Hoje marca o início do primeiro mandato do Brasil como presidente rotativo do G20, um consórcio composto pelas principais economias globais, juntamente com a União Europeia e a União Africana. Esse grupo foi estabelecido em 1999 como resposta à crise financeira asiática. Com uma responsabilidade de um ano, a meta do Brasil é impulsionar três prioridades fundamentais: a luta contra a fome, a pobreza e a desigualdade; o avanço do desenvolvimento sustentável; e a reforma da governança global. Com informações do O GLOBO.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva instruiu de maneira clara os diplomatas encarregados da coordenação das 130 reuniões programadas para ocorrerem nas cinco regiões do país a partir de dezembro. Como país anfitrião, o Brasil tem a incumbência de apresentar projetos tangíveis com impacto direto na vida das pessoas. Uma das propostas já elaboradas consiste no lançamento de uma aliança global contra a fome.
“Na visão do Brasil, a fome deve estar no centro da agenda internacional e deveria causar indignação, como disse o presidente Lula”, diz o embaixador Mauricio Carvalho Lyrio, secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros e sherpa (representante do chefe de Estado nas reuniões) brasileiro.
Lyrio destaca que atualmente 750 milhões de pessoas enfrentam a fome crônica globalmente, enquanto 2 bilhões têm acesso irregular a alimentos. O governo brasileiro não pretende limitar-se a meras declarações de boa vontade que exigem consenso. O presidente Lula tem a expectativa de encerrar seu mandato na presidência brasileira durante o encontro presidencial marcado para os dias 18 e 19 de novembro de 2024, no Rio de Janeiro, deixando um legado tangível na vida das pessoas.
Representação para o Sul Global
O Brasil almeja o início de uma nova fase de colaboração e interação nos organismos multilaterais, visando conferir maior influência aos países do Sul Global. Simultaneamente, espera-se um aumento significativo na assistência financeira destinada a essas nações para a implementação de programas sociais e a consecução de metas estabelecidas. O sherpa brasileiro ressaltou que não é suficiente contar com doadores, sendo essencial elaborar programas sociais eficazes.
— O governo brasileiro tem como eixos centrais a redução das desigualdades, a mobilização contra a mudança do clima e a transição energética dos países — afirma o embaixador.
A agenda de trabalho a ser conduzida pelo Brasil no próximo ano abrange inovações, como uma reunião ministerial dedicada ao empoderamento feminino. Além disso, a reforma da governança global é um dos temas centrais da presidência brasileira, buscando fortalecer organizações como as Nações Unidas e torná-las mais eficientes, conforme explicado por Lyrio.
“O G20 ganhou importância pela dificuldade de ação de outras organizações e deve ser palco para promover, por exemplo, uma reforma da ONU. As organizações multilaterais, como declarou o presidente Lula, não estão adequadas do ponto de vista da capacidade de representação e de ação. Sem uma ONU forte é mais difícil alcançar a paz”, enfatiza o embaixador.
O G20 foi inicialmente concebido como um fórum destinado a ministros das Finanças e governadores de Bancos Centrais. No entanto, em 2008, após a crise financeira global desse ano, foi incorporada a chamada Trilha de Sherpas, composta por emissários dos chefes de Estado e governo. Nesse contexto, também se discute uma agenda política mais abrangente.
Trabalho em sintonia
A Trilha de Finanças, estabelecida desde 1999, atualmente opera em paralelo à Trilha dos Sherpas. Na presidência brasileira, ocorrerá, pela primeira vez no início do mandato, uma reunião entre ambas as trilhas, enquanto anteriormente esse encontro ocorria nos últimos meses de trabalho. De acordo com as fontes consultadas, Lula advoga pela aproximação das duas trilhas, buscando criar um ambiente de sintonia entre os grupos, garantindo assim que ambos trabalhem em consonância com os mesmos objetivos.
As primeiras reuniões presidenciais terão lugar em Brasília, iniciando-se em 11 de dezembro. Além dos representantes dos países-membros, o evento contará com a presença de oito convidados especiais e 12 organismos internacionais, incluindo o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial.
“Este será um G20 de austeridade, porque são tempos de austeridade. Foi uma instrução do presidente Lula”, conta Carlos Villanova, coordenador nacional de logística do G20.
Ele está encarregado de uma esfera complexa da presidência brasileira. Ao longo de 12 meses, serão realizadas 30 reuniões virtuais, 25 em Brasília, 50 encontros de grupos de trabalho em diversas regiões do país, 20 reuniões ministeriais e um encontro presidencial. Em fevereiro, está programada uma reunião de ministros da Fazenda em São Paulo, seguida por um encontro de chanceleres no Rio de Janeiro.
Além dos encontros oficiais, há também a agenda dos grupos de engajamento, que aumentarão de 9 para 12. Esses são entidades da sociedade civil que gravitam em torno do G20, e o presidente Lula busca aprofundar a relação com esse conjunto de organizações.
Na perspectiva do embaixador Rubens Barbosa, a presidência brasileira “deve focar nos três pontos principais já anunciados”. Ele destaca que “o Brasil não tem força para influir em temas militares, mas temos força para influir nessas áreas em que somos uma potência. Alimentos, combate à desigualdade, defesa do meio ambiente e transição energética”.
“A luz do mundo estará voltada para o Brasil, e o Brasil tem que ter ideias concretas sobre o que temos de defender”, diz Barbosa.
“O mundo mudou”
Ele destaca a importância de progredir no projeto de reforma da governança global:
“Os países em desenvolvimento têm o que reclamar. A governança global nasceu após a Segunda Guerra, e o mundo mudou. Existem outros centros de poder. O Brasil vai defender mudanças no FMI, na Organização Mundial do Comércio, na ONU… Estão todos emperrados, sem funcionar direito”
O país anfitrião do G20 no próximo ano busca evidenciar seus avanços na transição energética e reforçar a solicitação para que as nações mais desenvolvidas cumpram os compromissos assumidos em negociações internacionais, reconhecendo os esforços já realizados por outras nações, incluindo o Brasil.