O hacker Walter Delgatti Neto declarou à Polícia Federal (PF) que ia ao Ministério da Defesa de uma forma atípica, optando por utilizar a entrada dos fundos, como relatou seu advogado, Ariovaldo Moreira, em conversa com Camila Bomfim, do G1 Este detalhe emergiu durante o depoimento prestado à PF na última sexta-feira, (18). Tal depoimento foi agendado após Delgatti fornecer informações adicionais sobre sua relação com o governo de Jair Bolsonaro à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Golpistas.
Conforme explicado pelo advogado, o propósito dessa entrada pelos fundos era evitar que os registros de presença do hacker fossem registrados no sistema da portaria principal. Perante a CPI, Delgatti Neto indicou que, durante esses encontros, ele desempenhava um papel de “orientação” referente ao conteúdo integral do relatório do Ministério da Defesa acerca das urnas eletrônicas. Esse relatório foi entregue ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em novembro de 2022, logo após as eleições presidenciais.
O hacker ainda alegou que participou dessas reuniões a pedido do então presidente Jair Bolsonaro. Segundo ele, houve cinco reuniões no Ministério da Defesa com especialistas da pasta, durante as quais ele teria tido influência direta sobre a posição final do ministério a respeito da confiabilidade do sistema eleitoral. Tanto a Polícia Federal quanto a CPI estão em busca de evidências que confirmem a realização dessas reuniões.
Embora o relatório do Ministério da Defesa não tenha apresentado evidências de fraude nas eleições, ele solicitou ao TSE que fizesse “ajustes” no sistema eleitoral. Entretanto, essas sugestões foram refutadas por órgãos de supervisão técnica, tanto nacionais quanto internacionais, que atestaram a segurança das urnas eletrônicas e a lisura das eleições.
Delgatti Neto alegou que, mesmo não sendo o autor do texto do relatório, foi ele quem chegou a tais conclusões e as compartilhou com os técnicos do Ministério da Defesa. “A ideia inicial era que eu inspecionasse o código-fonte, só que eles explicaram que o código-fonte ficava somente no TSE e apenas servidores do Ministério da Defesa teriam acesso a esse código. Então, eles iam até o TSE e me repassavam o que eles viam, porque eles não tinham acesso à internet, eles não podiam levar uma parte do código; eles acabavam decorando um pedaço do código e me repassando”, afirmou o hacker.
Depoimento da última sexta
Na última sexta-feira (18), o hacker Walter Delgatti Neto fez questão de reafirmar perante a PF as declarações que havia feito durante seu depoimento à CPI dos Atos Golpistas no dia anterior, conforme compartilhado pelo advogado Ariovaldo Moreira.
Moreira informou que Delgatti apresentou “elementos de prova” com o intuito de auxiliar os investigadores na verificação das acusações direcionadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro, à deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e ao ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira, entre outros.
Segundo relato do advogado Ariovaldo Moreira, os elementos apresentados por Delgatti à Polícia Federal incluem:
- Uma gravação de áudio que envolve uma conversa com uma assessora de Carla Zambelli, onde são discutidos possíveis pagamentos relacionados a serviços prestados ao governo.
- Uma descrição minuciosa da sala no Ministério da Defesa onde ele afirma ter se reunido com profissionais da pasta para elaborar um relatório técnico sobre as urnas eletrônicas utilizadas no ano de 2022.
Com essa iniciativa, Delgatti pretende fornecer suporte às suas alegações e contribuir para o desenvolvimento das investigações em curso. “Ele reiterou o que foi dito ontem na CPMI […] Exatamente o que ele disse ontem. Tudo o que os senhores ouviram ontem, o Walter hoje repetiu para a autoridade policial”, declarou Moreira. “[Apresentou] Indícios de provas. A autoridade policial deve agora, nas investigações, encontrar as provas de que o Walter esteve na [sede do ministério da] Defesa”, afirmou.
Antes de chegar à sede da Polícia Federal em Brasília, o advogado já havia mencionado a perspectiva de corroborar a presença de Delgatti Neto no Palácio da Alvorada, onde ele se encontrou com o então presidente Jair Bolsonaro em agosto de 2022. Contudo, ele ressaltou que verificar o conteúdo da conversa seria “impraticável”.
Questionado sobre a possibilidade de um acordo de delação premiada por parte de Delgatti, o advogado esclareceu que não poderia comentar devido ao curso em andamento do processo.
Com relação ao testemunho que Delgatti prestou à CPI dos Atos Golpistas na quinta-feira, ele foi transferido de Araraquara (SP), onde estava detido desde o início do mês, para responder a questionamentos da Polícia Federal em Brasília a respeito da suposta invasão dos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que teria sido realizada a pedido de Carla Zambelli.
Durante esse depoimento, Delgatti fez declarações surpreendentes, incluindo a alegação de que Bolsonaro havia solicitado que ele assumisse a responsabilidade por um grampo já efetuado contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e que teria oferecido “indulto” por seus crimes em troca de sua concordância com essa proposta. No entanto, a equipe jurídica do ex-presidente nega veementemente essas alegações.
O hacker também relatou que Bolsonaro o instruiu a visitar o Ministério da Defesa e explicar aos técnicos a possível ocorrência de uma fraude nas urnas eletrônicas. Após o depoimento de Delgatti, a defesa do ex-presidente emitiu um comunicado confirmando o encontro no Palácio da Alvorada, mas contestando o conteúdo da conversa.
Veja a nota na íntegra:
“Considerando as informações prestadas publicamente pelo depoente Sr. Walter Delgatti Neto perante a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito na presente data, a defesa do ex-Presidente Jair Messias Bolsonaro, informa que adotará as medidas judiciais cabíveis em face do depoente, que apresentou informações e alegações falsas, totalmente desprovidas de qualquer tipo de prova, inclusive cometendo, em tese, o crime de calúnia”.
Diante de informações prestadas pelo Sr. Walter Delgatti Neto, quando de sua passagem pelo Palácio da Alvorada, acerca de suposta vulnerabilidade no sistema eleitoral, o então Presidente da República, na presença de testemunhas, determinou ao Ministério da Defesa a apuração das alegações, de acordo com os procedimentos legais e em conformidade com os princípios republicanos, seguindo o mesmo padrão de conduta observado em todas as suas ações enquanto chefe de Estado. Após tal evento, o ex-Presidente nunca mais esteve na presença de tal depoente ou com ele manteve qualquer tipo de contato direto ou indireto.”
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