Os erros que não podem se repetir

Imagem: Paulo Pinto/Agência PT

Um erro gravíssimo do PT em todos os seus mandatos foi o fortalecimento das instituições sem um pingo de supervisão ou garantias de que não se criaria monstros. Foi assim com a com as Forças Armadas, com a Procuradoria-geral da República e com o resto do Ministério Público. Faltou reforçar o papel institucional de cada um.

Durante os governos do PT, as Forças Armadas receberam um aumento expressivo de investimentos em equipamentos, tecnologia e pessoal, além de maior participação em missões de paz internacionais e em operações de segurança interna. Essas medidas visavam modernizar as Forças Armadas e ampliar seu papel na defesa nacional e na integração regional.

No entanto, esse fortalecimento também trouxe consequências negativas para o Brasil. As Forças Armadas passaram a exercer uma influência crescente na política nacional, manifestando suas opiniões sobre temas sensíveis, como a Comissão da Verdade, que investigou os crimes da ditadura militar; a demarcação de terras indígenas; e a corrupção nos governos petistas. As Forças Armadas também se aproximaram de setores conservadores da sociedade e de políticos de direita, como o então deputado federal Jair Bolsonaro, que defendia a intervenção militar como solução para a crise política que se iniciou em 2013. As Forças Armadas ainda foram usadas pelo governo federal em diversas ocasiões para realizar operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), que consistem no emprego das tropas militares em situações de grave perturbação da ordem pública. Essas operações foram criticadas por especialistas em segurança pública, que apontaram os riscos de militarização da segurança, violação dos direitos humanos e falta de efetividade.

O PT reagiu às manifestações das Forças Armadas com cautela e respeito, evitando confrontos ou polêmicas. O partido reconheceu o papel das Forças Armadas na defesa nacional e na cooperação internacional, mas sem reforçar a necessidade da subordinação dos militares aos poderes civis e ao Estado Democrático de Direito. O partido também tentou dialogar com os comandantes militares e com os setores das Forças Armadas, buscando preservar a estabilidade institucional e a governabilidade. O PT, no entanto, não conseguiu evitar o crescimento do protagonismo político dos militares, nem impedir o apoio das Forças Armadas à candidatura de Bolsonaro nas eleições de 2018.

O que o PT poderia ter feito diferente? Uma das possibilidades seria ter investido mais na formação dos militares, buscando tirar a influência da Escola das Américas, um centro de treinamento militar dos Estados Unidos que foi acusado de disseminar doutrinas antidemocráticas e violadoras dos direitos humanos entre os militares latino-americanos. O partido também poderia ter reduzido os investimentos no Exército e afastado os militares da vida civil, evitando o uso excessivo das GLOs e limitando sua atuação à defesa externa. Além disso, o PT poderia ter ido atrás de punir todo e qualquer aventureiro que saísse da linha institucional, denunciando as tentativas de interferência ou intimidação dos militares na política.

No caso do Ministério Público, outro show de inocência, durante os governos do PT, o presidente seguiu a tradição de escolher o procurador-geral da República a partir de uma lista tríplice elaborada pelos membros do MPF, respeitando a autonomia e a independência do órgão que diz respeito apenas ao Estado brasileiro, porém totalmente dependente dos interesses da classe e interesses políticos de seus membros.

A atuação do procurador-geral da República no protagonismo na denúncia com base num suposto combate à corrupção e com isso, oferecendo denúncias contra diversos políticos e autoridades abriu flanco para que se questionasse a validade das denúncias oferecidas pelo procurador-geral da República, alegando falta de provas, inconsistências e contradições. Além disso, não só a PGR como o Ministério Público passaram a protagonizar sucessivos episódios de abuso de poder, violação do sigilo e a manipulação da opinião pública.

O que o PT poderia ter feito diferente? Uma das possibilidades seria ter ignorado a lista tríplice e nomeado um procurador-geral da República mais alinhado com o projeto político do partido, que tivesse uma visão mais crítica sobre o papel do MPF na democracia e na sociedade. O partido também poderia ter não permitido a atuação do MPF de maneira ativa em investigações criminais, ter apoiado com maior vigor a PEC 37, que reforçava os deveremos institucionais do MP e fazendo com que a instituição respeitasse o que diz a Constituição Federal sobre as funções institucionais do órgão. Além disso, o PT poderia ter buscado uma reforma do sistema de controle externo do MPF, para garantir maior transparência, accountability e responsabilização dos membros do órgão.

Cleber Lourenço: Defensor intransigente da política, do Estado Democrático de Direito e Constituição. | Colunista n'O Cafézinho com passagens pelo Congresso em Foco, Brasil de Fato e Revista Fórum | Nas redes: @ocolunista_
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