Com voto de Luiz Fux, STF formou maioria contra tese do marco temporal
Publicado em 21/09/2023 – 16h32 | Atualizado em 21/9/2023 – 19h05
Por Sérgio Rodas
Conjur — O Plenário do Supremo Tribunal Federal invalidou, nesta quinta-feira (21/9), a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. A tese será definida na sessão da próxima quarta (27/9).
Nove ministros votaram contra o marco temporal, em respeito à tradição das terras indígenas: Edson Fachin, relator do caso; Alexandre de Moraes; Cristiano Zanin; Luís Roberto Barroso; Dias Toffoli; Luiz Fux; Cármen Lúcia; Gilmar Mendes; e Rosa Weber. Os ministros Nunes Marques e André Mendonça divergiram por considerar que a definição aumentaria a insegurança jurídica.
Na sessão desta quinta, o ministro Luiz Fux apontou que a melhor interpretação da Constituição é a que estabelece que as terras indígenas, ainda que não demarcadas em 5 de outubro de 1988 — data de promulgação da Carta Magna —, precisam de proteção.
“Ainda que não tenham sido demarcadas, essas terras devem ter a proteção do Estado. Essa, no meu modo de ver, é a interpretação mais correta da Constituição. Muito já se disse aqui. Trago no meu voto essa interpretação finalística do artigo 231 que assenta que são reconhecidas aos índios as terras que tradicionalmente ocupam”, afirmou Fux.
Também contrária ao marco temporal, a ministra Cármen Lúcia destacou que a sociedade brasileira tem uma dívida “impagável” com os povos originários. “Estamos a cuidar da dignidade étnica de um povo que foi dizimado, oprimido durante cinco séculos de história”, declarou a magistrada.
O decano do STF, Gilmar Mendes, seguiu o voto do ministro Dias Toffoli. Ou seja, pela rejeição ao marco temporal, mas ordenando que o processo volte para a primeira instância para ser reanalisado com a tese fixada pelo Supremo.
A presidente do STF, Rosa Weber, ressaltou que o artigo 231 da Constituição reconhece os direitos dos indígenas às terras que tradicionalmente ocupam e exige que a União demarque e proteja tais áreas.
No fim de maio, a Câmara dos Deputados aprovou o marco que limita a demarcação de terras indígenas. De acordo com o texto — ainda sujeito a alterações pelo Senado —, a demarcação será restrita às terras já ocupadas por esses povos em 5 de outubro de 1988.
O processo que motivou a discussão no STF trata da disputa pela posse da Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, em Santa Catarina. No local vivem indígenas Xokleng, Guarani e Kaingang, e o governo catarinense entrou com pedido de reintegração de posse. Hoje existem mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas abertos em todo o território nacional.
Idas e vindas
Relator do recurso extraordinário com repercussão geral, o ministro Edson Fachin votou em 2021 contra o marco temporal. De acordo com o magistrado, os direitos originários dos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam não dependem da existência de uma delimitação.
O ministro Kassio Nunes Marques abriu a divergência argumentando que a proteção constitucional das terras indígenas depende do marco temporal. Conforme o magistrado, os povos originários devem comprovar que ocupavam a área em 5 de outubro de 1988 ou que tenham sido expulsos dela. Sem essa limitação, há insegurança jurídica, disse o ministro.
Em voto-vista apresentado em junho, o ministro Alexandre de Moraes opinou que a fixação de um marco temporal viola direitos fundamentais dos indígenas.
Ele ressaltou que o Estado deve indenizar quem, de boa-fé, comprou terra indígena. Afinal, nessa situação a culpa é do poder público, que não arcou com o dever de proteger as áreas pertencentes aos povos originários.
Em voto-vista apresentado em 30 de agosto, o ministro André Mendonça seguiu Nunes Marques pela validade da tese do marco temporal. O magistrado apontou que os constituintes de 1988 estabeleceram um marco para a demarcação de terras indígenas com o objetivo de pacificar conflitos.
“Não se trata de negar as atrocidades cometidas, mas antes de compreender que o olhar do passado deve ter como perspectiva a possibilidade de uma construção do presente e do futuro. Entendo eu que essa solução é encontrada a partir da leitura do texto, e a intenção do constituinte originário foi trazer uma força estabilizadora a partir da sua promulgação”, disse Mendonça.
O ministro opinou que o Supremo não pode, 14 anos depois, alterar o entendimento fixado no julgamento do “caso Raposa Serra do Sol” (Pet 3.388). Na ocasião, a corte entendeu que as populações indígenas tinham direito às terras que ocupavam na data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988, ou seja, o marco temporal que agora está em discussão.
Caso o STF mudasse de entendimento, avaliou o ministro, permitiria discussões que remeteriam a “tempos imemoriais”, gerando insegurança jurídica.
No dia seguinte, os ministros Cristiano Zanin e Luís Roberto Barroso votaram contra a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas.
Para Zanin, as populações indígenas têm direito às terras que tradicionalmente ocupam desde o Império e, em sede constitucional, desde a Constituição de 1934.
“O constituinte de 1988, ao reconhecer o direito originário sobre as terras tradicionalmente ocupadas, determinou à União a demarcação como ato meramente declaratório. Ao admitir tais direitos como originários, a Constituição os admitiu como direitos mais antigos do que qualquer outro, de modo a preponderar sobre pretensos direitos adquiridos, ainda que materializados em escrituras públicas ou títulos de legitimação da posse”, disse o ministro.
Já Barroso apontou que a tradicionalidade e a persistência da reivindicação de terras por indígenas, mesmo que eles não vivessem nelas na data da promulgação da Constituição, “constituem fundamento de direito para as comunidades indígenas”.
“A Constituição de 1988 protege a identidade cultural dos povos indígenas e assegura o direito à terra à luz de sua cultura, não tendo em vista os comportamentos e conceitos da sociedade dominante”, afirmou o ministro.
O ministro Dias Toffoli votou nesta quarta (20/9) contra o marco temporal.
“A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal, em 5 de outubro de 1988, ou da configuração do renitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente à data da promulgação da Constituição”, afirmou Toffoli.
O magistrado também entendeu que o procedimento de apuração da indenização a ser paga pela perda da terra que foi declarada indígena deve correr em paralelo ao processo de demarcação. O objetivo é evitar a demora na regularização da área tradicional.
Tony
21/09/2023 - 20h04
Basta ter o português básico da quinta série para entender claramente que a Constituição diz que se refere as terras que os índios ocupam naquele dia. Neste raro caso a constituição está escrita num português claro que não necessita de nenhuma interpretação.
Bastava também pergunta a quem lá estava quando foi escrita a Constituição e ainda está vivo.
É claro que está enésima bananice trará mais insegurança jurídicas, brigas por terra, mortes ecc…
Terceiro Mundo.