A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, disse ter esperança do Marco Temporal ser rejeitado pelo Senado. O texto do PL 490 foi aprovado na terça-feira (30), na Câmara dos Deputados, com 283 votos favoráveis e 155 contrários.
Guajajara participou de uma audiência pública no Congresso, a convite da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), nesta quarta-feira (31), quando falou sobre o projeto de lei e a visão, como líder, sobre as mudanças que ele traria.
“Apesar do que assisti ontem, tenho esperança e acredito que os parlamentares e as parlamentares comprometidos com a vida irão se empenhar para barrar o projeto no Senado”, disse a ministra.
O PL 490 foi proposto em 2007 pelo ex-deputado federal mato-grossense Homero Pereira. O texto tem o objetivo de demarcar as terras indígenas que não eram ocupadas após a promulgação da Constituição vigente – ou seja, os povos indígenas teriam direito às áreas que ocupavam em 5 de outubro de 1988, 35 anos atrás.
Segundo o reconhecimento da Carta Magna, as terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas serão mantidas. São elas as áreas em que as comunidades usam para atividades produtivas, com preservação dos recursos ambientais e reprodução física e cultural das comunidades. Fica como responsabilidade da União demarcá-las em até cinco anos.
O texto aprovado pelos parlamentares é um substitutivo. Isso significa que é uma proposta alternativa apresentada pelo deputado e presidente da Câmara Arthur Maia (União-BA), também relator do processo. As mudanças se sobrepõem ao conceito originário da Constituição Federal, proíbem que as áreas de demarcação possam ser ampliadas e o texto ainda veta a autorização para que comunidades indígenas plantem cultivares transgênicos nos territórios. O substitutivo permite a anulação de processos demarcatórios que não atendam às novas regras, conforme a reportagem da Agência Brasil.
“Uma lei ordinária jamais terá o poder de alterar o texto constitucional”, disse Sonia Guajajara durante a audiência da CCJ. “Sabemos que, infelizmente, para muitas pessoas deste país ainda é muito difícil compreender o conceito da dívida histórica [do país com os indígenas]. Até mesmo para alguns parlamentares desta Casa, as políticas públicas afirmativas que visam à reparação desta dívida histórica nem deveriam existir.”
A ministra mencionou, ainda, a “violência institucional” que os indígenas são acometidos há séculos, e contestou o argumento de que a demarcação das terras traria segurança ao campo, citando os ruralistas.
“Sabemos que os conflitos entre indígenas e proprietários rurais existem e que, inclusive, aumentaram consideravelmente nos últimos anos, mas a razão para que estes conflitos não cessem é apenas uma: a morosidade do Estado brasileiro em demarcar os territórios indígenas. Não haverá segurança jurídica no campo sem que todas as terras indígenas sejam demarcadas”, afirmou.
Guajajara reforça a ideia de que Lula tem um compromisso em garantir as pautas socioambientais e indígenas. “Apesar das investidas deste Parlamento, que visam a restringir e negar os direitos constitucionais dos povos indígenas […] e apesar das movimentações para tentar alterar a estrutura organizacional do atual governo, a política demarcatória das terras indígenas prosseguirá”.
A votação do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o marco temporal está marcada para o próximo dia 7, no Senado.
Na manhã desta quinta-feira (1), o líder do governo no Congresso Nacional, Randolfe Rodrigues, afirmou que, no Senado, a base do governo Lula irá se empenhar para “ampliar o debate, aprofundar a discussão, incluir e defender os representantes dos povos indígenas”. No dia anterior, ele havia classificado a aprovação do marco temporal como um “retrocesso”, “violação”, e um “frontal ataque aos direitos dos povos indígenas”.