A Polícia Federal realizou uma operação contra Carla Zambelli e Walter Delgatti, o “hacker de Araraquara”, que se notabilizou por supostamente ser o sujeito que invadiu o Telegram dos procuradores da Lava Jato, fornecendo o conteúdo que embasaria as mais de cem reportagens da Vaza Jato, série que envolveu o The Intercept Brasil e outros veículos de imprensa em 2019 e desmascarou os inúmeros absurdos cometidos pela Operação Lava Jato.
Walter Delgatti foi preso. E, em depoimento à Polícia Federal, disse que teve uma reunião com o ex-presidente Bolsonaro no Palácio da Alvorada. Na reunião, de acordo com a própria PF, Bolsonaro perguntou para ele se, com o código-fonte em mãos, era possível adulterar a urna. No relato do depoimento:
“Encontrou o ex-presidente Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada, tendo o mesmo lhe perguntado se o declarante, munido do código fonte, conseguiria invadir a urna eletrônica, mas isso não foi adiante, pois o acesso que foi dado pelo TSE foi apenas na sede do tribunal, e o declarante não poderia ir até lá”. Bolsonaro de fato tentou manipular o processo eleitoral. Por mais que a justificativa dele fosse “provar que o sistema era vulnerável”, era um jogo lógico sem fim.
Como funcionava esse jogo? Bolsonaro tentou de fato encontrar uma vulnerabilidade nas urnas que pudesse manipular os votos. Se ele tivesse encontrado, jamais revelaria a fragilidade, por um motivo muito simples: ele manipularia os votos a seu favor, garantindo a reeleição. Como Bolsonaro não encontrou nenhuma fragilidade do tipo, começou a denunciar a urna eletrônica de todas as maneiras possíveis. E isso ganhou contornos de crime eleitoral: Eduardo Bolsonaro foi em viagem oficial se encontrar com o influenciador e consultor político argentino de extrema direita Fernando Cerimedo, que inventou um monte de dados falsos para “denunciar a fraude das urnas brasileiras”, numa live assistida por mais de 400 mil patetas bolsonaristas. Como se isso já não fosse crime o suficiente, Eduardo Bolsonaro pagou um funcionário de Cerimedo com dinheiro de sua campanha eleitoral. No fim, o desespero dos bolsonaristas em tentar mostrar que a urna “não é confiável” é uma prova da confiabilidade da urna eletrônica, uma vez que hoje está claro que eles tentaram manipular a urna eletrônica e não conseguiram.
O pior é que nem dá para negar as digitais do crime: Carla Zambelli fez o favor para o Brasil de mandar R$ 13.500,00 via Pix diretamente para Walter Delgatti. A ex deputada e atual influencer fitness Joice Hasselmann já tinha dito na Tribuna da Câmara que Carla Zambelli era burra. E Bolsonaro fala até hoje que, no julgamento dele, a burrice de Carla Zambelli foi a responsável pela derrota na eleição: aquela cena surreal em que Carla Zambelli sai correndo com uma arma atrás de um eleitor na véspera da eleição mudou o voto de muita gente, de acordo com Bolsonaro e seu séquito de assessores próximos, aquela galera infestada de masculinidade conservadora em nome de Deus. Carla Zambelli inclusive está processando o rapaz de quem ela foi atrás com arma em punho. Porque pior que a humilhação, só a humilhação referendada pelo Judiciário.
Mas, aparentemente, Carla Zambelli, apesar de burra, é uma ótima professora. Só isso explica o fato de que quatro gênios entre os invasores da Câmara dos Deputados em 08 de janeiro deram seu nome e seu CPF voluntariamente para as autoridades, com um objetivo muito nobre em vista: acessar o wi-fi público da Câmara dos Deputados. Sim, enquanto eles estavam cometendo um crime eles deram o seu nome e o seu CPF praticamente como uma afirmação “oi, autoridades, estamos cometendo um crime”. É uma falta de noção quase poética.
O que dizer então do Deputado Hélio Lopes, que em pleno agosto de 2023 comemora convocação do Flávio Dino para depor na Comissão de Segurança Pública da Câmara por um motivo absolutamente sem pé nem cabeça?
Em abril, o deputado e pastor Marco Feliciano já tinha falado por que os bolsonaristas tinham desistido de convocar Flávio Dino para as comissões da Câmara: “Flávio Dino fez um passeio na CCJ. Ele engoliu uns 10 deputados lá. Tivemos um episódio horrível para nós que somos oposição. Muita gente foi despreparado na comissão mais séria da Casa e quis lacrar o ministro. Aí, o ministro, ele é juiz de direito, conhece linguagem, governador de estado, comunista de carteirinha, extremamente preparado. Você vai tentar lacrar um cara desses? Você vai tomar uma invertida”. A declaração foi dada ao MonarkTalks em abril, mas aparentemente teve deputado esquecendo disso e comemorando a futura humilhação que os bolsonaristas vão sofrer novamente em breve.
Também tem o caso da “mãe do filho de Carlos Bolsonaro” que foi indicada para um cargo de R$ 43 mil mensais da InvesteSP, sob comando de Tarcísio, em Nova York, logo depois de Bolsonaro passar uma noite dormindo no Palácio dos Bandeirantes. Enquanto não estavam fazendo guerra de almofadas, Bolsonaro e Tarcísio aparentemente estavam combinando essa indicação. A ironia aqui é que a família Bolsonaro, apesar de ser “família cristã cheia de homens de Deus”, não trata Martha Sellier com a dignidade de uma pessoa com status relacional nenhum.
Não é namorada, ficante, noiva, rolo, futura esposa ou aquele caso de uma noite só em que a camisinha estourou, nada do tipo: é uma mera “mãe do filho de Carlos Bolsonaro”. Como se fosse um gado reprodutor. Mas agora uma “mãe do filho de Carlos Bolsonaro” que tem um bom cargo na InvesteSP, após ter saído do também bom cargo que ela também tinha no BID, indicada por Bolsonaro. Por algum motivo que não sabemos, essa moça precisa muito permanecer em Nova York.
E, finalmente, existe o último reduto dos bolsonaristas: o Banco Central. Esse ainda complica a vida do governo Lula, porque mesmo com dois meses seguidos de deflação e com indicadores de que a atividade econômica na parte da indústria e dos serviços não vai tão bem, Roberto Campos Neto não parece muito feliz com a perspectiva de ter que reduzir a Taxa Selic. A imprensa e os mercados dão a redução como óbvia, porque não existem mais justificativas racionais para manter a taxa de juros no atual patamar, mas, mesmo que a taxa de fato caia, saibam que vai ser contra a vontade do Roberto Campos Neto.
Afinal, Roberto Campos Neto era o cara que apresentava estatísticas todos os dias no grupo de WhatsApp dos ministros do Bolsonaro dizendo que “tinha certeza que Bolsonaro ia ganhar a eleição”. Nada indica que ele tenha tido uma súbita mudança em sua orientação política, ainda mais considerando que ele é neto do Roberto Campos, que redigiu o PAEG de Castello Branco, aquele programa econômico que tentou sufocar a inflação destruindo um monte de direitos dos trabalhadores no início da ditadura militar. A afinidade em trabalhar para militares que odeiam a democracia vem de família.
Mas a questão final é que é possível ouvir os ecos na cabeça dos bolsonaristas em todos os lugares. Bolsonaristas dão demonstrações cotidianas de que tem uma capacidade intelectual limitadíssima, e a cada dia parece mais estranho que eles tenham ganhado uma eleição e governado o Brasil (de forma catastrófica, por óbvio) nos últimos quatro anos. Que bom ter a sensação de que esse pesadelo acabou!