O STF está analisando uma matéria cuja relevância vai além do que se pode perceber inicialmente. A sessão de votação foi interrompida quando já haviam quatro votos favoráveis à descriminalização da posse de maconha para consumo próprio.
Se essa tendência for confirmada no resultado final, isso representará o início da jornada rumo à total legalização da planta. Este seria o próximo passo lógico, pois não seria coerente legalizar o uso, mas ainda assim obrigar os usuários a importar maconha de outros países, afetando negativamente a nossa balança comercial e criando empregos no exterior.
Um aspecto crucial a considerar nessa questão é o econômico. Ao final deste texto, apresentamos algumas projeções de quanto o cultivo legalizado de maconha poderia contribuir para a economia brasileira em termos de renda e criação de empregos.
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Votação no STF
Último a votar, o ministro Alexandre de Moraes defendeu a descriminalização do porte de maconha para consumo pessoal. Argumentou que uma quantidade mínima deve ser estabelecida para distinguir o usuário do traficante, sugerindo um limite entre 25 a 60 gramas da substância. Este é o quarto voto a favor da liberação do porte para a maconha. Há ainda sete ministros que precisam dar seus vereditos. A votação, porém, foi interrompida e deverá ser retomada ainda este ano.
Referindo-se à experiências de outros países no tocante à despenalização do porte de substâncias ilícitas, Moraes afirmou que “não existe um manual definitivo para tratar a questão”. Enfatizou ainda a mudança de papel do Brasil no cenário do tráfico de drogas, que passou de corredor de passagem para um dos maiores consumidores mundiais, em particular de maconha e cocaína.
“Infelizmente, o Brasil tornou-se um mercado consumidor extremamente cobiçado para todos os carteis internacionais de drogas”, declarou. Aludindo a pesquisas, Moraes indicou que as alterações na Lei de Drogas resultaram em consequências opostas às esperadas, com grande parte dos usuários sendo encarcerados como traficantes.
O ministro também defendeu que a quantidade não deveria ser o único critério para definir o porte para uso pessoal, mas que deveria assegurar a aplicação igualitária da lei, independentemente da cor da pele, classe social, entre outros fatores.
O julgamento que visa debater a descriminalização do porte de drogas para uso próprio foi pausado no STF, que agora conta com quatro votos favoráveis à liberação do porte de maconha para consumo individual. O momento da retomada da discussão ainda é incerto.
Gilmar Mendes, ministro relator do caso, solicitou mais tempo para considerar os votos propostos, prometendo liberar o processo em breve. Rosa Weber, presidente da Corte, acatou a solicitação, porém sem definir uma data. Ela também expressou o desejo de apresentar seu próprio voto, antes de se aposentar no final de setembro.
O STF está avaliando a constitucionalidade de uma cláusula da Lei de Drogas, que tipifica como crime a aquisição, posse e transporte de narcóticos para uso pessoal. No entanto, a venda de drogas continuará sendo ilegal.
Atualmente, embora seja crime, o porte de drogas para consumo pessoal não leva à detenção, com processos sendo conduzidos em juizados especiais. As sanções normalmente aplicadas incluem advertências, prestação de serviços comunitários e ações educativas. A condenação não é registrada nos antecedentes criminais. Por outro lado, a pena para o tráfico de drogas pode variar de 5 a 20 anos de prisão.
Potencial da maconha
O potencial de geração de emprego e renda da maconha no Brasil é enorme. De acordo com um estudo da consultoria Prohibition Partners, o mercado de maconha legal no Brasil pode chegar a US$ 20 bilhões (R$ 96,2 bilhões) até 2028. Isso significa que o setor pode gerar mais de 1 milhão de empregos diretos e indiretos.
Os Estados Unidos e o Canadá são os maiores mercados de maconha legal do mundo. O mercado americano é estimado em US$ 32,8 bilhões (R$ 158,0 bilhões) e o mercado canadense em US$ 9,6 bilhões (R$ 45,6 bilhões). Esses mercados estão crescendo rapidamente e devem continuar crescendo nos próximos anos.
No Brasil, a maconha ainda é ilegal, mas há um movimento crescente para a legalização da planta. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou o uso medicinal da maconha no Brasil.
A legalização da maconha no Brasil teria um impacto positivo na economia. O setor poderia gerar centenas de bilhões de reais em receita e criar milhões de empregos. A legalização também ajudaria a reduzir o crime e a violência, pois a maconha deixaria de ser uma mercadoria ilegal.
A legalização da maconha no Brasil vai além de uma questão de saúde pública, sendo também um assunto de equidade social. O número de detenções por posse de maconha é elevado, impactando especialmente os jovens de baixa renda, enquanto que a juventude de classe média, que consome a substância em eventos sociais, permanece majoritariamente ilesa por tais restrições. Com a legalização, a maconha se tornaria não só mais acessível e segura para os pacientes, mas também poderia contribuir para a diminuição da superlotação carcerária.
O Brasil está atrasado em relação aos outros países no que diz respeito à legalização da maconha. No entanto, o movimento para a legalização está ganhando força e é apenas uma questão de tempo até que a planta seja legalizada no Brasil.
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Perspectivas globais
Prevê-se que o mercado global de cannabis legal registre um aumento de 15%, alcançando US$ 37 bilhões (R$ 178,17 bilhões) em 2023. A maior parte desse crescimento é impulsionada pelos Estados Unidos, onde é esperado um avanço de 14% graças à legalização da cannabis em mais estados. Mesmo sem a legalização em nível federal, os EUA devem representar 81% das vendas globais de cannabis legal.
No Canadá, mesmo concorrendo com um significativo mercado ilegal, o mercado de cannabis legal continua se expandindo. Em 2022, os canadenses compraram um total de US$ 4,5 bilhões em cannabis legal. Projeta-se um aumento de 12% nas vendas de cannabis legal no Canadá em 2023, chegando a US$ 4,7 bilhões (R$ 22,61 bilhões), o que representará 12% das vendas globais de cannabis legal.
Nos EUA, o crescimento do mercado de cannabis legal tem sido notável, especialmente nos estados que legalizaram seu uso medicinal e/ou recreativo. Isso elevou o mercado de cannabis legal dos EUA para mais de US$ 40 bilhões. Um exemplo disso é Nova Jersey, que recentemente legalizou o uso recreativo de cannabis e observou um rápido aumento nas vendas.
Em um panorama global, é esperado que a predominância da América do Norte recue a longo prazo, com a próxima onda de crescimento vindo da Europa, à medida que países como a Alemanha avançam na legalização da cannabis para uso recreativo.