Segundo dados levantados por coletivos de favelas, 69% dos entrevistados gastariam mais com comida caso a tarifa fosse diminuída
Publicado em 20/04/2023
Por Felipe Lucena
Diário do Rio — A desigualdade socioeconômica no Rio de Janeiro se revela de diversas formas. Uma delas é no processo para o consumo de energia elétrica. De acordo com um levantamento feito pelos coletivos responsáveis por criar o Painel Unificador Covid-19 nas Favelas e pelo relatório “Eficiência Energética nas Favelas”, as famílias mais pobres pagam, em média, uma conta de luz duas vezes maior do que a da capacidade de pagamento declarada. Além disso, 31% dessas pessoas encontram-se em situação de pobreza energética, comprometendo uma parcela desproporcional do orçamento familiar para ter luz elétrica em casa. A pesquisa foi feita em 15 comunidades fluminenses.
O levantamento também mostra que 69% das pessoas entrevistadas gastariam mais com comida caso a tarifa de energia elétrica fosse diminuída.
Outros números levantados revelam que 55,2% das pessoas ouvidas pela pesquisa se encontram abaixo da linha da pobreza, ou seja, vivem com renda familiar per capita mensal de até R$ 497 e 41,5% das famílias que ganham até meio salário mínimo ficaram, nos últimos três meses, mais de 24 horas sem luz elétrica em casa. Entre famílias que ganham de dois a três salários mínimos, foram 23%.
Quase um terço dos observados pela pesquisa (32,1%) já perderam eletrodomésticos por conta de falhas na rede elétrica. Esse foi o caso de Neuza Santos, moradora de uma comunidade na Zona Oeste da cidade.
“Com quedas de luz minha geladeira queimou. Outra vez, foi a televisão. É complicado porque a gente não tem dinheiro pra ficar comprando coisas novas assim“, pontua a empregada doméstica.
Entre os eletrodomésticos, o ar condicionado é responsável por mais da metade (51,4%) do consumo de energia na amostra, seguido pelo chuveiro elétrico (13,8%) e geladeira (13,6%).
O levantamento ainda destaca que existe um bom nível em termos de hábitos conscientes de uso da energia elétrica entre a população alcançada pela pesquisa. A pontuação média foi de 6,21, sendo o limite superior da pontuação 9 e o inferior 0. Entre os entrevistados, 78% sempre lembra de apagar a luz ao sair de um ambiente e 67% dá preferência a lâmpadas LED, mais eficientes e econômicas.
Kayo Moura, cientista social e estatístico em formação, integrante do laboratório de narrativas e dados do Jacarezinho, LabJaca, recém-citado como referência pelo The New York Times, foi responsável pela análise.
“Dentro da favela, a partir de famílias em sua maioria em condição de vulnerabilidade social, a ineficiência acaba afetando as famílias mais pobres dentre as mais pobres. São as que menos têm conhecimento sobre seus direitos, como a Tarifa Social de Energia Elétrica. São elas as que mais sofrem com a ineficiência do serviço, as que mais ficam sem luz e as que ficam mais tempo para que a luz retorne”, disse Kayo.
Procurada pela reportagem do Diário do Rio, a Light, empresa responsável pela distribuição de energia elétrica em boa parte da Região Metropolitana do Rio, ainda não se posicionou sobre o conteúdo da matéria.