O Ministério Público Federal revelou que o governo liderado por Jair Bolsonaro fez uma tentativa de incorporar as joias sauditas como propriedade privada do ex-presidente, em vez de considerá-las parte do acervo público presidencial.
Essa informação foi exposta em um ofício datado de 24 de abril, assinado pela procuradora Gabriela Hossri, do MPF em Guarulhos. No documento, a procuradora defende perante a Justiça Federal a necessidade de busca e apreensão na residência de Marcelo da Silva Vieira, capitão da corveta da reserva da Marinha, que, durante o governo Bolsonaro, ocupou o cargo de chefe do Gabinete Adjunto de Documentação Histórica da Presidência da República (GADH), responsável por receber e encaminhar presentes destinados ao presidente. O celular de Vieira foi apreendido pela Polícia Federal em 12 de maio.
O MPF e a PF estão investigando a entrada irregular no Brasil de um conjunto valioso de joias, que seriam presentes do governo da Arábia Saudita. Esses itens de luxo estavam em posse de uma comitiva governamental que visitou o país do Oriente Médio e foram retidos pela Receita Federal no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, em outubro de 2021.
Nos últimos dias de dezembro de 2022, o tenente-coronel Mauro Cid, então braço direito de Bolsonaro no cargo de chefe da Ajudância de Ordens da Presidência da República, tentou obter a liberação das joias junto à Receita e mobilizou funcionários, incluindo Vieira, para lidar com os trâmites burocráticos relacionados ao recebimento dos itens.
No ofício à Justiça, a procuradora escreveu: “Trata-se de um processo que teve um resultado predeterminado, deixando claro o uso do processo administrativo no setor chefiado por Marcelo Vieira apenas como uma forma de legitimar a apropriação privada do bem”. Esse processo administrativo teria sido mencionado por Cid em uma ligação telefônica com Vieira em 28 de dezembro.
De acordo com o depoimento, Vieira teria concordado com o “desvirtuamento do procedimento de análise do presente em seu setor, facilitando assim uma possível apropriação privada do bem”. Isso ocorreu porque não cabia à Ajudância de Ordens, sob o comando de Cid na época, decidir que o presente seria entregue diretamente ao presidente, e o GADH receberia apenas os documentos com fotos do objeto, como destacado pelo MPF.
A responsabilidade de decidir se um presente destinado ao presidente deveria ser tratado como um item público ou privado era do GADH, que era chefiado por Vieira na época.
Conforme revelado pela investigação, o processo burocrático necessário para o encaminhamento das joias começou antes mesmo de os itens serem recebidos, mas não foi concluído, pois a equipe técnica da Receita negou a liberação.