O potássio é o mineral de maior dependência no campo dos fertilizantes, e sua exploração em Autazes teve um capítulo de vitória no mês de setembro: aprovação de 34 aldeias dos Mura.
Publicado em 22/11/2023 – 16h26
Por Mara Paraguassu
Mara Paraguassu — A dependência em 90% de fertilizantes importados leva o grande motor do Brasil, o agronegócio, ao risco de ficar sem combustível. A constatação é de Bernardo Silva, presidente do Sindicato das Indústrias de Matérias Primas para Fertilizantes, que na Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado, na terça-feira, 21, participou de mais um debate sobre a urgência de reverter no país a dependência de importação do chamado NPK (nitrogênio, fosfato e potássio).
“A indústria nacional está perdendo cada vez mais espaço num setor que vem crescendo exponencialmente. Nos últimos 25 anos a gente vê a explosão de exportação de fertilizante no mundo em mais de 600% enquanto a produção nacional se mantem estagnada ao longo das últimas décadas,” alertou Bernardo. A situação hoje coloca em risco a segurança alimentar no país.
Ele avalia que parceiros do Brasil envolvidos em conflitos como a Bielorrussia, Rússia e Israel colocam o país em posição de vulnerabilidade não só política, mas também econômica, e nada garante, afirmou, que outras crises na atual conformação da geopolítica não irão escalar.
Ele apresentou slides com pontos necessários para reverter a situação, algo que o sindicato já vem trabalhando no Congresso e no governo federal. Um deles é a implementação do Plano Nacional de Fertilizantes, lançado em 2021, e que foi cobrado por outros debatedores na Comissão de Serviços de Infraestrutura, presidida pela senadora Teresa Cristina (PP-MS).
No site do governo, no preâmbulo ao Plano, se diz que “o GTI-PNF envidou esforços para construir um benchmarking internacional, um diagnóstico nacional e uma visão de futuro para a cadeia de fertilizantes e nutrição de plantas do Brasil em torno de 6 linhas de ação: Nitrogênio, Fósforo, Potássio, Cadeias Emergentes, CT&I, Sustentabilidade Ambiental. É importante registrar que a produção desses documentos movimentou cerca de 290 pessoas, de 91 órgãos/entidades/empresas, em 68 reuniões de trabalho.”
Em que pese a conclusão do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) o Plano está pendente de implementação observou o diretor-geral da Agência Nacional de Mineração, Mauro Sousa. Ele e os demais debatedores enfatizaram ser uma questão de Estado colocar de pé o Plano, para que o país ao menos reduza a dependência, maior do mundo segundo os presentes. Um dos diversos exemplos dados, o dos Estados Unidos, chega a 24% a dependência de importação de fertilizantes.
Mauro Sousa abordou uma situação crítica na condução de projetos de mineração requeridos ao governo por meio de órgãos competentes, criticando o enorme contencioso que é patrocinado por meio de liminares e mais liminares numa atuação casada entre Ministério Público e Justiça, perdendo-se tempo e recursos, “o país vivendo com a incerteza do licenciamento.”
Ele disse que existe uma tendência contenciosa no sistema. Cita especialmente a exploração de potássio, há sete anos num processo dispendioso, prejudicial não somente ao empreendimento mas especialmente ao Brasil, vivido pelo Projeto Potássio Autazes, a pouco mais de 100 quilômetros da cidade de Manaus, capital do Amazonas.
Ali há um jogo de vai e vem entre competências de licenciamento, estadual e federal, o que atrasou todo o projeto. “Vamos chegar ao STJ daqui a uns 15 anos e o investimento fica como? O sistema judicial não olha a Constituição na direção de promover o desenvolvimento. O país está disfuncional. O país que quer crescer não pode viver com a incerteza de licenciamento, incerteza de aplicação de determinadas normas e com um MPF e judiciário cada vez mais impondo decisões a cada vez mais que fazem com que o país não se desenvolva e não exercite a sua soberania e até a sua geopolítica,” alertou Mauro.
O potássio é o mineral de maior dependência no campo dos fertilizantes, e sua exploração em Autazes teve um capítulo de vitória no mês de setembro: em consulta, 34 das 36 aldeias dos Mura aprovaram a exploração.
“Este projeto é importante para nós, precisamos da empresa para desenvolver a região. Temos produção de mandioca, farinha, temos terras férteis, mas precisamos de algo que ampare a produção, temos dificuldade de escoar a produção. O povo indígena tem autodomínio, não aceitamos tutela,” disse Kleber Almeida Prado, presidente do Conselho Indígena Mura.
“Estou otimista com o Projeto Potássio Autazes, porque só vai beneficiar nosso povo, nossa região, vai ajudar muito o desenvolvimento de Autazes,” disse Kleber.
O ex-advogado geral da União, Luís Adams, advogado da empresa Potássio Brasil, parabenizou a fala de Kleber Prado e disse: “Existe uma lógica protecionista que engessa a possibilidade de beneficiar as comunidades indígenas na Amazônia. O que assistimos em Autazes é claramente uma ação de obstrução desenvolvimentista, não estão pensando na comunidade.”
Ele referiu-se ao fato do Ministério Público só entrar com ação para demarcação de reserva indígena na região quando a Potássio Brasil pediu licenciamento para a instalar a Potássio Autazes, um empreendimento que já dispendeu 230 milhões de dólares em pesquisa mineral, sondagens geológicas, aquisição sísmica, licenças e estudos ambientais, aquisição de terras etc., segundo informou o presidente da Potássio do Brasil, Adriano Espeschit.
Atualmente em fase de licenciamento ambiental, com instalações já sendo providenciadas, a Potássio Autazes implantará um porto fluvial na margem esquerda do rio Madeira, em local denominado Urucurituba. A usina de concentração terá a capacidade de beneficiar 8,5 milhões de toneladas de minério ao ano e produzir 2,2 milhões de toneladas de cloreto de potássio granulado por ano.
“Será instalada em área tradicionalmente ocupada por pastagens, não precisa suprimir floresta nativa, que será revitalizada da usina de concentração até o porto na margem do Madeira,” disse Espeschit.
O empreendimento construirá 160 linhas de transmissão de energia que beneficiará 200 mil moradores de municípios situados à margem direita do Amazonas. “Hoje a energia é de gerador, poluente, não tem conexão com o sistema nacional,” explicou.
O representante do Ministério da Indústria e Comércio Bruno Abreu Caligaris disse que 8% do consumo mundial de fertilizantes é feito pelo Brasil, e que a partir de 2020 o país começou a “traçar estratégias para mitigar a vulnerabilidade em relação aos fertilizantes.”
Em gráfico apresentado por ele, a partir de 2006, a importação e a produção são equilibradas em poucos anos, depois vai uma crescente diferença até 2022. Ano em que, segundo Bruno, o país consumiu 42 milhões de toneladas de fertilizantes, 33 milhões deles importados.
“O cenário médio para 2050 é de que tenhamos consumo de 60 milhões de toneladas para o Brasil. E o custo hoje para o produtor rural importa muito por conta de questões logísticas, o que acaba também onerando no consumo de alimentos,” disse Bruno.
Para ele, a logística do Brasil não dará conta dessa produção estimada chegar aos produtores, observando ainda que o Brasil é um dos poucos do mundo que faz de duas a três safras anualmente. “Então é importante ter isso como análise,” diz.
Bruno Caligaris disse haver pouca empresa produzindo no Brasil, refém do mercado mundial. O Plano Nacional de Fertilizantes busca um equilíbrio, ao menos reduzir para 50% a dependência, lançando mão de diversas estratégias, inclusive diversificar exportação, e atuar na inovação, conceber alternativa ao mineral clássico.
Hoje, a única produção nacional de potássio é no Sergipe, e para o representante do Ministério da Industria é possível “casar a incidência de potássio no Amazonas, com a logística e a produção agrícola do Centro-Oeste.” Ele concorda também que para a segurança alimentar e soberania é preciso avançar em um plano que garanta uma plataforma de indústria de fertilizantes no país.
Sobre custo, Bernardo Silva disse que outra medida que precisa ser revertida é na tributação. O Brasil tributa mais a produção nacional do que a importação – precisa garantir isonomia tributária aos produtores nacionais e oferta de competitividade aos produtores nacionais frente aos concorrentes importadores. “Há subsídio à importação. Nenhum outro pais do mundo faz isso,” afirmou.
O aprimoramento do conhecimento geológico e a garantia de agilidade, transparência e segurança no licenciamento ambiental da exploração mineral do país, não apenas há dificuldade na Potássio do Brasil mas outros projetos tem o mesmo problema, é o outro ponto levantado por Bernardo para se trabalhar. “Não só se conhece pouco o que tem embaixo da terra, e o que tem conhecido precisa explorar com a agilidade necessária e menor custo.”
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