YouTube derruba o programa de Leandro Demori, regulamentação das redes é essencial para combater a censura

“Em terra de cego não existe lei, quem tem dois olhos é mal visto porque quem tem um é rei.”

Oriente – Terra de Cego [1]

Direto ao ponto: “terra de cego” é a atual condição da internet e das redes sociais no Brasil; “cegos” somos nós que vivemos esse faroeste caboclo digital; “quem tem dois olhos” também somos nós, mas em uma condição especial onde já entendemos a lógica perversa do chamado “neo-feudalismo hightech”; e quem tem apenas “um olho” mas se comporta como rei é justamente o senhor feudal.

Em tempos onde a pós-verdade nos é enfiada goela abaixo, é nosso dever trazer à tona diversos temas essenciais que volta e meia ganham a mídia e da mesma maneira saem dela.

Agora falo da PL 2630/2020, popularmente chamada de PL das Fake News, que se tornou ainda mais famosa quando gigantes como o Google e o Telegram acharam que seria de bom tom usarem seus poderes de senhorio para tentar influir diretamente na política brasileira. Em uma campanha clara contra a PL e com evidente abuso de poder econômico para fins políticos, acertaram em cheio, deixando claro a necessidade e a urgência da PL.

A PL tem a proeza de conseguir unir gigantes “globalistas” e os maiores nomes do “anti-globalismo” no Brasil, todos juntos, armados ou não, cantando uma antiga lição: em defesa da “liberdade de expressão”, inclusive para tráfico de órgãos, trabalho infantil e para a criação e desenvolvimento de um partido nazista.

O que estes “globalistas” (gigantes da tecnologia como Alphabet, Meta, X, etc.) e os autoproclamados “anti-globalistas” (Bolsonaro e seus seguidores são apenas um exemplo) têm em comum? Ambos querem manter essa terra sem lei, o povo cego, e caçar e silenciar quem ousar ter dois olhos. O atrito que volta e meia se vê entre eles é mais como uma competição pelo mesmo prato do que um embate de fato.

Mas no fim, tanto Bolsonaro e sua trupe golpista como o neo-feudalismo hightech querem a mesma coisa: nos deixar cegos, inviabilizando, dificultando e contaminando nossa política, mais especificamente tornando-a inerte e infértil, inútil. Eles não precisam fazer nada, basta que não deixem que nós façamos. Não podemos pedir cotas, não podemos pedir assistência social digna, não podemos jamais pedir uma reestatização da Vale, não podemos pedir nem mais direitos humanos, e agora também não podemos pedir um ambiente digital que valorize a cidadania, fortaleça a democracia, incentive a cultura e impacte positivamente nossa economia.

Um país que permite que essas empresas de tecnologia façam o que bem entenderem quando bem entenderem não pode se chamar soberano. Agora, quem controla a forma como a mídia se comporta, que conteúdo o consumidor terá acesso e até a forma como a própria cultura brasileira está se definindo é um minúsculo grupo de empresários do Vale do Silício.

É o que aconteceu novamente com o jornalista Leandro Demori do Instituto Conhecimento Liberta, ICL. Já é a terceira vez que Demori é censurado no YouTube.

A função social que as redes têm em nossa sociedade atualmente é do mesmo nível que a da moeda nacional, do idioma oficial, da distribuição energética brasileira, etc., e com tal importância deve ser tratada. O Estado não pode, de maneira nenhuma, ficar de braços cruzados apenas assistindo a criação de um monstro.

As tentativas dessas empresas de influenciar os rumos de nossa política nacional dão uma pequena amostra do perigo que elas podem se tornar se não tivermos a coragem de enfrentarmos esse problema de frente. Só pelo fato de termos esse medo evidencia novamente nossa atual situação de submissão frente a isso.

Um povo sem controle de seu algoritmo, sem controle de sua plataforma de streaming, sem controle de sua rede social, é também um povo sem soberania, é um povo que vive em um estado de constante censura e muitas vezes sem ao menos perceber isso, o que aprofunda ainda mais a situação.

No poder de controle não há vácuo. Se a democracia progressista não ocupar esse espaço, outra o ocupará, seja uma oligarquia, autocracia ou mesmo cartéis e conglomerados comerciais, muitas vezes a serviço de autocracias.

Um órgão supremo de justiça de um país que é um gigante continental, com uma força trabalhadora de 100 milhões de pessoas, suspendeu a monetização de um canal no YouTube de um influenciador que pedia a liberdade de ter um partido nazista funcionando no Brasil. Isso não é censura.

Censura é quando um jornalista brasileiro de alto nível tem seu programa inteiro cancelado pela terceira vez por uma plataforma digital de forma arbitrária. Essa plataforma é de uma empresa com fins lucrativos sediada em outro país que certamente tem seus financiadores e seus próprios interesses econômicos e políticos. Já vimos que esses interesses incluem nos manter na eterna cegueira, numa terra sem lei.

Fontes:

[1] https://www.youtube.com/watch?v=aukM3HJ5IGU
[2] https://www.ihu.unisinos.br/categorias/624330-a-nova-comunicacao-e-o-poder-total-das-big-techs
[3] https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/141944
[4] https://www.bbc.com/portuguese/internacional-46786314
[5] https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2022/02/08/podcaster-monark-partido-nazista.htm
[6] https://x.com/demori/status/1730249094650531965?s=20

Matheus Winck:
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