Em meio a declarações polêmicas do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, sobre a reinjeção do gás natural produzido no pré-sal, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) encomendou estudo sobre o tema ao Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), a fim de obter uma análise embasada de especialistas sobre o assunto.
A questão é técnica e contradiz argumento de Silveira, que defende que a maior disponibilidade do insumo pode ser alcançada no curto prazo, via redução do volume de reinjeção de gás natural, em especial na região do pré-sal. As práticas e os níveis de produção e de reinjeção existentes hoje foram definidos em pesquisas e indicadores aprovados pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) há anos e de difícil alteração no curto prazo.
O estudo do Ineep mostra que o Brasil é um país petrolífero, não gasífero. Possui baixo volume de reservas de gás natural, cerca de 12 trilhões de pés cúbicos (TCF), quando comparado aos maiores produtores de gás no mundo: Rússia (1.321 TCF); Qatar (870 TCFs); EUA (400 TCFs).
As reservas de gás natural brasileiras estão localizadas no offshore, águas profundas e ultraprofundas, o que torna o custo de extração mais alto que nesses grandes produtores, onde a extração é onshore.
Além disso, no pré-sal, o gás natural é associado ao petróleo, o que exige operações de separação, também de alto custo e complexidade. Todo um processo que implica investimentos de longa maturação..
“Em vez de polemizar o tema, o ministro deveria trabalhar para ajudar o Estado brasileiro, a Petrobrás a ampliarem a exploração e produção de gás natural no país. Isso necessita de investimentos de longo prazo. Exige também investimentos em logística para trazer o gás do mar para a terra”, destaca o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar. Segundo ele, é impossível deixar de reinjetar o gás natural nas cavernas de petróleo, pois a alta produtividade do pré-sal não se manteria.
A pesquisa do Ineep aponta também aspectos ambientais da prática de reinjeção, utilizada não só para aumento da produtividade dos poços, mas também para redução das emissões de gases de efeito estufa.
O trabalho revela que 40% do insumo reinjetado é CO2 associado ao gás natural. Ou seja, caso o gás não fosse reinjetado, o CO2 seria separado e lançado na atmosfera, piorando os indicadores ambientais das companhias. Além disso, outros 40% servem para aumentar a pressão dos poços e, consequentemente, a produção de petróleo.
A separação completa do gás natural e do CO2 necessita de equipamentos de alto custo
“A redução da reinjeção implicaria uma regressão das metas de mitigação das emissões de GEE, no processo de descarbonização e de captura de carbono (CCS) da indústria de petróleo e da Petrobrás” destaca Mahatma Ramos, pesquisador do Ineep, um dos autores do estudo.
Segundo a Petrobrás, seu processo de separação do CO2 do gás natural e reinjeção no pré-sal, é a maior operação de captura de carbono (CCS) do mundo e constitui um importante atenuante da pegada de carbono da atividade petrolífera. “Ademais, esse gás reinjetado não é “perdido/descartado”, ele pode ser reutilizado na produção de óleo”, acrescenta Ramos.
Como demonstrado no trabalho do Ineep, é preciso observar os obstáculos técnicos, econômicos e ambientais à redução da reinjeção no Brasil no curto prazo, além de observar a maturação da implantação de novos projetos. A temporalidade dos projetos em execução (Rota 3 e atividades da Bacia de Sergipe-Alagoas) não atende a objetivos de curtíssimo prazo.
A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) estima que a oferta nacional de gás natural saltará dos cerca de 40 milhões de m³ por dia atuais, para 60 milhões de m³ por dia em 2027. O aumento ocorrerá por conta de novos campos de produção de óleo e gás, sobretudo, nas bacias do sudeste (pré-sal) e de Alagoas-Sergipe; nova infraestrutura de escoamento de gás natural, como o projeto ROTA 3, na Bacia de Campos; aumento da importação de gás natural da Bolívia.
O Ineep observa que o Brasil reinjetou em média 51% da sua produção de gás natural nos quatro primeiros meses de 2023, no ambiente marítimo essa média sobe para 54% e no ambiente terrestre é de 38%.
Os volumes de gás natural reinjetados no Brasil subiram de maneira constante desde 2014, sobretudo no ambiente marítimo (offshore), onde sai de uma média de 17%, entre 2007 e 2013, para uma média crescente que sai de 18% em 2014 para 51,3% em 2022. No ambiente terrestre, o volume de gás natural reinjetado se estabilizou a partir de 2020, em cerca de 32,8% do total produzido.