Colégios civico-militares e a Venezuela dos militares brasileiros

O grande êxito do chavismo na Venezuela foi a politização das forças armadas e cooptação das tropas, que acabaram se inserindo em diversas esferas da sociedade. Não é muito diferente de outras tantas ditaduras ao redor do mundo, onde a cúpula militar infesta diversas esferas da vida civil.

Usada como “espantalho” pela extrema direita brasileira, nosso vizinho sul-americano, na verdade, é um sonho do que a cúpula militar no país quer implantar. Não, a nossa cúpula militar não é bolivariana ou esquerdista, mas sonha com a ocupação de toda a administração pública por militares.

Um dos exemplos mais alarmantes disso são as hediondas escolas cívico-militares, que os defensores da família e dos bons costumes defendem de maneira tão árdua e que, corriqueiramente, protagonizam casos e mais casos de assédio e abuso contra menores de idade.

Por trás dessa epidemia de colégios militares, não há nenhuma trama elaborada focada na formação ideológica dos jovens brasileiros. Na verdade, a realidade é sempre mais lamentável e melancólica: militares empregados nessas escolas recebem quase R$ 10 mil reais mensais, enquanto os professores (estes quase sempre civis, logo, inimigos da cúpula militar segundo a lógica militar) recebem metade ou até mesmo um quinto desse valor.

E como tudo aqui que é comandado pela cúpula militar no país, há um abismo absurdo de transparência: pesquisadores e especialistas em educação apontam, desde o final do ano passado, para a falta de dados específicos sobre a eficácia do modelo e o desempenho dos estudantes.

Essas escolas representam menos de 1% do total de escolas no país, porém contam com um orçamento de mais de R$ 60 milhões e uma diretoria específica do Ministério da Educação para elas, o que já causa um desequilíbrio absurdo nos sistemas de ensino.

Sem falar do absurdo que é mais fatias do orçamento público indo parar nas mãos da cúpula militar. Só este ano, a área de Defesa tem R$ 124,4 bilhões de reais, quase 80% disso com folha de pagamento.

Se o cidadão de bem brasileiro teme que seu país vire uma Venezuela, deveria começar a temer a cúpula militar.

E não é só na educação: temos a cúpula militar na segurança presidencial, inteligência, controle de armas, assessorias presidenciais e serviços que, em democracias maduras, são feitos por civis, mas que no Brasil são feitos de maneira extremamente medíocre pela cúpula militar. E eles ainda possuem até mesmo uma sala exclusiva no Congresso Nacional para que possam fazer lobby. Nenhum outro setor econômico ou social, seja no Brasil ou no mundo, conta com uma “sede” dentro de uma casa legislativa para que possam fazer lobby. Nem o mais hábil dos lobistas chegou tão longe, só a cúpula militar brasileira.

Infelizmente, há uma longa jornada até o Brasil realmente ser uma democracia plena. Até lá, ficamos com a cúpula militar que assusta os idiotas úteis com o fantasma da Venezuela, enquanto eles próprios criam a sua.

A ideologia da cúpula militar é a do saldo bancário. Mão leve e bolso fundo.

Cleber Lourenço: Defensor intransigente da política, do Estado Democrático de Direito e Constituição. | Colunista n'O Cafézinho com passagens pelo Congresso em Foco, Brasil de Fato e Revista Fórum | Nas redes: @ocolunista_
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