59 anos de anistia

Passeata dos 100 mil, 1968

Hoje o golpe militar de 1964 completa 59 anos. São 59 anos onde torturadores, estupradores, homicidas, terroristas verde-oliva e todo tipo de crime hediondo não só gozou da mais pura impunidade como também amparo do Estado brasileiro.

E quem diria que depois de 59 anos, seguiríamos sofrendo com os erros cometidos em 1988 sobre os crimes cometidos no golpe de 1964.

Da hipertrofia do Ministério Público (MP) até a anistia de generais. A República não melhorou nem um pouco

O Ministério Público entrou em rota de colisão direta com o Estado Democrático de Direito e a democracia. E passou a viver embriagado num corporativismo que é tão pujante quanto o dos militares. E isso vem desde a sua formação, já na constituinte de 88, fizeram um lobby – um dos mais poderosos na ocasião – para acumular superpoderes.

As outras instituições seguiram no mesmo caminho.

E mesmo assim depois do 8 de janeiro de 2023, quando as vivandeiras de 1964 tentaram tumultuar país, Gritar “sem anistia” se tornou ainda mais importante… E um sonho ainda mais distante.

Ministério Público, que deveria ser um dos guardiões da democracia passou a agredi-la de maneira costumaz! Não só com a lava jato, mas com a leniência com a violência policial, com a cumplicidade e flerte com aqueles que atropelavam o Estado Democrático de Direito e o silêncio indecoroso com aqueles que insistentemente tentaram matar a nossa combalida democracia. Isso quando não eram eles próprios a tentarem matá-la ou sequestrá-la.

Bolsonaro irá passar e os problemas ficarão, precisávamos pensar para além de 2022 e infelizmente, não pensamos.

E como não lembrar daquele perverso 7 de setembro em 2021 que afundou ainda mais a nossa República no mais puro caos, infelizmente Bolsonaro não nasceu da noite para o dia. A lava jato foi quem gestou e carregou nos braços a crise que vislumbramos, afinal de contas, quem, desde 2013 insuflou as massas e banalizou os acintes contra as instituições?

Se um presidente da República ameaçou descumprir o regramento legal e disse isso aos berros para multidões é porque antes tivemos um Deltan e um Moro fazendo isso.

Lá estavam os procuradores inflamando a sociedade contra a PEC 37 (que eu sou a favor), alfinetando e alçando o Supremo Tribunal Federal como o maior dos males, lá estava a lava jato rosnando contra o falecido Teori Zavascki sempre que ele apontava alguma irregularidade da operação.

Foi Moro, que enquanto Ministro da Justiça disse que o motim de policiais militares do Ceará era ilegal, MAS que os policiais não poderiam ser tratados como bandidos. Por fim, na mesma semana, decidiu passear de tanque pelas ruas de Brasília, se tornando um vanguardista do movimento dos tanques na capital do século 21.

Tendo em vista a mais absoluta incapacidade da nossa República em disciplinar e controlar as suas instituições, ainda podemos chamar o Brasil de uma democracia firme e forte? Eu temo que não. Afinal de contas, quem vigia os vigilantes?

A verdade é que nossa República ainda é muito indefesa contra os poderosos lobbies institucionais deste país. Policiais, magistrados, membros do MP, militares e até mesmo a imprensa.

As torturas ainda ocorrem, as perseguições também, só mudaram a embalagem mas o Estado segue dando amparo.

O governo atual certamente não irá bater com nenhum destes problemas, seja por incapacidade ou covardia. Poderia enfrentar os militares? Não há momento melhor mas também não há Ministro da Defesa pior para estar lá.

Até quando vamos repetir ciclos? Até quando a responsabilização de crimes cometidos pelo Estado serão tabu? Até hoje não tive uma resposta.

Lembro da cineasta Petra Costa que temia que nossa democracia teria sido apenas um sonho efêmero, eu vou além, nossa democracia foi um delírio de alguns poucos. Anistiamos os criminosos de 1964 e agora iremos anistiar os criminosos do 8 de janeiro.

Hoje somos um país um pouco pior do que aquele que morreu nos porões 64. No fundo, acho que somos todos idealistas.

Cleber Lourenço: Defensor intransigente da política, do Estado Democrático de Direito e Constituição. | Colunista n'O Cafézinho com passagens pelo Congresso em Foco, Brasil de Fato e Revista Fórum | Nas redes: @ocolunista_
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