Por Jeferson Miola
A PEC – Proposta de Emenda Constitucional do ministério da Defesa e Forças Armadas é lastimável. Representa uma reversão das expectativas mínimas sobre a necessidade urgente de se promover uma reforma militar no Brasil.
Além de não eliminar totalmente a hipótese de atuação política e partidária dos fardados, a PEC ainda mantém intacto o famigerado artigo 142 da Constituição, aquele que embasa a interpretação delirante sobre o Poder Moderador dos militares e a tutela deles sobre a democracia.
É, portanto, um arremedo que distrai a atenção sobre o essencial, ao mesmo tempo em que preserva a perspectiva estratégica das cúpulas conspiradoras e partidarizadas das Forças Armadas.
Caso, contudo, venha a prevalecer a opinião do senador Jaques Wagner, líder do governo no Senado, a PEC ficará ainda pior.
Ele é a favor da liberalização total. Defende que militares da ativa possam ocupar postos de ministros de Estado permanecendo no serviço ativo da carreira, o que significa que eles podem governar mantendo, simultaneamente, tropas sob seu comando.
O texto original da PEC, que já é ruim e insuficiente, mas que Wagner pode piorar ainda mais, pelo menos determinava que “ao tomar posse no cargo de Ministro de Estado, o militar da ativa das Forças Armadas fica, automaticamente, transferido para a reserva, nos termos da lei”.
A mudança proposta por Wagner significa inclusive um retrocesso em relação ao disposto hoje na Constituição. Pelo texto atual, militares que ocuparam cargo, emprego ou função pública civil temporária, incluindo a administração indireta, por dois anos de afastamento [contínuos ou não], deverão ser transferidos para a reserva [inciso III, § 3º do artigo 142].
Jaques Wagner parece tratar o assunto como um “princípio republicano”. Ele expressa isso de maneira até simplória: “seria uma medida discriminatória” restringir o que ele considera como uma “igualdade de direito” militares serem ministros.
A explicação do senador seria só risível; não fosse, porém, também trágica. Wagner não leva em consideração a singularidade da função militar, que faz com que democracias e regimes civis estabeleçam restrições a integrantes de carreiras militares no ambiente da política.
Ademais, o senador não valoriza a memória recente, das gestões desastrosas para o país e ruinosas para a democracia com altos oficiais à frente de ministérios – Etchegoyen, Luís Eduardo Ramos, Bento Albuquerque, Augusto Heleno, Paulo Sérgio, Braga Neto, Pazuello …
Governos são eleitos em eleições disputadas por partidos políticos, instituições às quais os militares são proibidos de se filiarem. É uma decorrência óbvia, por isso, militares não serem considerados como atores com funções de mando em governos civis.
O entendimento do senador a respeito do papel dos militates não combina com a visão que seria esperada de alguém como ele, um quadro experimentado do establishment político e que tem acesso direto ao presidente Lula e ao centro do governo.
Wagner exerceu três mandatos de deputado federal, foi duas vezes governador do 4º estado mais populoso do país, foi ministro de Estado nos governos Lula e Dilma, e atualmente é senador da República – trajetória que lhe propiciou sólido conhecimento sobre as lógicas de poder e o papel nefasto dos militares ao longo da história republicana.
No Senado, Jaques Wagner desempenha a função de líder do governo Lula, eleito justamente para salvar a democracia. Nesta posição, ele não pode atuar em sentido oposto e repetir José Múcio Monteiro como mais um porta-voz dos interesses das cúpulas fardadas que atentaram contra a democracia.
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