maceió, [a Braskem] achou melhor cancelar sua participação em alguns painéis para evitar que o assunto sobrepujasse quaisquer outras discussões técnicas, dificultando eventuais contribuições que a empresa pudesse oferecer”, afirmou a empresa em nota.
Empresa multada
O Instituto do Meio Ambiente do Estado de Alagoas (IMA-AL) decidiu multar a Braskem em mais de R$ 72 milhões por omissão de informações, danos ambientais e pelo risco de colapso e desabamento da mina 18. A entidade afirma que desde 2018 já autuou a empresa em 20 ocasiões.
A primeira multa, no valor de R$ 70.274.316,34, diz respeito à degradação ambiental decorrente de atividades que, direta ou indiretamente, afetam a segurança e o bem-estar da população e geram condições desfavoráveis para as atividades sociais e econômicas.
O IMA caracterizou a nova ocorrência de colapso da mina como reincidência, uma vez que um estudo anterior realizado pela entidade já havia constatado dano ambiental na região da mina 18.
“Além dessa autuação, a Braskem vai responder também pela omissão de informações sobre a obstrução da cavidade da mina 18, detectada no dia 7 de novembro de 2023, quando a empresa realizou o exame de sonar prévio para o início do seu preenchimento”, informou o instituto.
A realização do exame de sonar estava em desconformidade com a licença de operação da empresa, o que resultou na aplicação de uma multa de R$ 2.027.143,92.